FACTOS DA NOSSA HISTÓRIA (3)
Associação de Beneficência e Culto de Ermesinde
Há 111 anos, em março de 1912, os problemas entre os republicanos da freguesia e o pároco local, estiveram na origem da fundação da Associação de Beneficência e Culto de Ermesinde que se encarregaria da organização do culto católico em Ermesinde, até agosto de 1913. Apesar de ter havido problemas entre a nova administração republicana e os vários sacerdotes das 5 paróquias deste concelho, em Ermesinde é que se viveu a situação mais grave, levando mesmo à criação da Associação de Culto, controlada pelo poder civil.
Implantada a República em Portugal, a Igreja Católica foi vítima da perseguição dos revolucionários republicanos que não perdoaram o carácter conservador da religião católica apostólica romana, sem dúvida a confissão religiosa mais arreigada na tradição popular portuguesa. Nas várias paróquias do concelho de Valongo, como em muitas outras paróquias do País, registou-se também alguma conflitualidade com os respetivos párocos.
Distantes mais de um século destes acontecimentos revolucionários, parece-nos que os republicanos foram longe de mais na sua batalha contra a Igreja, pese embora a influência enorme que a Igreja tinha nas mentalidades, o que ia frontalmente contra os objetivos revolucionários que pretendiam mexer significativamente nas estruturas vigentes. Mas a Igreja reagiu com coragem a essas investidas.
Em Ermesinde, logo que se implantou a República, o Presidente da Junta de Paróquia, Monsenhor Paulo António Antunes, antes de entregar a Administração à nova Comissão Administrativa Republicana afirmou que se congratulava com a nomeação da referida Comissão, a quem muito considerava e que pela sua parte acompanhava o novo regime republicano. No entanto, pouco tempo depois, vários incidentes ocorrem entre a nova administração da freguesia e o Pároco. Primeiro, por causa da velha divisão do cemitério, entre católicos e não católicos, mais tarde, por outros motivos.
Já antes da implantação da República, o Pároco de S. Lourenço de Asmes tinha tido alguns problemas, chegando mesmo a ser agredido.
Aquando do arrolamento dos bens da Igreja pelo Estado, em 1911, por força da Lei da Separação do Estado das Igrejas, o Pároco de Ermesinde, à semelhança do que aconteceu com outros neste concelho, protestou contra o mesmo arrolamento, fazendo anexar aos autos uma declaração, fundamentando o seu desacordo pelo facto de muitos dos bens da Igreja resultarem de donativos e não da contribuição dos fiéis.
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O interior da antiga Igreja de S. Lourenço |
A ideia da criação de uma associação cultual de Ermesinde, surgiu nos finais de 1911 e tinha o seguinte nome “Associação Beneficência e Culto de Ermesinde”. Os seus primeiros Corpos Gerentes foram constituídos pelas seguintes personalidades: Amadeu Vilar (Presidente), Roberto de Barros (Secretário) e A. da Silva (Tesoureiro). Os substitutos eram A. S. Moreira (Presidente) Augusto Mendonça e Augusto Vieira Carneiro (Vogais). No fim do ano de 1911, já os respetivos Estatutos haviam sido enviados ao Governador Civil do Distrito.
No princípio de 1912, o Administrador do Concelho de Valongo manda entregar a esta Comissão Cultual todos os objetos de culto pertencentes à Igreja Paroquial de Ermesinde. O Padre Capelão da “Associação Beneficência e Culto de Ermesinde” foi o Padre Paulo José Pereira Guimarães, que era o único autorizado a presidir aos atos de culto no Cemitério.
Em novembro de 1911, a hierarquia da Igreja já havia nomeado o Padre Eduardo Alves Espinheira, que havia sido ajudante de Paulo António Antunes, para Pároco de Ermesinde. Este, logo que surgiu a Associação Cultual, contestou a sua existência e atuação, fazendo-lhe diversas acusações, diretamente através de cartas e através da imprensa, nomeadamente do jornal “Tribuna”.
No dia 17 de maio de 1912, os fundadores da Associação de Beneficência e Culto de Ermesinde, em abaixo-assinado datilografado, dirigem-se ao Ministro da Justiça, clamando pela resolução deste caso, conforme se pode ver no texto que se segue e que é a transcrição, na íntegra, do referido documento. O governo daria razão à Associação de Culto e o referido padre seria expulso pelo período de um ano.
ABAIXO-ASSINADO DA ASSOCIAÇÃO DE BENEFICIÊNCIA
E CULTO DO MINISTRO DA JUSTIÇA
«Exmo. Sñr / Ministro da Justiça
Os abaixo assignados, socios fundadores da Associação de Beneficencia e Culto de Ermezinde, desgostósos com o procedimento incorrectissimo do reverendo Dr. Eduardo Alves Espinheira, morador no logar d’Ardegães, concelho da Maia, que desde que o ex-paroco d’esta freguesia Paulo Antonio Antunes se homiziou para Hespanha o vem substituindo nas suas funcções parochiaes.
O Reverendo Espinheira guerreia quanto pode a nossa Associação Cultual. Desde a sua organisação, o aludido ecclesiastico, com a ideia de prejudicar o seu regular funccionamento, não celebra na Egreja Parochial os casamentos, nem os baptisados. Os casamentos celebra-os fóra da freguezia e os baptisados realisa-os em qualquer casa.
As cerimonias fúnebres declara que as deixa de fazer na Egreja se os armadores pagarem á cultual, e esse facto tem-se dado visto que um armador não pagou á nossa Associação.
O procedimento do padre Espinheira traz em grande alvoroço os espiritos dos habitantes d’esta freguezia e para que não occora qualquer tumulto lamentavel a bem do prestigio da Republica, e da Lei da Separação que veio libertar as consciencias, urge que V. Exa. Sñr. Ministro da Justiça se digne mandar adoptar as providencias que os factos soccintamente relatados reclamam.
A Cultual de Ermezinde só pede a V. Exa. Justiça!
Se ella nos não fôr concedida, não podemos prevêr o que acontecerá!
Afim de que V. Exa. possa avaliar a maneira como o padre Espinheira acata a lei da Separação, remettemos o incluso No. 17 do semanário “Tribuna” de Villa Nova de Famalicão e uma carta do mesmo ecclesiastico que elle dirigiu ao primeira signatario, que tem a honra de ser o Presidente da Associação Cultual. / Saude e Fraternidade / Ermezinde, 17 de Maio de 1912». [seguem-se 19 assinaturas, sendo a primeira de Amadeu Ferreira de Sousa Vilar].
Tudo acabou em dezembro de 1912, com a decisão favorável à Associação Cultual, publicada em Diário do Governo, que se transcreve de seguida.
«Sobre proposta do Ministro da Justiça e nos termos dos artigos 48.º, 145.º a 148.º, do decreto com força de Lei de 20 d’abril de 1911, hei por bem decretar:
(...)
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Por:
Manuel Augusto Dias
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