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    Arquivo: Edição de 30-01-2006

    SECÇÃO: Destaque


    ELEIÇÕES À PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA

    Uma vitória histórica de Cavaco Silva

    Ao ser eleito Presidente da República com o apoio dos partidos da direita, Cavaco Silva quebrou um dos tabus da Democracia que se mantinha desde o 25 de Abril. Mas se, pela primeira vez, o candidato eleito se apoiou nessa franja política, isso, por sua vez, nada diz sobre o que poderá vir a ser o seu mandato presidencial.

    Cavaco beneficiou do apoio de largas massas de eleitores do PS de Sócrates, afirmou um posicionamento ideológico social-democrata (mesmo que fortemente contestado por Soares) e resta saber se se tratou apenas de cortina de fumo para efeitos eleitorais, ou se realmente tal exprime uma postura equidistante da esquerda e da direita. O apoio de Eanes, por exemplo, pode apontar também nesse sentido.

    Não tendo sido nunca afrontado por Sócrates, tudo parece indicar que a coabitação será fácil, e que as medidas de austeridade prosseguirão com o apoio do novo chefe de Estado. Tais medidas, que se espera, possam retirar o País da crise, não deverão deixar, igualmente, de cavar ainda mais o fosso entre os mais ricos e os mais pobres, o que tem caracterizado a evolução da economia portuguesa nos últimos anos. E uma questão que se colocará sempre é saber que tal facto é ou não propiciatório do esforço que sempre se pede aos trabalhadores com vista a uma nebulosa recompensa futura, que afinal nunca chega.

    Fotos MANUEL VALDREZ
    Fotos MANUEL VALDREZ
    Cavaco Silva arrasou a concorrência à sua esquerda, ganhando, ainda que por uma unha negra, logo à primeira volta, as eleições para a Presidência da República.

    Assumindo uma postura distante que, em coerência, vinha mantendo relativamente às forças partidárias de onde era oriundo, o que ficou bem expresso no afastamento relativamente ao PSD de Santana Lopes – a que este agora correspondeu com a sua não declaração de apoio, e que levou mesmo Alberto João Jardim a querer menorizá-lo com o tratamento de Sr. Silva (além da “proposta” de expulsão do partido) –, Cavaco geriu bem este distanciamento, tranquilizando uma larga massa de eleitorado de centro-esquerda que lhe deu o seu voto em detrimento das candidaturas mais à esquerda, incluindo aquela que tinha o apoio do partido no Governo – Mário Soares.

    Se há razões negativas (de protesto) a pesar na escolha do eleitorado relativamente à eleição de Cavaco Silva – o incitamento ao avanço da candidatura de Mário Soares por parte do PS de Sócrates em detrimento da disponibilidade já avançada por Manuel Alegre e a política governamental que sobrecarregou a economia doméstica das classes mais populares, mas igualmente das franjas sociais imediatamente acima entre outras, haverá também que ter em conta razões positivas, como a “eterna” propensão para o reequilíbrio ao centro entre PS e PSD, compensando o perdedor das legislativas com a vitória nas presidenciais, a escolha de uma personalidade com credenciais reconhecidas na área económica, considerada o fulcro da política portuguesa (ainda que, curiosamente para outras franjas políticas, a competência na matéria não tenha sido trunfo decisivo (em termos de habilitação académica, mais do que Cavaco – doutoramento – o expert seria Louçã – doutoramento e agregação).

    Mais razões positivas seriam a expectativa de um posicionamento de Cavaco ao centro ou até ao centro-esquerda, como também por alguns meios se alvitrou (ainda que Jerónimo de Sousa duvidasse da autenticidade de Cavaco ao cantar a Grândola num episódio da campanha eleitoral).

    Razão sem dúvida importante, a mensagem (miragem) de esperança em tempos de crise e dificuldades, encontrada na ascensão social de uma personalidade nascida num berço modesto.

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    Outras razões mais obscuras, há também quem as encontre numa suposta maior facilidade de relacionamento entre Sócrates e Cavaco, do que entre aquele e os candidatos socialistas (incluindo aquele que formalmente apoiou). Isso poderia até explicar, segundo este mesmo conspirativo prisma, a (in)oportunidade dos aumentos da gasolina, por exemplo, a dois ou três dias da data das eleições (na verdade estranho, mesmo na menos manhosa encarnação governamental em termos de expectativas eleitorais tão próximas).

    Certo certo é que a candidatura de Cavaco Silva arrasou, vencendo em todos os distritos do País à excepção de Beja, onde Jerónimo de Sousa obteve um importante triunfo.

    A prestação de Jerónimo de Sousa é, aliás, uma das importantes referências a fazer nestas eleições, pois foi capaz de fixar o eleitorado comunista, resistindo ao triplo cerco de Soares, Alegre e Louçã e obtendo um resultado que, se fica abaixo da prestação dos comunistas (CDU) nas autárquicas (10,97% no conjunto da votação nacional para as câmaras), fica acima do resultado da CDU nas legislativas (7,5%).

    Este é um resultado muito importante para os comunistas que, pela primeira vez, sacodem a aproximação do Bloco de Esquerda.

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    Mas o facto político eventualmente mais importante das eleições terá sido, a pesar de tudo, a humilhação que Manuel Alegre impôs a José Sócrates, suplantando Mário Soares por mais de 6% dos votos expressos. E foi por pouco que Alegre não obrigou mesmo Cavaco, em perda de velocidade na recta final da campanha, a ir à segunda volta.

    Alegre fê-lo sem ter tido o apoio de qualquer máquina partidária e os seus 20% são por isso mais significativos do que, por exemplo, a votação de Salgado Zenha nas eleições em que concorreu também contra o aparelho do PS e Mário Soares. A postura de Alegre na campanha, indo repescar e resgatar alguns temas caros à direita, não deixa de ser controversa e não é claro se essa postura reflecte uma posição crítica ao eurocentrismo triunfante ou é, sobretudo, retórica poética.

    A verdade é que, assente num movimento de cidadãos, a afirmação de Alegre de que pode haver e há política para além dos partidos, está prenhe de possibilidades.

    Por: LC

     

     

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