50 ANOS DO 25 DE ABRIL
Memórias de quem (Alberto Veloso) lutou pelo 25 de Abril de 1974
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Foto MANUEL VALDREZ |
Reside em Ermesinde desde 1973, mas foi na sua cidade natal, o Porto, que viveu ativamente a política de oposição ao regime fascista que seria derrubado no dia 25 de Abril de 1974. Alberto Veloso, a quem nos referimos, partilhou com o nosso jornal memórias do seu ativismo político, da luta pela liberdade, pelo fim da guerra colonial. Nasceu a 9 de julho de 1946. As ideias, ou ideologia política, colheu-as logo na infância, no seio de uma família «remediada» portuense, como nos conta. O avô era republicano, vivenciou a revolta de 31 de Janeiro. Recorda que em sua casa o seu pai ouvia a Rádio Moscovo (emissora clandestina), a qual «ouvíamos com um pires de água em cima (do aparelho de rádio), ouvíamos muito baixinho», pois havia a ideia de que este procedimento impedia a PIDE de detetar as ondas da emissão. É nessa altura que começa a adquirir alguns ensinamentos políticos, e com 12 ou 13 anos vive a campanha – com vista às presidenciais de 1958 – de Humberto Delgado e a este propósito conta outra história curiosa enquanto apoiante do então candidato da oposição ao regime de Salazar. «Na altura ninguém se atrevia a fazer emblemas de Humberto Delgado para colocar na lapela dos casacos. Com alfinetes fazíamos um H e um D e colocávamos na lapela do casaco. E eu andava assim, tal como o meu pai e o meu avô também andavam».
Este ativismo político prosseguiu na escola – estudou na Escola Comercial Oliveira Martins –, na tropa, e no emprego. Profissionalmente esteve ligado aos jornais, no setor administrativo, começou no “Primeiro de Janeiro” (PJ), passou para o “Jornal de Notícias” (JN), depois para o “Público”, e de novo para o “JN”. No “PJ” recorda que teve grandes mestres (que partilhavam da sua ideologia política de opositor do regime), como por exemplo o jornalista Teixeira e Castro, embora recorde que antes da Revolução dos Cravos não havia grandes contactos entre a redação e o setor administrativo do jornal, «e embora eu já conhecesse alguns elementos (jornalistas) houve uma ligação mais profunda (entre setores) após o 25 de Abril, em que as pessoas se assumiram».
Aliás, estava profissionalmente ligado ao “PJ” quando se deu o 25 de Abril de 1974. Ou melhor, estava de férias, sim, porque já tinha direito a férias, um direito que não era comum a todos, já que para ter direito ao gozo de um período de descanso era necessário trabalhar três anos seguidos. Mas voltando atrás, Alberto Veloso encontrava-se de férias nessa data histórica porque lhe acabara de nascer a filha e queria, naturalmente, estar ao lado dela e da sua esposa. Diz-nos, aliás, que teve dois presentes (em 1974): o nascimento da sua filha (a 16 de abril) e o 25 de Abril. Já a viver em Ermesinde, recorda que no dia em que se dá a revolução não soube no imediato o que se tinha passado. «Não tinha televisão, tinha um rádio a pilhas, mas nesse dia não tinha pilhas!». Recebeu um telefonema da sua mãe, a dar-lhe conta de uma revolução em Lisboa. “Vê lá se sabes o que passa”, dizia-lhe ela, ao que Alberto Veloso respondia do outro lado da linha: “mãe, desliga, desliga”. E este apelo em desligar a chamada acontecia porque não sabia de que lado vinha a revolução, e como já tinha sido sinalizado pela PIDE no passado, ou já lá tinha ficha, como se dizia na altura, mais valia prevenir do que remediar. Claro que depois foi ao “PJ” inteirar-se do que se tinha passado na realidade, e quando regressou ao serviço após o período de férias, do seu chefe ouviu a seguinte exclamação: «Agora percebo porque é que você tirou férias» (risos), numa clara alusão a que o nosso entrevistado tivesse estado envolvido, de alguma forma, no que se passou no dia 25 de Abril de 1974.
A envolvência política tinha começado muito antes, como já vimos. Na juventude, recebe o primeiro convite «da malta de medicina», de estudantes opositores ao regime marcelista, para distribuir uns panfletos contra a guerra colonial. Disse logo «eu vou distribuir». Nesse grupo de estudantes encontrava-se Raul Nogueira, mais tarde conhecido médico e militante do Partido Comunista Português (PCP). Reúnem-se no Porto, na casa deste então estudante de medicina, onde jogam xadrez e bebem whisky, até que pelas três horas da madrugada arrancam para a Senhora da Hora, para distribuir, em locais estratégicos, claro, os panfletos. «Como essa malta eram estudantes de medicina os laboratórios davam-lhes amostras de medicamentos que vinham em caixas. Uma das caixas estava cheia de panfletos. Ah! Olha o que temos aqui! E lá fomos distribuir, usando roupas incaracterísticas. Essa malta tinha uma estrutura espetacular», relembra Alberto Veloso, que a propósito da distribuição de panfletos diz que uma das coisas que mais gozo lhe dava era colocar panfletos no urinol público localizado junto ao cemitério do Prado do Repouso, mesmo ao lado da sede da PIDE. «Havia lá uma mijadeira daquelas antigas em ferro, e à porta da PIDE havia um velhote, de metralhadora, para trás e para a frente. Então, eu colocava um montinho de panfletos em cima da mijadeira e aquilo com o vento esboaçava para todo o lado, já que eram feitos de papel muito fino. Estava assim cumprido o objetivo (risos)».
Com a PIDE conta outro episódio, num tempo em que já era militar, por volta de 1969, altura em que a polícia política portuguesa o foi procurar a casa. «Foi das poucas vezes que vi o meu pai chorar», recorda. Nessa altura, Alberto Veloso cumpria serviço militar no quartel da Serra do Pilar e quando chega a casa, na zona do Bonfim, para almoçar, o seu pai conta-lhe o sucedido: “Tu estás desgraçado! Esteve aqui em casa a PIDE a perguntar por ti”. O nosso entrevistado liga para o quartel, alertou o seu capitão da ocorrência e diz que provavelmente irá faltar de tarde porque a PIDE iria voltar para falar consigo. E assim foi. «Em pezinhos de lã fizeram-me perguntas e mais perguntas. Onde é que eu parava; que era onde toda a gente parava, ou seja, o primeiro café Capa Negra, no Bonfim. Aquilo era um “ninho de vespas”. Foi aí que comecei a conhecer maoístas, trotskistas. A malta juntava-se ali e havia discussões mais exaltadas», recorda Alberto Veloso que então estava mais ligado ao MDP/CDE. «Respondi-lhes que parava no Capa Negra, e eles fartos de o saber, claro. E quando me perguntaram sobre que falávamos, respondi-lhes que falávamos de gajas, de bailes, de futebol…do meu FC Porto, embora eu nem soubesse quem era a equipa do Porto (risos)», relembra. “Mas há ali umas conversinhas esquisitas”, retorquiu a PIDE, ao que Alberto Veloso foi pronto a responder: «Não percebo a ponta de um corno do que eles dizem (risos). E assim passou».
Não foi para a guerra colonial, era 1.º Cabo Escriturário, o que na altura foi uma fuga à guerra. Mas na tropa, como conta, já se falava abertamente, sobre a guerra, por exemplo. «Havia malta, como sargentos, que dizia que se fosse mobilizada novamente que desertava. Havia já gajos exaltados, estavam fartos», diz-nos. Alberto Veloso guarda muitas histórias da tropa, sobretudo do quartel da Serra do Pilar, onde desempenhava funções no Conselho Administrativo. Ali, nas vésperas das eleições marcelistas, de 1969, um capitão pede-lhe para reunir os camaradas da sua divisão no sentido de simular o ato eleitoral para conhecer as tendências das pessoas que ali trabalhavam. Fez-se uma urna com uma caixa de sapatos, folhas de papel iguais, e toda a gente escreveu na mesma máquina de datilografar em quem pretendia votar. Resultado: ganhou o MDP/CDE, e a União Nacional (UN) só teve dois votos! “Pronto, meus senhores, vamos queimar isto (os papéis). Já tenho ideia sobre a tendência de voto da divisão”, disse o capitão. No quartel já havia formação política, como dá nota Alberto Veloso, que recorda ainda que a propósito das eleições de 1969 é interpelado pelo
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Por:
Miguel Barros
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