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    Arquivo: Edição de 17-09-2012

    SECÇÃO: Crónicas


    CRÓNICAS DE LISBOA

    Mandar bocas agitadoras

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    Uma das medidas de redução do défice para 2013, tal como já o fora no OE de 2012, passava pelo corte dos subsídios de férias e de natal (SFN) dos funcionários públicos (FP) e dos pensionistas. Contudo, o TC veio declarar a medida inconstitucional, por violar o princípio da equidade, isto é, medida que não abrangia a generalidade dos portugueses. É verdade que aquela medida de cortes salariais não cumpria aquele princípio, mas também é verdade que os FP têm regalias que os trabalhadores do setor privado não têm (por exemplo: não despedimento, etc.) e nunca ninguém, por exemplo o TC, se manifestou sobre essa desigualdade. Aliás, era esse o argumento do Governo, para fazer aquela discriminação dos FP, mas já o mesmo não se passava com os pensionistas pois estes, nos quais me incluo, são equiparados a FP, por força da estatização da SS e esta fazer parte do OE.

    Sendo a síntese do OE semelhante a uma equação matemática ou, se quisermos, a uma balança com dois pratos (Despesas = Receitas +- Défice/Superavit), o défice (ou o superavit, coisa rara há muitos anos no nosso país) depende do desequilíbrio das componentes de cada um dos pratos da balança. Mas este não desaparece por golpes de magia, pelo que aquela medida teria que ser compensada por outra do mesmo efeito. Pretendia o Governo agir sobre as rubricas das despesas, e aquela seria uma medida conjuntural, pelo que tudo indicaria que o Governo iria agir no outro prato da balança, isto é, sobre as receitas, através dum qualquer imposto que não ferisse o princípio da equidade. Matematicamente, o resultado da dita equação não se alteraria porque aquele valor que, na primeira hipótese, estaria a deduzir no lado das despesas, passaria a somar nas receitas.

    Nas componentes desta equação, que matematicamente é rigorosa e “bate sempre certo”, existem muitas variáveis de carácter fiscal, económicas e financeiras, pelo que muitas das medidas escolhidas , quer do lado das despesas quer do lado das receitas, refletem algumas opções tomadas e estas, por sua vez, podem estar impregnadas dalguma ideologia ou pragmatismo político-social. Para além do rigor orçamental e do rigor da gestão e do controlo das despesas e receitas, é nas opções tomadas que, normalmente, os partidos no Governo se diferenciam uns dos outros, agindo sobre um ou os dois pratos da balança, incluindo o défice que será compensado com o endividamento do Estado e que vai ter reflexos nos OE de anos vindouros, colocando-se a questão da solidariedade intergeracional. Será justo que beneficiemos, no presente, de algo que vai ser pago pelos nossos filhos e netos?

    Em reação ao citado chumbo do TC, vários gestores de vários quadrantes partidários e alguns até com passagem pela política, anteciparam a sua opinião, “mandando uma bocas agitadoras” e enviando recados ao Governo, afirmando que os trabalhadores do setor privado já não suportaria mais impostos. Acrescentaram ainda que essa possível opção seria gravosa para a economia, entenda-se, diretamente afetando o consumo dos bens e serviços das empresas que eles lideram, e aumentaria a recessão económica. Mas, pergunto, e os FP e os pensionistas que suportavam aquele corte do SFN que, na prática, eram semelhante a um imposto? Não teria também efeito no poder de compra dos abrangidos, afetando igualmente a economia, ou entendem eles que os valores dos cortes nos seus rendimentos apenas diminuiria a poupança dos visados? De facto, como eles bem dizem, esta duas opções alternativas não são a mesma coisa porque os sacrificados seriam diferentes e, consequentemente, o seu poder de compra seria diminuído.

    Pois bem, “mandados” pela Troika ou não, o Governo avisou que o OE de 2013 vai manter os cortes nos pensionistas e FP, embora com método diferente mas de resultado semelhante, mas, tentando cumprir o que antes o TC chumbou, englobou também os trabalhadores do setor privado com o aumento das contribuições para a SS em 7% o que, na prática, corresponde ao corte de um dos subsídios! Muitas vozes já se levantaram alegando que a equidade continua ferida, porque, de facto, os FP e os pensionistas continuarão a ser mais penalizados. Além disso, os outros tipos de rendimentos continuam de fora destas contribuições adicionais. Óbvio meus caros gestores e demais povo, estas medidas de austeridade, que não agradam a ninguém, visam equilibrar os excessos desregulados do passado que tiveram, e de que maneira, reflexos no consumo de bens e serviços do Estado e dos privados (consumidores e empresas) e bem estar.

    O “boom” ilusório do passado não tinha bases de sustentação económica, como se viu depois e que agora estamos a sofrer. Também as estruturas sindicais já disseram que reforçarão a luta contra estas medidas. As greves são a arma que os trabalhadores no ativo utilizam, na maioria das vezes quando estão em causa cortes de privilégios ou combate à ineficiência (ai a equidade!) mesmo que o “pagador” do seu custo acabe por ser o Estado (nós, com os nossos impostos). De fora deste poder reivindicativo ou contestatário ficam os trabalhadores de setores onde se paga o salário mínimo e os pensionistas. Afinal onde está o princípio da solidariedade nos sacrifícios e nos benefícios? Equidade?

    Além disso, nenhum Governo gosta de fazer o que este é obrigado a aplicar, mas qual é a alternativa? Agora, vemos tanta gente a mandar bocas agitadoras, coisa fácil neste país de sabichões, mas que nada fizeram, e muitos até passaram pelo poder. Pobre deste país com gente assim e, se eu pudesse, o meu “protesto” consistiria em fugir desta gente que me cansa com as suas bocas. Mais obra e menos palavras!

    Por: Serafim Marques

     

     

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