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    Arquivo: Edição de 30-05-2006

    SECÇÃO: Cultura


    AGORARTE REALIZOU MAIS UM DOS "ENCONTROS DE POESIA"

    "Espírito" de Bocage pairou na Vila Beatriz

    A acolhedora Sala da Lareira da renovada Vila Beatriz serviu de palco a mais um dos "Encontros de Poesia de Ermesinde" que a Agorarte - Associação Cultural e Artística, através da sua "Oficina de Letras", vai regularmente oferecendo ao público apreciador destes eventos culturais.

    Numa altura em que ainda é recordada a passagem do bicentenário da morte de Manuel Maria Barbosa du Bocage, não se podia nem devia deixar passar esta efeméride sem dedicar a este extraordinário vulto da poesia portuguesa da segunda metade do século XVIII a homenagem, ainda que singela, que ele bem justifica e muito merece.

    QUEM FOI BOCAGE?

    Manuel Maria Barbosa du Bocage nasceu no Largo de Santa Maria com a Rua das Canas Verdes, ao lado da igreja de Santa Maria da Graça, em Setúbal, a 15 de Setembro de 1765.

    Seu pai, o bacharel José Luís Soares de Barbosa, foi aprovado para o Desembargo do Paço e nomeado juiz de fora para Castanheira e povos, ouvidor e depois advogado.

    Sua mãe, D. Mariana Joaquina Xavier Hedois Lustoff du Bocage, era descendente de um brilhante oficial de marinha francês.

    A sua infância ficou profundamente marcada por dois infaustos acontecimentos:

    • Com seis anos de idade, vê seu pai ser preso por dívidas ao Estado e condenado a seis longos anos de cadeia.

    • Sua mãe morre também, precocemente, deixando-o órfão de tenra idade.

    Com 14 anos de idade, vai, como voluntário, assentar praça como cadete no regimento n.º 7 de infantaria de Setúbal, transitando daqui para a Academia Real da Marinha, entretanto criada pela rainha D. Maria I.

    Mais tarde, há-de aperfeiçoar os conhecimentos ali adquiridos na Academia dos Guardas-Marinhas, criada em Agosto de 1782.

    ONDE COMEÇA UMA VIDA DE AVENTURA...

    Bocage aprendera bem várias línguas: o Latim, o Francês e o Italiano.

    No mais íntimo do seu ser, porém, ansiava vir a tornar-se um segundo Camões, achando mesmo que, nas suas vidas, havia claros e múltiplos sinais que os tornava muito iguais:

    «Modelo meu és tu, mas... oh, tristeza!...

    se te imito nos transes da Ventura,

    Não te imito nos dons da Natureza".

    Tal como o celebrado autor de "Os Lusíadas", Bocage fez questão de ir ao Oriente e esteve em Goa, em Damão e em Macau.

    Aqui foi ainda mais infeliz do que na passagem pelos territórios da então Índia Portuguesa, pese embora o facto de poder ter contado com a protecção do governador de Macau – Lázaro da Silva Ferreira – e do negociante Joaquim Pereira de Almeida, que o recebeu, o agasalhou e o apresentou à sociedade macaense.

    Ao regressar a Portugal em 1790, foi apanhado pelo turbilhão das ideias liberais que haviam sustentado a Revolução Francesa.

    Bocage não lhe resistiu e, prontamente, compôs muitos sonetos em honra da Liberdade.

    Porém, o forte despotismo da época não podia deixar de perseguir quem, como o poeta, tinha um acrisolado apego à liberdade!

    CONHECENDO AS AGRURAS DA PRISÃO...

    Denunciado à intendência da polícia como autor de uns papéis ímpios, sediciosos e satíricos que apareceram clandestinamente com o título de "Verdades duras", foi preso quando se preparava para partir para o Brasil, a bordo da corveta "Aviso".

    Metido no Limeiro, há-de, mais tarde, contar os tratos que ali lhe deram: como o apalparam, o "segredo" em que foi lançado, as perguntas que lhe fizeram e, finalmente, tudo quanto sofreu até à transferência para os cárceres da Inquisição.

    Seis meses depois, dava entrada no Mosteiro de S. Bento da Saúde, em Lisboa, para, um mês depois, passar para o Hospício de Nossa Senhora das Necessidades dos Clérigos de S. Filipe Nery.

    Os frades do Oratório facilmente o "doutrinaram" e, devido à protecção do ministro José de Seabra e Silva, poucos meses após foi restituído à liberdade, por não lhe terem encontrado no processo motivos de condenação.

    Foi em 1804 que Bocage começou a sentir os primeiros sintomas da doença que o levaria à morte - inflamação das carótidas.

    Os últimos tempos da sua vida foram muito penosos para o infeliz poeta, agitado de terrores e ansiedades, vendo-se pobre e doente.

    Morre em Lisboa a 21 de Dezembro de 1805.

    Como alguém escreveu, "A Literatura portuguesa perdeu, então, um dos seus mais lídimos poetas e uma personagem plural, que , para muitas gerações incarnou o símbolo da irreverência, da frontalidade, da luta contra o despotismo e de um humanismo integral e paradigmático".

    A OFICINA DE LETRAS, MAIS UMA VEZ, CUMPRIU...

    Carlos Faria abriu a sessão, seleccionando três poemas brejeiros do grande vate: "Epigrama imitado", "O cão e a cadela" e "A macaca". Foi o humor caustico a marcar presença!

    António Sousa, com notável segurança e apurada técnica, deliciou a assistência declamando alguns dos sonetos que são marcas importantes da produção bocagiana. Merecidíssimos os aplausos que ouviu!

    Álvaro Mendonça, seguro e eficaz como já é hábito, revelou, uma vez mais, a qualidade da sua voz, muito bem colocada, muito bem timbrada, própria também de que tem uma cultura musical que também ajuda.

    Cláudia Almeida continua a demonstrar, à saciedade, por que é que a poesia, para si, é uma verdadeira paixão: segura, convincente e com um futuro brilhante à sua frente. Especialmente, quando tem oportunidade de declamar os seus poetas favoritos: Florbela Espanca ou Fernando Pessoa.

    O público, que foi sublinhando as diversas intervenções com quentes aplausos, saiu certamente satisfeito com mais esta produção da AgorArte.

    É também oportuno referir as excelentes condições que a Vila Beatriz oferece para actividades deste género, pelo que a nossa Câmara Municipal só tem que continuar a facilitar a sua utilização.

    Por: Carlos da Maia

     

     

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