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    Arquivo: Edição de 01-03-2014

    SECÇÃO: História


    Quando Portugal foi tratado como uma “colónia” inglesa

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    No passado dia 19 de fevereiro de 1810, há 204 anos, são assinados, no Rio de Janeiro, entre Portugal e o Reino Unido, os Tratados de Comércio e Navegação e de Aliança e Amizade, que na prática representam uma clara situação de dependência económica, política e militar de Portugal face ao poderio britânico. Estávamos no período de implantação dos regimes liberais na Europa.

    Efetivamente, desde o início do séc. XIX que Portugal, duma forma mais intensiva, era afetado pelos ideais de liberdade que aqui chegavam através dos estrangeirados (vindos da Inglaterra e da França), dos exilados franceses (fugidos para Portugal, aquando do terror da “Convenção republicana francesa”) dos exilados portugueses regressados do estrangeiro (fugidos às perseguições policiais) e da maçonaria (associação secreta presente nas principais cidades, desde finais do séc. XVIII).

    Como se sabe, entre 1807 e 1811, Portugal foi vítima de três invasões napoleónicas, com o objetivo de obrigar o nosso país a cumprir o “Bloqueio Continental” à Inglaterra. A 1ª (1807) dirigiu-se a Lisboa, comandada por Junot, que governou o país vários meses; a 2ª (1809) dirigiu-se ao Porto; e a 3ª (1810-1811) novamente a Lisboa, mas sem êxito. A vinda dos franceses provocou a vinda dos ingleses para ajudarem a defesa portuguesa, mas estes tornaram-se os dominadores de Portugal e dos seus interesses, o que provocou um ódio popular contra o domínio inglês, que está na origem da Revolução Liberal, ocorrida na cidade do Porto, no dia 24 de agosto de 1820.

    No período das Invasões Francesas, e no período subsequente, a situação económica portuguesa agravou-se (as despesas excediam em muito as receitas), devido à situação de guerra em que se vivia e pelo facto dos portos brasileiros terem sido abertos ao tráfego internacional (dominado claramente pela Inglaterra) e os ingleses concorrerem abertamente no mercado interno português.

    O Tratado de Comércio e Navegação estabelecia, concretamente para os negócios com o Brasil, taxas mais baixas para as importações da Inglaterra do que para os produtos portugueses, eliminando por completo qualquer hipótese de concorrência por parte de Portugal. Assim se fazia compensar do prejuízo com o bloqueio continental decretado por Napoleão e se tornava a principal distribuidora, na Europa, dos produtos tropicais brasileiros. Este Tratado previa, igualmente, que os navios de guerra ingleses pudessem frequentar livremente os portos brasileiros, como se portugueses fossem. Portugal e o seu império tornavam-se na prática colónias inglesas.

    O Tratado de Aliança e Amizade para além de consolidar a velha aliança político-militar entre Portugal e a Grã-Bretanha procurava, também, abolir o tráfico negreiro (a Inglaterra procurava assim alargar o seu mercado, já que os escravos transformados em assalariados se tornavam consumidores).

    Em relação à escravidão este Tratado determinava uma gradual extinção do comércio de escravos e decidia, ainda, que os portugueses só poderiam capturar escravos nas regiões africanas que pertencessem a Portugal. A ação repressiva inglesa ia mais além, prevendo prazos para o total encerramento do tráfico negreiro e permitindo a busca em navios que fossem considerados suspeitos de negociar escravos.

    Ao mesmo tempo, os ingleses passavam a ter o direito de cortar madeiras nas nossas matas e de com elas construir navios, podiam manter uma esquadra bélica no nosso litoral e os súbditos de Sua Majestade em terras portuguesas passavam a beneficiar de total liberdade religiosa. Em matéria de justiça e de religião os benefícios para os ingleses ainda iam mais além: os súbditos ingleses residentes em domínios portugueses só podiam ser julgados por juízes ingleses, e, portanto, segundo a lei inglesa; tinham o direito de construir cemitérios e templos protestantes, logo que não tivessem a aparência externa de templo; e era-lhes garantido que a Inquisição não seria instalada no Brasil.

    Tudo isto provocou um natural mal-estar na Nação, sendo a burguesia o grupo social mais descontente e prejudicado com o domínio inglês. Não admira, por isso, que tenham sido burgueses (comerciantes, profissionais liberais, oficiais do exército, advogados, industriais e médicos) os fundadores e frequentadores do “Sinédrio”.

    Em 24 de agosto de 1820, aproveitando a Revolução espanhola e, sobretudo, a ausência de Beresford no Brasil, dá-se então no Porto a Revolução Liberal Portuguesa, que obriga a Corte a regressar do Brasil e cria condições para acabar com o absolutismo, fazendo-se eleições e elaborando-se uma Constituição Liberal.

    A 1ª Constituição Portuguesa foi a de 1822, terminada em setembro desse ano, foi jurada e promulgada por D. João VI em 1 de outubro de 1822. Nas Cortes Constituintes, registaram-se-iam posições bem diferenciadas: a dos moderados (que queriam um texto constitucional mais conservador), a dos radicais (que seguiam o modelo francês da “Convenção”) e a dos gradualistas (que defendiam um diálogo entre as outras duas posições).

    Inspirada nos textos constitucionais franceses e na Constituição de 1812 espanhola, a Constituição de 1822 declarava o direito à liberdade, à segurança e à prosperidade, estabelecia a igualdade perante a lei e a liberdade de pensamento. Proclamava a monarquia constitucional hereditária, com a separação tripartida do poder político (poder executivo para o Rei; legislativo para as Cortes; e judicial para os Tribunais). O direito de voto (sufrágio direto) passa a ser reconhecido aos homens, com mais de 25 anos, que soubessem ler e escrever.

    Muita conflitualidade havia de marcar a primeira metade do século XIX português, mas o Liberalismo acabaria por ficar.

    Por: Manuel Augusto Dias

     

     

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