11ª MOSTRA INTERNACIONAL DE TEATRO ‘08
Saudosos do franquismo devem espumar de raiva...
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Foto URSULA ZANGGER |
Deliciosa farsa em que se ridiculariza ao extremo as alegadas virtudes de um falangismo cruel e “viril”, capaz de gritar “Viva la Muerte!”, a peça de Xúlio Abonjo (que também representa), “Hendaya Mon Amour”, da espanhola Compañia Bacana, é uma provocação e um murro no estômago à direita espanhola, apresentando um Franco fraco, quase efeminado, perdido de amores por Hitler, com quem se encontra às escondidas às portas de França, em Hendaya e de quem concebe um filho.
Além da evidente alegoria à adesão aos valores xenófobos e à alergia comum à existência de um movimento operário independente, o que mais perpassa em “Hendaya Mon Amour”, a nosso ver, é mesmo esse desafio ao império centralizado e duro, capaz do horror, como em Guernica (e aqui está o namoro entre o nazismo alemão e o falangismo espanhol), capaz de pôr o Generalíssimo a berrar com voz de adamada de falsete um “Arriba España!” que faria rir qualquer um, ou de o colocar na situação de toureado pelo dominador Adolfo.
A peça vai beber muito da cenografia, gestualidade e figurinos a Charlie Chaplin (“O Grande Ditador”), com um Adolfo Hitler (“Fito”) soberbamente interpretado por César Goldi.
Ainda quanto à interpretação, Xúlio Abonjo compõe, por sua vez, um retrato físico tão fiel de Francisco Franco (“Paco”), que há alturas da peça em que parece estarmos diante nem mais nem menos do que do próprio caudilho, em pessoa.
E há momentos da encenação muito felizes, como por exemplo a cena em que Hitler e Franco estão na cama. Os espectadores não perdem pitada da situação, pois como “a cama” está colocada na vertical, é como se a pudéssemos ver mesmo por cima dela.
Também no libreto de Xúlio Abonjo, aqui e ali, surgem algumas delícias, como aquela tirada em que, confrontado com dificuldades inesperadas – ainda não as da maternidade empenhada, que virão mais tarde – o aqui muito pouco generalíssimo, proclama, meio decidido: «No Pasarán!».
“Hendaya Mon Amour” é desenvolvida como um musical, tirando da diversidade dos ritmos – balada, copla, twist, pop, hip hop, e outros, e mesmo do seu próprio assimétrico irrompimento – motivos de uma ainda maior e prazenteira comicidade.
A música é da autoria de Pipo Alvariño e Zeta Trupe, e não deixa de adivinhar-se em tudo uma espécie de desagravo galego.
Ficha Técnica:
Direcção e Libreto: Xúlio Abonjo;
Interpretação: Xúlio Abonjo e César Goldi;
Música: Pipo Alvariño e Zeta Trupe;
Duração: 75 minutos.
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