SECÇÃO: Crónicas

A Caixa de Arquimedes

Eu nem queria acreditar, Orlando! - o tom teatral do amigo Rui, na fila de almoço da cantina da faculdade, prometia história. - As peças do Ostomachion estavam ao lado do caixilho delas a formar, ostensivamente, um triângulo retângulo.

São colegas do curso de Matemática Aplicada, mas o Rui tem um part-time no Museu de História Natural e da Ciência, onde faz visitas guiadas às quartas e aos domingos. Diz que é para ajudar a pagar as propinas, mas percebe-se que ele gosta mesmo é de ver o brilho a acender-se no olhar de quem, de súbito, apreende as pequenas maravilhas da Ciência, expostas no museu.

O Rui falava de um jogo matemático inventado por Arquimedes - o Ostomachion ou Caixa de Arquimedes. É constituído por 14 peças planas, de variados formatos poligonais, com as quais é possível construir figuras geométricas planas, à semelhança do popular Tangram. Na “sala de jogos” do museu, está exposta mais uma dúzia de outros jogos ligados à geometria e à matemática, que foram surgindo ao longo dos séculos.

- Fiquei surpreendido, mas curioso - continuou ele -, porque raramente tenho visto qualquer visitante a conseguir construir outra figura coesa com todas aquelas peças irregulares. Falei com o vigilante da tarde, que me garantiu que tudo tinha ficado arrumado como habitualmente. Mistério… No domingo seguinte, um hexágono sorria-me, zombeteiro, onde devia dormitar um quadrado. O vigilante, desperto para a questão, disse-me que todas as manhãs encontrava uma figura geométrica diferente, construída com as peças do Ostomachion.

- Como podia ser isso? - Orlando acordava para a história.

ILUSTRAÇÃO @RODOLFO.BISPO77

- Não me digas que o Arquimedes voltou lá da Siracusa de antes de Cristo para gozar contigo! - ironizou Orlando.

- Nem pensei no Arquimedes. Já estava a ficar maluco, mas nem tanto! Só pensava em como podia descobrir o que se passava naquela sala, quando eu lá não estava. Então, lembrei-me das câmaras de vigilância, mas a sala dos jogos não as tem. Para grandes males, grandes remédios! No dia seguinte, camuflei uma microcâmara, com emissor, apontada à mesa do Ostomachion.

- Eh, lá! Devias estar mesmo desesperado.

- Só sentia que precisava de desvendar o mistério. Essa noite passei-a no carro, em frente ao museu, a vigiar o Ostomachion pelo meu portátil; mas, acabei por

(...)

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Por: Joaquim Bispo