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    Arquivo: Edição de 31-03-2023

    SECÇÃO: Cultura


    GENTE DA NOSSA TERRA

    De Ermesinde aos grandes palcos nacionais do teatro musical: eis o trajeto da nossa conterrânea Paula Sá

    Aproveitando a celebração do Dia Mundial do Teatro (27 de março) estivemos à conversa com uma atriz/cantora que tem brilhado nos palcos nacionais em espetáculos de teatro musical há já cerca de três décadas. O seu nome dispensa apresentações, e o seu trabalho tem sido apreciado em inúmeras e grandes produções de nomes conceituados como Filipe La Féria, Carlos Avillez, entre outros. Como tudo na vida também esta atriz/cantora teve o seu ponto de partida, o qual se deu em Ermesinde. É verdade, esta conceituada artista nacional viveu a sua juventude na nossa cidade, onde cresceu, estudou, fez amizades, e descobriu a sua veia artística. Esta figura dá pelo nome de Paula Sá, e nas próximas linhas recorda não só os tempos que passou em Ermesinde, como também alguns dos passos que deu, e tem dado, na sua notável carreira.

    Fotos FACEBOOK PESSOAL DE PAULA SÁ
    Fotos FACEBOOK PESSOAL DE PAULA SÁ
    A Voz de Ermesinde (AVE) Podemos olhar para Ermesinde como ponto de partida da notável carreira que a Paula Sá vem desenvolvendo há cerca de 30 anos a esta parte. Na mente da então jovem Paula Sá que sonhos/ambições habitavam? Por outras palavras, sonhava chegar ao patamar artístico onde está hoje?

    Paula Sá (PS): Guardo tantas recordações felizes dos meus tempos de menina e moça, livre, sempre metida nas casas das vizinhas na zona da Gandra. A minha ama vivia em frente, ao lado do café onde comia ovo cozido, a bicicleta estacionada à porta, percorria os quarteirões, tocava às campainhas e fugia, ia buscar sempre o pão quentinho ao fim da tarde, adorava a minha escola e o meu professor e todos os meus colegas. Era uma criança feliz! Lembro me que aos 11 anos a minha família mudou-se para a zona da Palmilheira, numa vivenda simpática onde as portas estavam sempre abertas para os amigos. A minha primeira experiência nas artes foi na “Clave de Sol” onde tinha aulas de dança jazz e nas festas de fim de ano pediam-me sempre para cantar e eu destemida, nunca recusei. Sempre cantarolei com muito à vontade, visto o meu pai e avô terem sido grandes cantores, encantando os convivas com o “Volare”, “Granada”, “Fado Hilário”…

    AVE: Contrariamente ao que acontece na atualidade, Ermesinde nos anos 80/90 não tinha grande oferta cultural. Como é que a Paula Sá neste contexto não só descobriu a música e a representação, a cultura, no fundo, mas acima de tudo como é que foi abraçando este mundo (da cultura)?

    PS: Lembro-me do meu grupo de amigos se juntar no jardim de Águas Santas. O “Pearl” (um amigo que era fã de Pearl Jam) levava sempre a guitarra e cantávamos muitos temas da onda grunge, Nirvana, Red Hot Chili Peppers, Oasis… Andávamos sempre em grupo, em casa, nos cafés, no snooker-bar, nos jardins. Quanto ao teatro, lembro-me de ter ido ao Seiva Trupe ver o belíssimo espectáculo “Vinho do Porto”. O meu avô trabalhava como bilheteiro no Coliseu e sempre que possível assistia a bailados e circo.

    AVE: Como era o seu dia-a-dia em Ermesinde?

    PS: O meu dia-a-dia até determinada altura era o comum a todos os jovens: estudante, praticante de basket no CPN, umas matines no ARS Nova, convívios no largo da igreja em frente ao shopping de Ermesinde, curso de inglês na Bristol School… até que surgiu a participação no concurso de talentos “Chuva de Estrelas” e a minha vida deu uma reviravolta.

    AVE Ao que sabemos fez também grande parte do seu percurso escolar em Ermesinde. Ainda mantém muitas amizades desses tempos, ainda mantém contacto com esse(a)s amigo(a)s da infância/juventude?

    PS: Tentamos manter contacto através das redes sociais. Tenho procurado pessoas que me marcaram e perdi o rasto. O meu primeiro amor… um rapaz que amava perdidamente sem ser correspondida. Tenho um diário inteiro sobre ele.

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    AVE: Com 13 anos participa no programa televisivo “Chuva de Estrelas”, como já falou, onde obteve um brilhante 2.º lugar ao imitar os 4 Non Blondes com o tema “What’s Up?”. O que é que isto mudou na sua vida, desde logo a sua vida pessoal?

    PS: Tudo. Senti desde o primeiro momento em que pisei o palco uma espécie de chamamento, um lugar de pertença, karma. O meu corpo é o instrumento artístico para o conhecimento da Natureza, do Mundo.

    AVE: Foi também esse o momento em que percebeu que era a carreira artística que queria para a sua vida e de igual modo que Ermesinde, e mesmo o Porto, eram locais já pequenos demais para si no sentido de desenvolver uma carreira profissional, tendo em conta que muito cedo vai para Lisboa trabalhar?

    PS: Iniciei o meu percurso como cantora no Porto, formei uma banda, com a criação de músicas originais, financiado pela BMG sob orientação do Tozé Brito, que me abriu uma porta frondosa de oportunidades que infelizmente não soube aproveitar, talvez pela minha imaturidade.

    AVE: O que é que a fez ficar em Lisboa desde então até aos dias de hoje? O perceber que lá (ou aí, neste caso) é que estão as oportunidades para desenvolver uma carreira sólida e aprender/evoluir como artista?

    PS: O que me fez sair da asa da minha família foi um convite vindo do Filipe La Féria (já tinha participado no seu espetáculo “Gala dos 40 anos da RTP e “Cabaret”) para uma série juvenil ópera rock a ser filmada para a RTP durante três meses. Acontece que desde o momento em que fui viver para Lisboa aos 16 anos, nunca mais parei de trabalhar e estudar, embarcando em projetos muito aliciantes que me permitiram evoluir como artista. Apesar de ainda hoje sofrer com a distância da minha família, temos que ficar onde somos felizes.

    AVE: Faço-lhe a pergunta de outro modo: o que falta ao Porto, a toda a região envolvente, para fixar talentos como a Paula Sá no plano cultural?

    PS: O panorama artístico na cidade do Porto tem vindo a desenvolver-se nos últimos anos. Mas nos anos 90 o Porto era uma cidade sem qualquer aposta na cultura, onde se privilegiava concertos de artistas estrangeiros, os teatros subsidiados e mantidos por elencos fixos, bares de música ao vivo com reduzido acesso ao meio televisivo para além do Monte da Virgem com um programa da manhã, sem agências, nem produtores, nem workshops, nem cabarets, teatro de rua, animação noturna, ou espaços culturais (para além dos Fenianos). Os atrativos e espaços de lazer eram cingidos ao bingo, cinema, bares bafon, prostituição, restaurantes e discotecas.

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    AVE: Tem uma carreira com cerca de 30 anos, uma carreira que não precisa de apresentações e que é sobejamente reconhecida e aplaudida a nível nacional. O que mais a marcou ao longo destes 30 anos em termos de espetáculos/trabalhos?

    PS: Não consigo avaliar o meu percurso profissional com mais ou menos. Na verdade, todos foram preponderantes de igual forma. O mais marcante será sempre o último, porque está mais presente, mas cada trabalho, na devida altura, foi “O tal”!

    AVE: A Paula Sá é cantora e atriz, conjugando estes dois papéis, digamos, nos trabalhos que tem realizando nos últimos anos, desde logo em musicais. Como é que em palco se unem estes dois mundos que para quem está de fora parecem tão distintos: a música e o teatro?

    PS: Comecei o meu percurso como cantora, mas, como referi anteriormente, aquilo que me denomina enquanto artista é o Palco, a exposição aos outros que me levou ao auto conhecimento e à fusão natural de um talento inato que é a minha voz aliado à técnica de representação enquanto artista. Na verdade, todas as formas artísticas quando bem aprofundadas se resumem no poder de despertar emoções ao público.

    AVE: A propósito disto, qual destas duas artes performativas a fascina mais, a música ou o teatro? Ou ambas, já que no seu caso canta e representa em simultâneo?

    PS: É impossível dissociar uma da outra. Ambas me servem para servir o público. Quando canto estou a interpretar um personagem e quando represento estou a “cantar” um texto. As palavras são música e a música é teatro.

    AVE: Voltando a falar em sonhos, ou objetivos. O que é que gostava de fazer no futuro imediato ou a longo prazo? Ou por outras palavras, o que lhe falta fazer para se sentir uma atriz/cantora realizada… se já não o é, claro?

    PS: Já fui, em tempos, a artista cheia de sonhos e expectativas. Durante muito tempo projetei-me num ideal que aos meus olhos seria a meta para a realização profissional e conquistar o estatuto, o topo da fama ou reconhecimento. Hoje, já não vivo com esse peso que me atormentava e me frustrou muitas vezes. Não conseguia compreender que outros chegassem ao “topo” facilmente e eu não. Demorei algum tempo a constatar que a realização se encontra no próprio caminho, na superação dos desafios, no desenvolvimento de ideias, criações artísticas, na ampliação e desdobramento de propostas que te asseguram o sucesso. Outrora, fui plantando cada semente, desolada por não gerar nada e hoje, olho para trás e delicio-me com o frondoso jardim que avisto.

    AVE: A Paula Sá tem a vida profissional e pessoal estabelecida em Lisboa. Nesse sentido, Ermesinde continua a dizer-lhe alguma coisa? Continua a vir cá, tem ligações à terra?

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    (...)

    leia esta entrevista na íntegra na edição impressa.

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    Por: Miguel Barros

     

     

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