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    Arquivo: Edição de 15-01-2008

    SECÇÃO: Opinião


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    Novo aeroporto de Lisboa

    O primeiro-ministro acaba de anunciar ao país que no seguimento do estudo produzido pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), que escrutinou as vantagens e desvantagens das propostas enunciadas nos diversos dossiers elaborados para a solução OTA e o estudo apresentado pela Confederação Industrial Portuguesa (CIP) que apontava Alcochete como localização mais recomendada para a construção do novo Aeroporto Internacional de Lisboa, o Governo decidiu-se pela opção Alcochete, essencialmente por reconhecer ser uma solução que garante maior segurança para a navegação aérea, melhores e mais amplas condições de expansão, possibilidades de construção de forma modular, implicando ainda menor esforço financeiro.

    Muitos terão sido os portugueses que se surpreenderam com a opção governamental, receosos que estavam de que a decisão de encarregar o LNEC de elaborar um estudo técnico que ajudasse o Governo a decidir, mais não teria sido que uma “manobra de diversão” política para entreter os portugueses, preparando-os para a confirmação de algo que membros do Executivo repetidamente afirmavam já ter sido assumido. Assim não aconteceu, sendo por isso útil reflectir sobre o que terá contribuído para evitar o que muitos diziam e dizem que seria um disparate demasiado oneroso para os portugueses, se a teimosia de persistir na solução OTA tivesse triunfado.

    Será de inteira justiça começar por saudar a intervenção do Presidente da República quando alertou que o assunto era demasiado importante, devendo, por isso, ser sujeito a debate profundo, envolvendo os diversos especialistas na matéria, posição presidencial que deu lugar à realização de um colóquio ocorrido em 11.06.2007, na Assembleia da República, durante o qual o ministro Mário Lino anunciou que o Governo iria solicitar um parecer ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil sobre o estudo apresentado pelo presidente da Confederação Industrial Portuguesa. Neste quadro de elogios, é justo que englobemos os presidentes da CIP e da Associação Comercial do Porto, os responsáveis do LNEC, os partidos da oposição, todos os técnicos e cidadãos “anónimos” da sociedade civil que formaram um coro que neutralizou qualquer eventual lobby que pudesse existir para impor a solução anteriormente defendida, que agora até o primeiro-ministro reconhece que não seria a melhor para as finanças públicas e para o desenvolvimento de Portugal.

    Registados os parabéns, passemos a apreciar o comportamento dos políticos perante o anúncio governamental. E, sobre esta matéria, há algo de recorrente neles que não subscrevemos, causadores de prejuízos incalculáveis para o desenvolvimento do país: a prática de sistematicamente censurarem as decisões ou omissões do Governo, de que o caso em apreço é paradigmático. Haverá, porventura, alguém, que se a decisão do Governo fosse manter a solução OTA não o acusasse de ter gasto mais uns milhões de euros em estudos sem qualquer outro objectivo que não fosse “adormecer” os portugueses durante o período da presidência europeia, para depois anunciar que, afinal, as conclusões do LNEC não eram suficientemente incontroversas para mudar de opinião e, menos ainda, para deitar para o caixote das inutilidades os muitos e muitos milhões de euros gastos em “aprofundados” estudos realizados durante cerca de vinte anos?

    Decorridos mais de trinta anos de prática política democrática, os superiores interesses nacionais exigem dos agentes políticos que se abstenham de chicanas quando discutem e decidem sobre problemas que inevitavelmente afectarão as populações, as actuais e as vindouras, como é o caso do novo aeroporto, do TGV, do encerramento de estabelecimentos de saúde, da construção ou não construção de instalações públicas (hospitais, tribunais, escolas, pontes, etc.) dos programas educacionais, das políticas para a Justiça e outros. Se e quando assim acontecer, sem dúvida que a imagem dos políticos conhecerá um nível de apreço e de respeito que hoje, de modo algum, os cidadãos nutrem pelos referidos actores.

    Reprovável é que a um momento se acuse os governantes de serem arrogantes e autistas para com as sugestões dos outros e, quando “emendam” a mão sobre uma anterior decisão, ouçam a oposição em uníssono a acusá-los de recuos e de cedências às críticas, “algazarra” onde não é esquecida a reclamação de queda do Governo ou a demissão de um ministro, sendo pertinente perguntar: que resultados para o país tem produzido esta lamentável prática? Que não descolamos da cauda da tabela que elenca os países europeus no tocante a indicadores que medem o crescimento da riqueza dos povos e o bem-estar das populações por, em vez de construirmos em cima do já realizado, sempre que podemos deitamos ao lixo tudo quanto governos anteriores tenham concretizado, para recomeçar do zero quando muda o executivo ou o ministro é substituído. A este respeito, será interessante transcrever o que o actual director do semanário Sol transmitiu aos alunos do curso de mestrado e doutoramento em Ciência Política e Relações Internacionais do Instituto de Estudos Políticos (IEP) da Universidade Católica Portuguesa, na oitava aula sob a epígrafe “A Estabilidade Política”. Depois de recordar que costuma dizer, por ironia, que nos 30 anos que se seguiram ao 25 de Abril nos atrasámos 40 em relação a Espanha que no período conheceu um Chefe de Estado e quatro chefes de Governo, e que Portugal teve cinco chefes de Estado e 22 governos, contou ele aos formandos que «o grande problema nacional, como vimos, é que salta de revolução em revolução sem conseguir encontrar o rumo – e volta sempre ao princípio. O país não aposta no esforço contínuo, na pedra posta em cima de outra pedra, mas na ruptura que deita tudo abaixo».

    A provar que assim continua a ser, temos o actual momento, em que pelas mais variadas formas se pede a “cabeça” do ministro das Obras Públicas. Quando deveríamos apreciar a sua humildade política ao manter-se no cargo depois do Governo decidir solução diametralmente oposta à que lhe terá sido pedida para durante meses defender, o Engº. Mário Lino terá aquiescido manter-se no cargo durante mais algum tempo, suportando todos os ataques dirigidos ao governo, consciente de assim criar espaço ao primeiro-ministro para proceder a remodelação ministerial, que certamente não tardará. Se tal acontecer, como é nossa convicção que ocorrerá dentro de poucas semanas, o ministro ao não renunciar em plena reunião do Conselho de Ministros que aprovou Alcochete, prestou um inestimável serviço a José Sócrates, oferecendo-lhe pretexto para remodelar alguns ministros com o habitual argumento de que há muito lhe haviam solicitado dispensa.

    A opção por Alcochete deve, também, servir de lição para outras obras emblemáticas, como seja o TGV e a construção da nova ponte que atravessará o Tejo. Para que não voltemos a gastar inutilmente rios de dinheiro em estudos e pareceres, será bom que o Governo encarregue o LNEC, ou outra entidade pública, preferencialmente universidade, para estudar o projecto TGV nas vertentes custo/benefício e, muito especialmente, encontrar o melhor plano de financiamento para o novo aeroporto, a fim de não sacrificarmos os actuais contributos da ANA para o OE, a benefício de entidades privadas. Façamos votos que os políticos tenham percebido que os grandes investimentos públicos precisam de estudos sérios e decisões ponderadas, para minimizar os riscos de insucesso e evitar novos elefantes brancos.

    Por: A. Alvaro de Sousa

     

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