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    Arquivo: Edição de 30-05-2005

    SECÇÃO: Crónicas


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    Da euforia à desilusão

    A revolução de Abril de 2004 devolveu aos portugueses o direito de se organizarem politicamente segundo um regime de democracia ocidental, direito esse que lhes havia sido sonegado em 1926, na sequência do golpe militar de 28 de Maio, iniciado na cidade dos Arcebispos. O 24 de Abril de 1974 foi realmente um dia em que a esmagadora maioria dos portugueses se sentiu tão livre quanto os seus concidadãos europeus, com algumas excepções, de que os espanhóis eram uma delas, mas felizmente por pouco tempo.

    A este estado de alma de incontida alegria, iniciou-se uma caminhada em direcção a outros direitos sociais, tais como: acesso a estabelecimentos de saúde em condições de quase gratuitidade, conseguindo-se com esta medida social reduzir drasticamente a taxa de mortalidade infantil e aumentar a idade média de vida dos cidadãos; condições de frequência de escolas do ensino básico e secundário para todos; a justiça também se tornou menos difícil de se lhe aceder; alargou-se a concessão de pensões a cidadãos que nunca contribuíram para a segurança social; acolhemos meio milhão de portugueses regressados de África, concedendo-lhes ajudas para refazerem as suas vidas; institui-se o salário mínimo nacional, assegurando-se por este meio a muitos trabalhadores uma remuneração de reduzida expressão, é certo, mas que veio a revelar-se de singular importância nos tempos actuais; aderimos à União Europeia como membro de corpo inteiro, beneficiando de incontáveis milhões de euros a título de ajudas para nos aproximarmos de valores médios europeus no que toca a nível cultural, desenvolvimento económico, renovação da nossa indústria, construção de infra-estruturas, pleno emprego, etc., etc..

    Foi neste período áureo que surgiram políticos de elevada craveira, cuja motivação foi a prestação de serviço público em diversas frentes: fundação de partidos políticos, preparação de eleições livres para a "Constituinte", elaboração da Constituição da República, conseguida num ambiente hostil que pôs à prova a robustez democrática dos políticos de então que se bateram contra os que pretendiam substituir uma ditadura de direita por outra de sentido oposto ou, no mínimo, por uma democracia musculada. Lembremo--nos da coragem de muitos que estiveram presentes na primeira fila no Palácio de Cristal, no Estádio das Antas e na Fonte Luminosa.

    O PERÍODO DE BEM-ESTAR

    Vencidas estas determinantes "batalhas", seguiu-se um período de bem-estar da população, com o país a conhecer taxas de crescimento bastante acima da média europeia, os portugueses a terem acesso a bens de consumo que antes lhes estavam economicamente vedados, a gozarem as suas férias em lugares aprazíveis, tudo isto possível porque não havia o espectro do desemprego, e o "monstro" do défice era vocábulo ausente nas lucubrações do povo. Os portugueses tiveram nesta altura razões para pensarem que, a exemplo do que acontecia em outros Estados soberanos, designadamente em Espanha e na Irlanda, o país era governado por políticos competentes e sérios, que serviam a coisa pública com sabedoria e espírito de serviço, impermeáveis a tentativas de corrupção que nesse tempo já abundariam.

    Foto Arquivo DN
    Foto Arquivo DN
    Depois desta gesta de políticos de grande gabarito que, para mal de Portugal e dos portugueses se afastaram da lides politico-partidárias, apareceu uma outra camada de oportunistas que, com grande probabilidade de acerto, poderíamos designar por políticos de terceira escolha, medíocres, a grande maioria deles sem qualquer curriculum que os recomendassem para quaisquer tarefas que exigissem competência e lhes assacassem responsabilidades, ávidos de enriquecerem rapidamente, não fossem as circunstâncias lhes impedirem o exercício de funções inicialmente previstas para quatro anos, limitando-as a quatro meses ou a quatro dias, mais preocupados em executarem recados dos lobbies que contribuem para o seu inexplicável património pessoal e os empurraram para a ribalta política, do que servirem a causa pública que solenemente juraram cumprir e que fora apanágio dos seus antecessores.

    O resultado desta evolução está à vista. Quando seria legítimo acreditar que estivéssemos em igualdade de condições com os nossos parceiros europeus, designadamente com os espanhóis, irlandeses e mesmo gregos, eis que nos confrontamos com o desolador quadro negro traçado pelo primeiro-ministro na casa da democracia: a Assembleia da República.

    Compreendendo o seu inusitado incómodo, José Sócrates viu-se na imperiosa necessidade de anunciar aos deputados da República e, simultaneamente a todos os portugueses, que os próximos tempos serão de grande aperto do cinto, com o objectivo de contrariar a escalada do défice público e com a imperiosa necessidade de aplicar medidas que evitem, não só a sua progressão, como obtenham a sua redução sustentada, por forma a que, a médio prazo, possamos cumprir as exigências do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), estabelecido pela União Europeia aos países aderentes à moeda única, o euro, sob pena de sermos penalizados na concessão de fundos que temos recebido à cadência média de 3,5 milhões de contos diários nos últimos vinte anos. Foi muito dinheiro, cuja parte significativa foi desbaratada em favor de interesses privados e bem diferentes dos invocados para a sua obtenção.

    Estamos, pois, chegados à grande frustração, fruto da (des)governação de políticos incompetentes, corruptos e oportunistas, alguns deles a contas com a justiça, mau grado a teia que têm sabido urdir à sua volta para darem uma imagem de gente séria e dificultarem a acção inspectiva às suas censuráveis acções.

    POLÍTICAS POPULISTAS

    Na altura em que deveríamos poder gozar de algum conforto, de nos aproximarmos do nível de vida dos nossos parceiros europeus, de usufruir de algumas das regalias que aqueles nossos compatriotas de há muito beneficiam, eis que voltamos a ser sobressaltados com o estado caótico das finanças públicas e com o anúncio de que algumas, poucas, conquistas sociais, serão sacrificadas no altar do equilíbrio das contas públicas.

    Não ignoramos que algumas das medidas anunciadas pelo primeiro-ministro, no passado dia 25 do mês de Maio na Assembleia da República estão em consonância com o que pensamos, nomeadamente quanto à crise dever ser suportada por todos e não só por alguns. Mas ao não tocar nos desperdícios que todos sentimos haver na gestão dos governos autónomos e nas autarquias locais, gera nos cidadãos um desconforto próximo de crer que a coragem demonstrada por José Sócratas fica aquém do que precisa de ser dito e feito a membros de algumas corporações, designadamente a políticos medíocres e oportunistas, a gestores dos governos regionais e autárquicos, a empresários que sacrificam o emprego ao lucro desmesurado, a incumpridores das obrigações laborais e fiscais, sem esquecer os titulares de pastas ministeriais, alvo de acusações graves cometidas no exercício das suas funções governativas.

    Quando se prepara e exige aos portugueses novos e pesados sacrifícios, é socialmente imperioso que o esbanjamento reinante nas autarquias locais e a sobranceria do Governo Regional da Madeira sejam penalizados na exacta medida em que afrontam o desconforto dos portugueses que, com as contribuições do seu trabalho, alimentam estas condenáveis situações. Que Alberto João Jardim entenda conceder "pontes" aos funcionários públicos da Madeira e limite o imposto do IVA a 15%, quando no Continente os demais portugueses suportarão 21% poderá ser lá com ele, desde que o Governo da Nação não contribua para os seus disparates. Caso contrário, é urgente submeter este senhor a regras nacionais que impeçam que haja portugueses que paguem com parte do seu trabalho para que outros gozem o "bem bom". Pela nossa parte, continuamos a pensar ser um urgente e indeclinável dever nacional, impor a independência à Madeira ou, em alternativa, obrigar os seus órgãos a respeitar as leis da República a que livremente queiram manter-se associados. Continuar a custear as políticas populistas do Alberto João é que não.

    Por: A. Alvaro de Sousa

     

     

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