Subscrever RSS Subscrever RSS
Edição de 31-03-2024
  • Edição Actual
  • Jornal Online

    Arquivo: Edição de 15-06-2011

    SECÇÃO: Local


    Algumas histórias sobre imigração

    Decorreu, no passado dia 2 de Junho, no Fórum Cultural de Ermesinde, mais uma das já habituais teatro-conferências promovidas pela Agência para a Vida Local (AVL) da Câmara Municpal de Valongo, tendo desta vez como tema a Imigração – “Imigração – A Verdade da Mentira”.

    A iniciativa, que teve a colaboração do ACIDI – Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural, contou com a presença de Bárbara Duque, do Alto Comissariado, que ali trouxe muita informação atual sobre o fenómeno da imigração em Portugal e, contou também mais uma vez a colaboração do ENTREtanto Teatro que, através da representação e do testemunho pessoal de Júnior Sampaio, diretor, encenador e ator da companhia, ajudou a compreender a forma como são acolhidos os imigrantes em Portugal.

    Fotos MANUEL VALDREZ
    Fotos MANUEL VALDREZ
    Apresentada pela organização do evento (a AVL), Bárbara Duque começou a sua intervenção explicando os fundamentos e missão do Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural (ACIDI), objetivos entre os quais se contam melhorar o acolhimento e a integração dos imigrantes e das minorias étnicas em Portugal, combater a discriminação, promover a interculturalidade e promover o exercício de uma cidadania plena para todos.

    Nos dados que apresentou sobre o fenómeno recente da imigração para Portugal (números de 2009), Bárbara Duque revelou o maior destino dos imigrantes – distritos de Lisboa e Setúbal (o Porto só vem em terceiro lugar) e a origem das comunidades imigrantes, tendo o cuidado, contudo de lembrar que, ao ler estes números devemos lembrar-nos de que os imigrantes mais antigos se encontram já naturalizados.

    Assim sendo, neste momento a maior comunidade de imigrantes é de origem brasileira (116 220), seguindo-se os ucranianos (52 293), os cabo-verdianos (48 845), os romenos (32 457) – sendo de registar que estes são, desde 2007, cidadãos da União Europeia, o que lhes dá um outro estatuto –, os angolanos (26 557) e os bissau-guineenses (22 945).

    O que esta teatro-conferência teve de diferente de outras anteriores foi o processo interativo, pois a dado momento, Júnior Sampaio interrompeu a conferência formal, quando Bárbara Duque falava, para começar a sua própria intervenção, que foi, ao mesmo tempo, estética e pedagógica.

    Na sua performance, o ator, de origem brasileira, contou como foi acolhido no aeroporto, em Portugal, quando aqu i veio para começar a trabalhar (a sua segunda vinda a Portugal).

    Era o ano de 1990 e, entre outras coisas, após interrogado sobre os motivos da vinda a Portugal e sobre os objetos cenográficos que o acompanhavam, viu-se obrigado a despir-se até ficar em cuecas. Mais tarde, interrogado pela assistência à teatro-conferência sobre se viria hoje para Portugal, após tal experiência traumatizante, Júnior Sampaio declararia que não.

    Bárbara Duque, entretanto, retomaria o fio da sua conversa para juntar que, nos últimos 10 anos houve um crescimento de 150 para 214 milhões de imigrantes em Portugal, mas também para referir que se Portugal é um país de imigração, é também, e muito mais, um país de emigração: por cada imigrante há 10 emigrantes portugueses.

    A técnica do ACIDI referiu também os maiores perigos e entraves à plena integração das comunidades imigradas: o desconhecimento da língua, dos hábitos e da cultura, a lei, a situação de isolamento, e as redes de tráfico de imigrantes.

    Júnior Sampaio apontou também alguns dos preconceitos mais expandidos, por exemplo: brasileira com um batonzinho mais vermelho é prostituta.

    Bárbara Duque apresentou um exemplo de uma banda desenhada muito curiosa, “Discriminação em cadeia”, na qual as mais diversas situações vão sendo objeto de preconceito pelas próprias vítimas de esta ou aquela situação discriminatória distinta.

    A questão do conceito de imigração foi também abordada. “Imigrante” é «alguém que se desloca de um país para outro com a intenção de aí residir de forma continuada», pode ler-se numa recomendação da OIT (Organização Internacional do Trabalho).

    O conceito e situação de estrangeiro é também importante para avaliar diferentes situações do ponto de vista do Direito – turistas, imigrantes e cidadãos da União Europeia estão muito longe de ser a mesma coisa, por exemplo.

    foto
    Júnior Sampaio apelou ao desafio de cada um se pôr na pele do outro, uma prática que ele, enquanto ator, muitas vezes repetia. E também ali, onde representou para o público presente (com muitos estudantes jovens), cenas de “A Bailarina Vai às Compras”, numa encenação de Maria do Céu Guerra, em que a personagem representada é um transexual.

    Júnior Sampaio, no período de perguntas e respostas, foi dizendo coisas que exigem a reflexão de todos. Como quando respondeu: «Só dei conta que era brasileiro quando cheguei a Portugal, antes pensava que era uma pessoa do mundo».

    E embora por parte de algum público presente persistisse a ideia de que nós, portugueses, somos os menos racistas, Júnior não deixou de lembrar, respondendo à pergunta de que se alguma vez deixou de se sentir imigrante: «Não. Esqueço-me que sou imigrante, mas as pessoas logo mo lembram.

    E a lição do ator continuou, como quando referiu que viver sem a família lhe fez viver uma grande aprendizagem, e que viver em Portugal lhe deu uma visão melhor do que é viver no Brasil.

    E referiu a peça de Chico Buarque “Fazenda Modelo” (1974), uma alegoria à sociedade humana e ao exercício do poder, mas em que as personagens são exclusivamente bois e vacas.

    E, por fim, na perspetiva mais profunda e ideológica da tarde, disse ainda: «O problema são as fronteiras. Aqui és português, aqui és espanhol. Eu sinto-me português, brasileiro, índio, negro...».

    Por: LC

     

     

    este espaço pode ser seu Este espaço pode ser seu Este espaço pode ser seu
    © 2005 A Voz de Ermesinde - Produzido por ardina.com, um produto da Dom Digital.
    Comentários sobre o site: [email protected].