Azeitona
A oliveira será uma árvore especial? Desde pequeno que a considero sagrada. Sem o ramo de oliveira não haveria idas a S. Martinho à Missa de Domingo de Ramos, nem entrega, depois de benzido pelo Senhor Prior, aos padrinhos, para receber o folar da Páscoa!
A iluminação da aldeia era feita com petróleo ou velas. Só em casos especiais ou, na falta de petróleo a vender, é que as candeias de azeite (mais bonitas, diga-se...) entravam em exercício. Os lampiões de ir às lojas dos animais e palheiros, por precaução de incêndios, eram de azeite. Mas, nos velórios, toda a iluminação era com azeite, em candeeiros especiais e candeias, emprestados por amigos; assim como as almotolias de abastecimento. Os cheiros dos mortiços pavios tornavam o ambiente da sala mortuária própria dos templos ou dos céus?!
Ao matabicho não faltavam os figos secos e nas merendas as azeitonas marcavam presença, e eram guardadas na talha, para todo o ano. Um naco de broa, numa mão, e um punhado de azeitonas, na outra, davam para o lanche da tarde da pequenada na escola! Agora, outros galos cantam: levam pacotes de quase tudo, com as embalagens de batata frita, à frente de outras semelhantes, ou de olivas (nome será poético?), selecionadas e sem caroço.
Em S. João da Pesqueira a bola de carne, como as do folar da Páscoa, leva, no recheio, azeitonas caseiras. É com uma tigela delas cortilhadas que o Mateus convida os amigos para a degustação do vinho novo na adega.
As oliveiras podem ser centenares, quando não milenares. Quase se poderia dizer que são eternas. Qualquer tronco queimado ou destruído dá novos rebentos... Numa plantação de vinha foram arrancadas as oliveiras, dispersas no terreno, e colocadas nas bordaduras dos socalcos. Fiquei cético do trabalho, mas mais incrédulo permaneci ao ver abrir um rego e serem “semeados” nacos de oliveira, cobertas com a terra cascalhenta! Mas, o Manuel foi dizendo:
– Para o próximo ano tenho aqui um alfobre de novas plantas!
Hoje, cercam o plantio de touriga nacional e dão bonitos frutos.
Quando vimos a praça dos Clérigos (Porto) ajardinada com oliveiras e também em terraços de prédios modernos, temos que venerar a árvore?! Sim, mas a parte mais sentimental é ela ser, preferivelmente, escolhida para os pássaros fazerem os ninhos, como os melros e outros.
Se a dieta alimentar anda tanto na berra, não devemos esquecer o consumo do azeite. Molhar o pão torrado – o de centeio é o melhor – em azeite puro é um manjar! Jamais posso esquecer o dia da safra do azeite da quinta do Douro, em que se comiam torradas do famoso pão de Provesende, feitas no bagaço de aquecimento da azenha e mergulhadas no azeite quente, acabado de sair da separadora. A azeitona, utilizada em saladas e aperitivos, deverá também fazer parte das novas dietas sofisticadas, como, por exemplo, em condimentos dos milhos no pote (!), tão apregoados, ultimamente, e tão pouco encontrados nos restaurantes. É preciso dar força à dieta mediterrânica, não esquecendo as papas de sarrabulho feitas com milhos.
Árvore tão bela, tão santificada, tão modesta no cultivo e tão útil, tinha que ter um contra: a apanha da azeitona, durante as geadas de inverno, é um inferno frio! Só as fogueiras e o sobe e desce do nevoeiro, nas linhas de água, dão alento aos apanhadores dos olivais durienses!
A oliveira devia ser entronizada como a árvore de Portugal.
Por:
Gil Monteiro
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