Subscrever RSS Subscrever RSS
Edição de 31-03-2024
  • Edição Actual
  • Jornal Online

    Arquivo: Edição de 30-06-2012

    SECÇÃO: História


    foto

    Em pleno Estado Novo salazarista Portugal perde Goa, Damão e Diu

    Depois de, em dezembro de 1961, a União Indiana ocupar, pela força, os territórios administrados por Portugal há alguns séculos, eis que chegam a Lisboa os primeiros prisioneiros portugueses, faz agora meio século. Contudo, o regime salazarista não lhes perdoaria o facto de se terem rendido, como se na prática fizesse alguma diferença. Como poderiam 3 500 homens mal armados enfrentar 50 000 homens da União Indiana? A desigualdade de forças e de meios era uma evidência que não pode ser escamoteada.

    Foi no dia 18 de dezembro de 1961, há 50 anos e meio, que Portugal perdeu o seu primeiro território colonial no século XX – o Estado Português da Índia, ou seja um conjunto territorial de 4 194 quilómetros quadrados, normalmente designado por Goa, Damão e Diu. Estávamos em pleno Estado Novo, dirigido pelo fundador do regime, António de Oliveira Salazar.

    Cerca de dois anos após o termo da 2ª Guerra Mundial a União Indiana conseguiu a sua independência da coroa britânica e já se esperava que também não quisesse manter a permanência colonial portuguesa (na década de 1950, o primeiro-ministro indiano Nehru já havia reclamado a devolução daquela parcela de território) que durava há quatro séculos e meio, desde que Afonso de Albuquerque a havia conquistado, no dia 25 de novembro de 1510.

    Goa tornar-se-ia a capital do importantíssimo Império Português do Oriente. Ao longo destes 451 anos muitas vicissitudes se passaram, milhares de histórias se viveram e hoje a antiga Goa portuguesa é um atrativo centro turístico que recebe milhares de visitantes, que pretendem apreciar o rico património histórico herdado do passado português e que a União Indiana vem recuperando, assim como em Damão e Diu, reconhecendo o seu extraordinário valor cultural.

    Como Salazar recusasse a via negocial com a União Indiana, relativamente ao futuro dos territórios administrados por Portugal, aquele país acabou por recorrer à força das armas para anexar o secular Estado Português da Índia. Convém recordar que Portugal foi o primeiro país europeu a chegar à Índia, no reinado de D. Manuel I, graças à bem sucedida viagem de Vasco da Gama (1497-1499).

    A disparidade de forças em conflito está bem patente nesta imagem da "Revista da Armada": do lado português apenas o navio Afonso de Albuquerque (lado esquerdo da imagem), do outro 8 barcos de guerra, um dos quais um porta-aviões
    A disparidade de forças em conflito está bem patente nesta imagem da "Revista da Armada": do lado português apenas o navio Afonso de Albuquerque (lado esquerdo da imagem), do outro 8 barcos de guerra, um dos quais um porta-aviões
    Depois disso, Portugal criaria em Goa a capital de um império que se caracterizava sobretudo pelo domínio de pontos estratégicos que garantiam aos portugueses o quase exclusivo das rotas marítimas no Índico e no Pacífico, que permitiam a chegada à Europa, via Portugal, de toda a espécie de mercadorias existentes naquelas longínquas paragens.

    Mas a história secular da presença portuguesa havia de ter um fim. Na manhã de 17 de dezembro de 1961, uma força estimada em cerca de 50 mil homens, apoiados por equipamento militar de ponta, com capacidade ofensiva por terra, ar e mar dirige-se ao território português com vista à sua imediata conquista. Nos nossos territórios, as forças militares eram exíguas: cerca de 3 500 homens e mal armados, com espingardas de fabrico checo (Kropatchek de 1892) que tinham que ser recarregadas após cada tiro, enquanto que do lado indiano já se recorria a armas automáticas e tinham o apoio da aviação militar e de várias embarcações de guerra, entre as quais um porta-aviões.

    Salazar ainda pediu ajuda britânica, no âmbito da velha aliança, só que a Índia era membro da Commonwealth, e a conjuntura internacional era claramente adversa à posição portuguesa, pelo que a ocupação por parte da União Indiana ficou decidida em cera de 36 horas.

    De Lisboa, Salazar dava ordens expressas para que as forças portuguesas lutassem até ao último homem. Contudo, os comandantes militares no terreno sabiam que não tinham qualquer hipótese e acabaram por render-se.

    É conhecida a carta de rendição, assinada pelo Major Tenreiro, cujo conteúdo aponta para a tentativa de evitar o massacre da população e a destruição da própria cidade: «Cidade de Goa, 18/12/61 / O Comandante Militar da Cidade de Goa declara que deseja parlamentar com o Comandante do exército da União Indiana com respeito à rendição. Nestas condições, as tropas portuguesas devem, imediatamente, cessar fogo e as tropas indianas proceder de igual modo com o fim de evitar a chacina da população e a destruição da cidade. O Comandante; (as.) Acácio Tenreiro (Major)».

    Meio ano mais tarde, um navio português foi buscar os prisioneiros a Goa, mas os mesmos seriam mal recebidos em Lisboa, escoltados pela polícia militar, por serem considerados “traidores” ao não terem lutado até à morte. Alguns dos seus comandantes foram mesmo sujeitos a julgamento militar. O Estado Português da Índia continuou a estar representado na Assembleia Nacional até 1974. Após a Revolução do “25 de Abril”, finalmente, as relações diplomáticas com a Índia foram restabelecidas.

    Em Portugal, mesmo algumas personalidades políticas opostas à “situação”, tiveram ações de repúdio relativamente à atitude da União Indiana. Houve registo de várias manifestações contra a atitude de Nehru, adjetivado como «cínico, cobarde, hipócrita e sinistro».

    Por: Manuel Augusto Dias

     

     

    este espaço pode ser seu Este espaço pode ser seu Este espaço pode ser seu
    © 2005 A Voz de Ermesinde - Produzido por ardina.com, um produto da Dom Digital.
    Comentários sobre o site: [email protected].