Limites do acaso...
Quando o nevoeiro sobe do vale para as montanhas é frequente vê-lo vaguear, durante algum tempo, formando um aparente tecto que limita as montanhas do resto das povoações. É nesses momentos que procuro o limite entre o visível iluminado pela luz do sol e aquela imensidão de nuvens compactas que suspensas aos nossos pés nos fazem lembrar glaciares. No entanto a sua textura é diferente e move-se constantemente.
Olho, e volto a olhar, procuro o seu limite, mas este está sempre a alterar-se e fico feliz, porque não há um limite rectilíneo, e penso que os limites são realmente relativos, dependendo de quem os procura …
É nesse tempo que a vida ganha uma tal dimensão, que só as coisas mesmo importantes que se passam debaixo desse tecto nos vêm à memória.
Aconteceu-me nestes dias uma dessas situações, e como eu gostava de ficar lá suspensa entre o céu e a terra imaginando só o que de bom se passava lá por baixo!
Enquanto contemplava este limite aparente e movediço pensei nesta loucura em que muitos vivem, da luta para além dos limites, do querer mais e mais sem olhar a meios, e isto encontra-se em todo o lado, na política, na economia, na sociedade, na vida privada.
Vencer a qualquer custo, nem que para isso tenha que se vestir diversas fantasias, representar várias personagens, e a maioria de nós a ver passar o Carnaval fora do tempo.
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Foto LUÍS LAGE |
Quanto desespero, quanta miséria, quanta loucura na busca de um limite!
Penso que uma das crises actuais da Humanidade reside exactamente nesta loucura sem limites, neste acreditar que tudo é possível, mais e mais, o incentivo junto dos jovens através de concursos e projectos que envolvem toda uma luxúria, e uma série de prazeres mundanos insustentáveis económica e psicologicamente.
Este é um ano que começou com um bom exemplo desta loucura, dos que tudo querem até à exaustão, para quem não há limites dentro da racionalidade, mas mais triste ainda é ver as pessoas ciosas na procura de pormenores e mesquinhices e a vida a correr ao lado cheia de dificuldades, de valores para lembrar, de nomes para não esquecer, mas não se deu conta! A própria Rádio Televisão Portuguesa andou muito preocupada com mexericos, com histórias e historinhas que por mais dolorosas, verdadeiras ou inventadas encheram a nossa comunicação social.
Entretanto morreu Vítor Alves um militar exemplar do 25 de Abril e a notícia passou ao lado, muito discreta.
Muitos portugueses têm a memória curta, esquecem rapidamente os bons e os maus exemplos, dá jeito a alguns, para o bem e para o mal.
É tudo uma questão de limites, de caminhos e condutas.
Paralelamente decorre uma campanha eleitoral para a Presidência da República.
Quanto aos limites que o respeito pela democracia exigem esses são muitas vezes pouco visíveis nos grandes e pequenos poderes. Por mais pequenos que sejam são sempre tentadores, criam a ilusão que podem sobrepor-se a todos aqueles que julgam ser seus subordinados, mas também aí há limites, e esses dependem de quem os reconhece ou não.
Por estas e muitas mais prefiro o limite definido pelos nevoeiros quando sobem a serra, dão-nos a liberdade de os seguir, de subir e descer conforme as circunstâncias, num grande respeito pela Natureza, desafiando-a a bailar ao sabor dos ventos.
Por:
Fernanda Lage
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