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    Arquivo: Edição de 15-05-2011

    SECÇÃO: Arte Nona


    “L’Immanquable”: uma proposta editorial incontornável

    Iniciada a sua publicação este ano de 2011, a revista “L’Immanquable” é uma novidade de interesse mais do que evidente para o público português.

    Revista francesa, dedicada sobretudo à pré-publicação de pranchas de álbuns do universo da BD franco-belga que aí estão para vir, mas oferecendo também algumas entrevistas e informações sobre novidades editoriais, o seu interesse é inegável.

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    A começar, uma curiosidade intrigante, a distinguir os leitores portugueses: na lombada da revista (grossa de cerca de 150 páginas), figura o preço da publicação nos mercados belga, luxemburguês e dos domínios territoriais franceses (isto é, colónias como a Martinica ou Guadalupe, mas também, surpreendentemente o preço para o mercado português (o único, entre os citados, de língua não francesa).

    “L’Immanquable” é uma publicação com a sede redatorial em Boulogne-Billancourt e cuja propriedade é a mesma de DBD.

    Para os leitores que não conheçam a DBD, digamos que esta é assim um pouco uma aproximação embora ainda distante da notável revista que foram os “Cahiers de la Bande Dessinée”, uma revista que foi para a 9ª Arte aquilo que os “Cahiers du Cinéma” foram para a 7ª.

    Com uma abordagem mais ligeira que os Cahiers, a DBD permite todavia a investigação, reflexão e estudo sobre o mundo da 9ª Arte, no que é atualmente uma das melhores revistas do seu género. Pois bem, os editores de DBD acabaram de lançar mais uma excelente revista e o seu último número (à data que escrevemos) é de interesse superlativo para nós, portugueses, por motivos que passaremos a explicar.

    Neste número de “L’Immanquable”, a par de uma entrevista com Didier Van Cauwelaert, escritor, que assina agora o seu primeiro argumento para Banda Desenhada (“L’Enfant que venait d’un livre”), e de duas outras pequenas entrevistas – com Jacamon, desenhador de outra obra de BD aqui publicada, “Le Tueur”, de Matz e Jacamon; e com Nicholas Pothier, cenarista, e Johan Pilet, desenhador, autores de “Caktus” –, de um texto de Henri Filippini sobre heróis da aviação na BD (a propósito da publicação na revista das pranchas de “Mezek”, de Yann e Juillard), publicam--se ainda as pranchas das obras citadas publicadas na revista (“Mezek”, “Le Tueur”, “Caktus”) e ainda as de “Un Sac de Billes” – fim do tomo 4 – e, sobretudo, para aquilo que mais aqui nos interessa, de “Les Longues Traversées”, a primeira de três partes do Tomo I.

    Obra de Christian Cailleaux e Bernard Giraudau, cuja publicação há muito aguardada, só agora vai chegar ao mercado, dela apresenta “L’Immanquable” uma entrevista com o seu desenhador Christian Cailleaux, que aborda sobretudo a circunstância dolorosa em que se procede à publicação da obra, depois da morte do seu cenarista Bernard Giraudeau, após um penoso percurso final da doença que haveria de o ceifar no mês de julho de 2010.

    Na entrevista Cailleaux explica porque a publicação de “Les Longues Traversées” foi adiada de outubro do ano passado, para quando estava inicialmente prevista, para maio deste ano, sobretudo por razões de respeito para com o cenarista e para não aproveitar oportunistaicamente o momento da sua morte.

    A obra, que revela dois grandes autores, tem como pano de fundo paisagens marítimas, viagens, mas as mais das vezes, paisagens costeiras, vidas de gente comum acostada nos portos, ou de gente incomum, que partiu para travar combates de muita coragem.

    O protagonista é Théo, uma rapaz que amava o mar e que, nas suas viagens, aporta a Lisboa, empenhado em seguir o fio da história que uma mulher, sua paixão de infância, coloca nas suas mãos, a história de Inès de Florès, uma mulher que dirige uma revolta contra a tirania, no Brasil do século XIX.

    Apesar de algumas pequenas incorreções no Português que ali e ali pontuam a obra, esta ligação ao “nosso” universo merece a nossa atenção e o nosso enlevo.

    Primeiro porque o argumento de Giraudeau é soberbo desde o primeiro momento, introduzido com os amores de infância de Théo e de Diego, o seu amigo africano, encontrado em Lisboa.

    Se Théo ainda tocaria, muitos anos mais tarde, a pele da sua amada de infância, Diego não teve tempo, porque ela desapareceu entre as várias vítimas de um genocídio.

    Que este mundo não é o mundo perfeito, isso também constatou a heroína do século XIX, ao descobrir que o seu amado foi torturado até à morte por se opor à tirania sobre os mais fracos e a sua tortura encoberta com um eventual surto de uma epidemia fatal. Inés não se conforma e jura vingar-se, mas sobretudo fazer vingar a revolta.

    Cailleaux tem assim dois panos de fundo sobre os quais trabalhar, escolhendo para as páginas da história de Inés vinhetas não enquadradas com caixilho a preto, flutuando na página, com uma coloração mais sombria ou não perturbada com pormenores que seriam potencialmente corredores para uma diversão indesejada.

    Belos planos de conjunto nas paisagens apresentadas (como em La Rochelle ou na Lisboa de Alfama), grandes planos nas cenas de maior intimidade, como quando Théo encontra Julie, e uma sensação que perpassa para o leitor, de que Cailleaux respeita totalmente a letra e o espírito do argumento de Giraudeau.

    Absolutamente a não perder.

    Por: LC

     

     

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