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Edição de 30-04-2024
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    Arquivo: Edição de 30-05-2012

    SECÇÃO: Crónicas


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    Sentires únicos, em tempos únicos

    Os abraços dos meninos são sempre diferentes e a ternura que nos transmitem parece sempre e cada vez mais forte e isso senti agora no abraço que o Luizinho me deu aqui no gabinete e que vinha acompanhado de um largo e lindo sorriso.

    Quando escrevi que ter 51 anos é como dançar slow com a vida isso torna-se cada vez mais verdadeiro senão eu não valorizava tanto sorrisos, abraços, palavras de incentivo e gestos de amizade. Eu gosto de os sentir e também de partilhar estes momentos mágicos que agora tenho tempo para descortinar no meio de uma vida que é a minha e também desfrutar disso, felizmente para mim.

    É certo que é mais fácil alegrarmos os nossos dias aqui no gabinete pelo facto de o termos decorado cheio de desenhos de meninos. De uma forma surpreendente, há dias atrás, a minha filha mais nova, que já tem 20 anos, também irrompia aqui na nossa sala de trabalho entregando-me uma folha de papel de desenho em formato A3: «Mãe, tens aqui um desenho!».

    Claro que é impossível não nos emocionarmos com estes gestos de ternura que percebemos não se perdem no tempo e nos dão incentivo para continuarmos e seguir em frente, ainda mais que ontem e enquanto fazia compras voltei a encontrar o Manuel, o menino homem que estagiou connosco – e de sorriso rasgado disse-me que tinha encontrado o tal “patrão”, aquele que incentiva, que promove o engagement que é muito mais forte do que o empowerment, tendo em conta que é a fusão dos interesses do grupo, aquele que faz com que uma pessoa se sinta alegre, feliz e bem disposta porque simplesmente…vai trabalhar e se é verdade que os olhos são o espelho da alma o Manuel retrata isso no brilho espalhado nos seus olhos verdes, cheios de esperança.

    Coisas fantásticas da vida, aquela de que ando em fuga – para a frente, dado que num outro dia encontrei uma pessoa amiga, um pouco mais velha que eu, que tinha perdido os pais de quem tinha cuidado e agora, plena e recheada de dinheiro olhava para mim, cheia de tiques nervosos e não me sabia responder a uma questão tão simples como esta: Que projetos tens para ti? Não sabia a resposta porque estava vazia de objetivos – tudo aquilo que eu não quero para mim.

    Também, muitas vezes, quando pensamos que caminhamos sozinhos enganamo-nos porque, de repente, recebemos um e-mail onde nos escrevem: «…Porque sei que fica feliz por mim, informo que terminei o RVCC, 9º Ano, com antecipação de um mês (…), hoje começo a preparar-me para o 12º Ano e a começar pelo Inglês como língua estrangeira. Lembro-me quando você começou com as Novas Oportunidades. Achei (e comentei) que eu era demasiado velho para o fazer mas agora só quero aprender cada vez mais e conseguir a qualificação que mereço. Bem haja pela vossa postura que para mim serve de exemplo».

    Esta pessoa que assim me escreveu é o pai do Pedro e o sogro da Ana, e todos eles foram testemunhas do tanto que me custou erguer-me, porque eles assistiram a momentos penosos e de muito sofrimento, mas penso que nós os quatro também nunca esqueceremos o meu orgulho quando lhes entreguei uma impressão do testemunho que escrevi sobre esta grande conquista e claro que a resposta que devolvi no e-mail só poderia ser: «Orgulho-me da sua atitude perante o rumo que está a dar à sua vida. O RVCC mudou a minha vida e espero do fundo do coração que mude a sua».

    Melhor do que ninguém saberei qual foi a sua sensação nesta conquista caro amigo, porque terá sido naquele preciso momento, único no sentir, que valorizou o meu entusiasmo e tem perfeita razão quando me escreve uma frase como conclusão: «Pensamos que já sabemos tudo e vem a vida e coloca-nos novas perguntas…». A grande conquista de quem passa pelas Novas Oportunidades e que está muito para além de resultados estatísticos ou índices de empregabilidade, porque falamos do tal fator humano, que em mim teve como consequência a atitude que adotei de não aceitar parar e porque também cheguei à conclusão de que tenho tanto para fazer, corrigir e aprender.

    Foi também este e-mail que me impulsionou para que, no seminário a que assisti no Fórum Cultural de Ermesinde sobre “INO: Heranças e Pontes para a Aprendizagem ao Longo da Vida”, me levantasse da cadeira, perante um auditório cheio de gente que procura uma nova oportunidade e interviesse com um testemunho que é meu, apelando para que não “matem” os sonhos e não façam secar a fonte de conhecimento que existe dentro de todos nós para a construção da tal ponte de que falavam e que deverá ser alicerçada com base num conhecimento fundamental e único – a escola da vida.

    Não imaginava que poderia fazer tanto com tão pouco, e de manhã emociono-me muitas vezes quando olho para o outro lado do espelho e encontro uma alma cheia de tanta coisa, tanto por que sonhar e tanto por que lutar num desafio justo e leal travado com a própria vida, mesmo vestida com roupas que já foram de utilidade para outras pessoas que agora as vendem em banquinhas simpáticas organizadas num mercado que também tem uma vertente cultural – o FleaMarket, onde é difícil regatear preços tendo em conta que do lado de quem vende temos um número significativo de jovens de olhar doce e sorrisos rasgados que nos enternecem e amolecem o “espírito negociante” que às vezes temos que adotar para conseguirmos o melhor preço.

    A magia da vida não será mesmo ter tudo, mas aprendermos a ser felizes com tudo aquilo que temos e que vamos conquistando passo a passo, e enquanto vou escrevendo estes pequenos “post-its” sorrio a pensar no desenho que agora está a decorar a parede do meu cantinho lá de casa, que funciona como o meu “laboratório de ideias” e que foi colado ao lado dos desenhos de infância das minhas filhas e também junto aos que me manda agora a minha filha mais velha, com 30 anos – retratos da evolução da sua filha, a pequena Catarina, que está a crescer a passos largos lá nas terras longínquas do Canadá, e que comovem o coração humano de qualquer avó, mesmo que tenha que andar sempre protegida numa armadura que nos tempos que correm precisa de ser de aço.

    Tudo isto num dia de Maio, que tinha o número 24 e logo pela manhã tinha partilhado uma frase de Charlie Chaplin – «Mais do que de máquinas, precisamos de humanidade!».

    Não passou de moda esta frase e não passa de moda o que respondi quando técnicas de um Centro de Novas Oportunidades me vieram agradecer o testemunho em que enalteci o trabalho das equipas que nos acolhem e apoiam. – Obrigado, digo eu: por uma nova vida, por uma nova oportunidade.

    Por: Glória Leitão

     

     

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