“O erro perde importância desde que se aprenda com ele”
A propósito do rio Douro, Eugénio de Andrade lembrava o provérbio chinês que escolhi para tema deste editorial e acrescentava: «No nosso país, os erros têm sido tantos que parece não haver aprendizagem possível. E, contudo, é preciso aprender, se queremos que o passado que nos foi legado tenha ainda algum futuro».
Falava do rio, da natureza que ele tanto amava, tanto como as palavras: «São como um cristal /as palavras, /Algumas, um punhal, /um incêndio: /Outras, orvalho apenas».
Quase sempre a morte deixa-nos sem palavras. E quando esse alguém merece o nosso respeito, amizade ou estima não há como recorrer à poesia dos outros, e neste caso à do próprio.
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Pintura de Emerenciano |
«O meu país sabe a amoras bravas/ no Verão.
Ninguém ignora que não é grande, /nem inteligente, nem elegante o meu país, /mas tem esta voz doce /de quem acorda cedo para cantar nas silvas».
Mas neste país tão pequeno, nestas vésperas de Verão, quando as silvas florescem e as rosas se desfazem, eis que partiram… Eugénio de Andrade, Álvaro Cunhal e Vasco Gonçalves.
Desapareceram de repente três nomes que ficarão na nossa história, por razões tão diversas, mas não deixa de ser uma triste coincidência.
De Eugénio de Andrade fica-nos a sua obra que será lida e relida por amigos, intelectuais e o povo anónimo. Os poetas têm destas coisas, são de todos e eternos…
A sensibilidade e delicadeza com que tratava as palavras continuarão sempre presentes e não deixará de nos emocionar sempre que as recordarmos.
Quanto a Álvaro Cunhal, concorde-se ou não com a sua ideologia, ele é uma figura incontornável da luta antifascista, homem de uma dedicação total às causas em que acreditava, de uma simplicidade, cultura e sedução difíceis de igualar. Uma vida inteira dedicada à causa pública.
Perante o seu fascínio era impossível ignorá-lo, era um desafio para qualquer jornalista, impenetrável, coerente até ao fim.
O país precisa de homens verticais, com convicções, de gente com cultura, inteligente, sábia, com sensibilidade, de escritores poetas e pintores…
E volto ao tema com que comecei. Será que alguns erraram?
É altura de aprofundar esses erros, de os analisar com seriedade, de construir algo de novo com a força, a coragem, o saber e a sensibilidade dos que partiram.
Quantas vezes ao analisar a vida dos outros construímos a nossa, introduzindo com sabedoria, respeito e humildade pequenos nadas que mudam o mundo.
Por:
Fernanda Lage
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