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Edição de 30-04-2024
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    Arquivo: Edição de 15-12-2016

    SECÇÃO: História


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    A Primeira Guerra Mundial tem Cem Anos (21)

    Diário de um Prisioneiro de Guerra (parte 4)

    Nesta edição concluímos o "diário", que o Tenente-Coronel João Carlos Craveiro Lopes escreveu enquanto foi prisioneiro dos alemães, no período final da Primeira Guerra Mundial. Aí tomou nota do difícil dia a dia dos Campos de Prisioneiros destinados a oficiais, que conheceu na primeira pessoa. Hoje recordaremos o final da Guerra, que se enquadra bem na quadra natalícia que vivemos, e daremos conta das suas anotações acerca da tentativa revolucionária pró-soviética que ocorreu na Alemanha no período final da Guerra, muito por influência do bolchevismo russo, que um ano antes triunfara no maior país do mundo.

    Já em novembro de 1918, o diário do oficial-prisioneiro português regista o começo da "revolução soviética" na Alemanha. Não deixa de ser curioso observar que ao longo de vários meses o principal destaque do "diário" foi sempre o quotidiano dos campos de prisioneiros, com referências muito isoladas e algo imprecisas aos eventos históricos contemporâneos: uma ou outra revolta em Portugal, nomeadamente o sidonismo, rumores de um golpe em França, as primeiras notícias da epidemia da "gripe espanhola" (referida em 13 de novembro), que ia ceifar milhões de vidas nos anos seguintes também em Portugal.

    A revolução russa, ocorrida em novembro de 1917 e liderada por Lenine, Trotsky e Estaline, é completamente omitida do texto do diário, mas, ao referir-se à revolução na Alemanha, o Tenente-Coronel João Carlos Craveiro Lopes mostra uma inesperada familiaridade com o conceito dos "sovietes". É na entrada com a data de 6 de novembro, quando afirma "Chegam notícias da revolução em Hamburg, Ischl, etc. Os soldados organizam "sovietes", mandam fechar os clubs de oficiais, a comida para oficiais e soldados é a mesma, enfim, a revolução na Alemanha".

    Ao mesmo tempo, a naturalidade com que anteriormente os prisioneiros encaravam uma possível derrota francesa, dava lugar a uma profunda apreensão perante esta revolução de contornos "sovietistas": "Que sorte nos esperará? Combinámos, um grupo de oito fugir caso os revoltosos aqui venham".

    Mas nos dias seguintes, os prisioneiros habituam-se à ideia e a detetar sinais evidentes de que a revolução é mesmo uma realidade. A 7 de novembro, "chegam notícias de que a revolução não tem a gravidade que se julgava. O Governo reconhece os comités de soldados". A 9 de Novembro, o Tenente-Coronel João Carlos Craveiro Lopes comenta, quase desapontado: "Esperamos a toda a hora a comissão de revolucionários, mas parece que ela se limita a substituir os oficiais alemães".

    ILUSTRAÇÃO RELATIVA À ASSINATURA DO ARMISTÍCIO E SEUS INTERVENIENTES NO INTERIOR DA CARRUAGEM (11-11-1918)
    ILUSTRAÇÃO RELATIVA À ASSINATURA DO ARMISTÍCIO E SEUS INTERVENIENTES NO INTERIOR DA CARRUAGEM (11-11-1918)
    Dois dias depois, chegam notícias que já não deixam dúvidas, e também alguns rumores impossíveis de confirmar: "Às 5h da tarde soubemos que a revolução alastra na Alemanha e que o governo foi substituído por outro socialista e que o imperador fugiu para a Holanda! (...) Às 9h da noite vêm-nos dizer que parte da esquadra inglesa entrou no canal de [Kiel?], confraternizando com a esquadra alemã, que por toda a França há sovietes de soldados, que Foch foi [ilegível], Clémenceau demitido, etc. e que tudo se complica".

    O movimento revolucionário na Alemanha, a que João Carlos Craveiro Lopes se refere no seu diário, surgiu em novembro de 1918, quando o governo alemão libertou Rosa Luxemburgo que se encontrava presa. Imediatamente ela deu continuidade à agitação revolucionária, através do seu periódico Die Rote Fahne ("A Bandeira Vermelha") e fundando, com Liebknecht, no dia 31 de dezembro, o Partido Comunista da Alemanha. Entretanto, uma série de eventos revolucionários com recurso a armas eclodiu nas ruas de Berlim a favor dos "espartaquistas".

    Quando o país que deu origem à Guerra e a alimentou durante quase todo o tempo, contra a maior parte dos países que se envolveram, a perde, era de supor que, internamente, o poder político tenha de ser deposto e substituído imediatamente. É, pois, nesta conjuntura que surge a movimentação "esparatquista" revolucionária.

    No dia 9 de janeiro de 1919, Berlim encontrava-se em estado de sítio. Luxemburgo e Liebknecht, perseguidos, sabiam que já não havia mais para onde fugir. Em 15 de janeiro de 1919, Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht que constituíam os melhores cérebros da classe trabalhadora alemã tornaram-se as suas figuras mais heróicas, ao serem "brutalmente assassinados".

    Os assassinatos de Luxemburgo e Liebknecht foram decisivos para a derrota desta tentativa revolucionária alemã.

    Rosa Luxemburgo deu uma grande contribuição à compreensão das ideias marxistas e à sua expansão entre os movimentos da classe operária.

    O seu livro Reforma ou Revolução (1899), não é só uma explicação das ideias gerais do marxismo em contraponto à mudança reformista defendida pela social democracia europeia. Foi escrito com o propósito de criticar o "revisionismo" de Eduard Bernstein.

    Rosa Luxemburgo, tal como Vladimir Lenin e Leon Trotsky, contrariou as ideias revisionistas e esclareceu a sua compreensão do capitalismo daquele tempo, analisando a relação entre "reforma" e "revolução".

    Rosa Luxemburgo reconheceu a atrofia ideológica da social-democracia, ainda antes da primeira guerra mundial, que culminou na catástrofe dos deputados do SPD que votaram a favor da Guerra, no Parlamento (Reichstag), convictos de que a venceriam e de que, assim, a Guerra acabaria por ser benéfica para a consolidação do imperialismo alemão. Os líderes do SPD e dos sindicatos já se tinham "acostumado a compromissos e negociações dentro da estrutura do capitalismo em ascensão".

    Por: Manuel Augusto Dias

     

     

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