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    Arquivo: Edição de 15-01-2007

    SECÇÃO: Tecnologias


    Copyleft – idealismo pragmático

    Todas as decisões tomadas pelas pessoas têm origem nos seus valores e objectivos. As pessoas podem ter muitos objectivos e valores diferentes; fama, lucro, amor, sobrevivência, diversão e liberdade são apenas alguns dos valores que uma pessoa correcta pode ter. Quando o objectivo é ajudar os outros como a si mesmo, nós chamamos a isso idealismo.

    O meu trabalho com software livre é motivado por um objectivo idealista: espalhar a liberdade e cooperação. Eu quero encorajar a difusão do software livre, substituindo o software proprietário, que proíbe a cooperação, e assim tornando nossa sociedade melhor.

    E esta é a razão principal pela qual a GNU GPL (Licença Pública Genérica GNU) foi escrita como foi – como copyleft. Todo o código-fonte adicionado a um programa coberto pela GPL tem que ser software livre, mesmo se colocado num arquivo separado. Eu torno o meu código disponível para uso em software livre, e não em software proprietário, a fim de encorajar outras pessoas que programam a deixar o seu código livre também. Acho que já que os desenvolvedores de software proprietário usam o copyright a fim de nos impedir de compartilhar código, nós colaboradores, podemos usar o copyright para dar uma vantagem a outros colaboradores: eles podem usar o nosso código.

    Nem todos os que usam a GNU GPL têm isso por objectivo. Há muitos anos atrás, pediram a um amigo meu que relançasse um programa seu, com copyleft, sob termos não-copyleft, e ele respondeu mais ou menos assim:

    Às vezes eu trabalho desenvolvendo software livre, e às vezes eu trabalho desenvolvendo software proprietário – mas quando eu desenvolvo software proprietário, eu espero ser pago.

    Ele desejava compartilhar o seu trabalho com uma comunidade que compartilha software, mas não via motivo para ajudar a desenvolver produtos de grandes empresas, o que estaria fora dos limites de nossa comunidade. O seu objectivo era diferente do meu, mas ele decidiu que a GNU GPL era útil para o seu objectivo também.

    Se uma pessoa quer realizar algo, o idealismo não é o bastante – é preciso escolher um método que funcione de verdade para atingir o seu objectivo. Por outras palavras, é preciso ser “pragmático”. E a GPL, é pragmática? Vamos dar uma olhadela nos seus resultados.

    Considere o GNU C++. Porque é que nós temos um compilador C++ livre? Somente porque a GNU GPL disse que ele teria que ser livre. O GNU C++ foi desenvolvido por um consórcio de empresas, o MCC, começando a partir do Compilador C GNU. O MCC normalmente lança o seu trabalho como software proprietário, tão proprietário quanto este possa ser. Mas eles fizeram a interface para o C++ livre, porque a GNU GPL disse que esta era a única forma de fazê-lo. A interface para C++ incluiu muitos arquivos novos, mas já que eles seriam ligados ao GCC, a GPL se aplicava a eles. E o benefício para a nossa comunidade é evidente.

    Considere o GNU Objective C. A NeXT primeiramente quis fazer essa interface proprietária; eles propuseram lançar isso como arquivos .o, e deixar que os utilizadores nos conectassem com o resto do GCC, pensando que isso seria uma forma de burlar os requisitos impostos pela GPL. Mas o nosso advogado declarou que isso não os isentaria desses requisitos, que isso não era permitido. Então eles fizeram a interface para o Objective C ser software livre.

    Estes exemplos aconteceram há anos atrás, mas a GNU GPL continua a trazer-nos mais software livre.

    Muitas bibliotecas do projecto GNU estão cobertas pela GNU LGPL (Licença Pública Genérica para Bibliotecas), mas não todas. Uma biblioteca GNU que é coberta pela GNU GPL é a Readline, que implementa edição pela linha de comando. Uma vez eu descobri um programa proprietário que foi projectado para usar a Readline, e avisei o desenvolvedor que isso não era permitido. Ele poderia ter tirado a edição via linha de comando de seu programa, mas o que acabou acontecendo foi ele relançá-lo sob a GNU GPL. Agora este programa é software livre.

    Os programadores que desenvolvem melhorias para o GCC (ou para o Emacs, ou Bash, ou Linux, ou qualquer programa coberto pela GPL) são, muito frequentemente, funcionários de empresas ou universidades. Quando o programador quer devolver as suas melhorias para a comunidade, e ver o seu código na próxima versão do programa, o seu chefe pode dizer: «Espere aí – o seu código pertence-nos! Não queremos compartilhá-lo; nós decidimos transformar a sua versão melhorada do programa em software proprietário».

    E aqui a GNU GPL vem ajudar! O programador mostra ao seu chefe que lançar este programa como software proprietário seria infringir direitos de propriedade autoral, e o chefe percebe que ele tem apenas duas opções: lançar o novo código como software livre ou simplesmente não o lançar. Quase sempre ele permite ao programador fazer o que este sempre quis, e o código é liberto na nova versão do programa.

    Mas veja bem: a GNU GPL não é o Sr. Bonzinho. Ela diz “não” a algumas das coisas que as pessoas às vezes gostariam de fazer. Existem utilizadores que dizem que esta é uma coisa ruim – que a GPL “exclui” alguns desenvolvedores de software proprietário que «precisam de ser trazidos à comunidade do software livre».

    Mas nós não estamos a excluí-los da nossa comunidade; eles estão a escolher não entrar. A sua decisão de desenvolver software proprietário é a decisão de ficar de fora da nossa comunidade. Estar na nossa comunidade significa juntar-se e cooperar connosco; não podemos “trazê-los para nossa comunidade” se eles não querem entrar.

    O que nós podemos fazer é convidá-los, induzi-los a entrar. A GNU GPL foi projectada para isso, através do nosso software já existente: «Se você for tornar o seu software livre, você pode usar esse código». É claro, isso não ganhará a todos, mas ganha em algumas vezes.

    O desenvolvimento de software proprietário não contribui para a nossa comunidade, mas os seus desenvolvedores frequentemente querem a nossa ajuda. Utilizadores de software livre acabam motivando-nos através do nosso próprio ego – dando-nos reconhecimento e gratidão – mas pode ser muito tentador quando uma grande companhia lhes diz: «Deixe-nos apenas colocar o seu código no nosso programa proprietário, e o seu programa será usado por muitos milhares de pessoas!». A tentação pode ser poderosa, mas a longo prazo estaremos melhor se lhe resistirmos.

    A tentação e pressão ficam mais difíceis de serem reconhecidas quando vêm indirectamente, através de organizações de software livre que adoptaram a política de fornecerem também software proprietário. O X Consortium (e seu sucessor, o Open Group) dá-nos um exemplo: fundado por empresas que desenvolvem software proprietário, eles lutaram cerca de uma década para persuadir os programadores a não usarem copyleft. Agora que o Open Group fez do X11R6.4 software não-livre, aqueles de nós que resistiram a essa pressão estão felizes por tê-lo feito.

    [Em Setembro de 1998, alguns meses depois do X11R6.4 ter sido lançado sob termos não-livres para distribuição, o Open Group voltou atrás na sua decisão e o relançou sob a mesma licença de distribuição livre de software não-copyleft que era usada para o X11R6.3. Muito obrigado, Open Group – mas a decisão destes de voltarem atrás não invalida as conclusões que tirámos, do facto de que adicionar essas restrições era possível.]

    Pragmaticamente falando, pensar em objectivos de mais longo prazo fortalecer-nos-á para resistirmos a essa pressão. Se focarmos a nossa mente na liberdade e na comunidade que podemos construir ao permanecermos firmes, encontraremos a força para fazermos isso. «Mantenha-se firme por alguma coisa, ou cairá por qualquer coisa».

    E se os cínicos ridicularizarem a liberdade, ridicularizarem a comunidade... se os “realistas” disserem que o lucro é o único objectivo... ignore-os apenas, e use o copyleft assim mesmo.

    Por: RICHARD STALLMANN

     

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