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    Arquivo: Edição de 15-01-2008

    SECÇÃO: Crónicas


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    Da terra da araucária à praia dos manezinhos

    Procurar monumentos históricos no Estado do Paraná é como buscar pêlo em ovo. Quando os Bandeirantes ali chegaram, o território era habitado, na sua quase totalidade, pelo povo Tupi, que não possuía realizações culturais de grande impacto. No tempo da colonização, permaneceu rudimentarmente povoado e foi preciso esperar pela segunda metade do século XIX para que esta terra de 199.060 Km2 entrasse na rota do desenvolvimento. Para isso contribuiu a deslocação para sul do cultivo do café, trazendo consigo não apenas um grandíssimo incremento demográfico mas, igualmente, a construção de vias férreas a ligar o porto de Paranaguá e outros menores ao planalto central, acelerando, em definitivo, a ocupação do território paranaense. O troço da linha entre o litoral e Curitiba foi inaugurado em 1888 pelo Imperador D. Pedro II.

    Em 1872, o Paraná tinha 127000 habitantes e, em 1970, quase chegava aos 7 milhões. Desde então, esse número foi várias vezes multiplicado. Além de brasileiros de outras procedências, aqui chegaram e se estabeleceram significativas colónias de emigrantes alemães, polacos, ucranianos e italianos. Vieram também, ainda que em menor número, portugueses, espanhóis, japoneses…

    O Paraná é um dos quatro grandes estados do sul do Brasil entre S. Paulo a norte, Santa Catarina e Rio Grande do Sul na fronteira meridional. Pelo Tratado de Tordesilhas, quase toda a sua área ficava fora do domínio português. Só pelos Tratados de Madrid e Santo Ildefonso e confirmações posteriores é que se definiu, entre Portugal e Castela, a sua posição e pertença. A palavra que hoje identifica este Estado vem do tupi “para-ná” que significava “o que é semelhante ao mar” e foi aplicado por eles ao rio com o mesmo nome que banha o seu território.

    A ausência de provas arqueológicas, que garantam ter ali existido qualquer grande civilização pré-cabralina, é compensada pelas realizações que, entretanto, os seus habitantes nela operaram, além de paisagens naturais espectaculares de que sobressaem as Cataratas do Iguaçu, inscritas desde 1984 como Património Natural da Humanidade, grandes manchas de Mata Atlântica, cachoeiras surpreendentes e extensões de araucárias, elegantes exemplares da família do pinheiro que se tornaram o símbolo do Estado.

    Este local é muito mais do que as cataratas que, por si sós, já seriam “de cortar a respiração”, estendendo-se por 2,7 quilómetros na fronteira entre o Brasil, a Argentina e o Paraguai. É todo o Parque Natural do Iguaçu que dá acesso às cataratas, possibilitando ao turista visualizar todo o espectro paisagístico, de barco ou de helicóptero. Um carro eléctrico conduz o visitante por três quilómetros pela selva e pára no início de um trilho de 600 metros (passeio Macuco Safari) que termina num miradouro donde se contempla este maravilhoso presente da natureza. Também se pode optar pelo sobrevoo das cataratas num helicóptero, a mais emocionante de todas as opções que incluem também a subida de barco pelo rio Iguaçu em direcção às quedas de água até receber a bênção molhada da Cachoeira dos Mosqueteiros. Outras atracções são a Usina Hidroeléctrica de Itaipu, uma das maiores proezas da engenharia mundial e a cidade de Foz do Iguaçu. Esta fervilha de movimento e oferece a quem a visita um parque hoteleiro de grande nível, além de excelentes restaurantes e serviços turísticos bem organizados e eficientes. Para o visitante de primeira vez, tudo isto é um deslumbramento pela excepcionalidade nestas paragens onde nem sempre as coisas são feitas com método e sentido profissional.

    Curitiba foi a etapa seguinte. Chegámos de manhãzinha e, após o pequeno-almoço iniciámos a descoberta desta cidade capital do Estado. Percorremos alguns dos trinta parques e bosques da cidade que se orgulha, muito justamente, do título oficioso de “capital ecológica do Brasil”, bem como alguns dos edifícios que contribuem para revelar a sua face histórica, moderna e progressista. Estivemos no parque Tanguá, um dos mais agradáveis com a sua cascata de 40 metros de altura, caindo sobre um lago artificial incrustado em verdura a perder de vista e ornado de árvores magníficas; no parque Barigui, o maior da cidade, que se estende por 1,4 milhões de metros quadrados e onde há sempre gente bonita a fazer exercício, o Bosque Alemão em homenagem aos imigrantes dessa origem, com uma das melhores vistas da cidade, o Parque Tingui que abriga o Memorial Ucraniano e uma réplica de Igreja Ortodoxa, mais uma homenagem, desta vez aos que vieram daquele país do leste europeu. Visitámos ainda o Museu Óscar Niemeyer, a Torre Panorâmica Brasil Telecom, ponto mais alto de Curitiba, a Ópera de Arame, uma construção em absoluto impactante, que se tornou ex-libris da capital.

    No dia seguinte, fomos conhecer o centro desta cidade de 1.500.000 habitantes que dir-se-ia europeia pelo traçado, tipo de construções e hábitos da população local. Visitámos ainda o Jardim Botânico, em estilo francês, com uma estufa a imitar o Cristal Palace de Londres e uma galeria em forma de U, que abriga o acervo do escultor Frans Krajcberg. Este é, indubitavelmente, um Brasil diferente dos que vimos antes.

    O Paraná oferece ainda outras atracções que não devem ser subestimadas. O passeio de trem entre Curitiba e o porto de Paranaguá, cobrindo cento e dezasseis quilómetros, por uma paisagem encantadora, é uma delas. Descendo a Serra do Mar, os passageiros atravessam treze túneis e 260 pontes ou pontilhões, avistam a cachoeira Véu de Noiva com 86 metros de altura, o Desfiladeiro do Ipiranga e a Serra do Cadeado na companhia de guias bilingues (Português e Espanhol ou Inglês) e passam por Morretes, uma cidade encantadora, célebre pelas suas luxuriantes paisagens e pelo “barreado”, um prato típico dos primeiros caboclos lavradores que ali se estabeleceram. Trata-se de um ensopado de carne desfiada, que é cozida durante doze horas até que se desmanche na boca. É servido com farinha de mandioca e banana. O nome vem da maneira como o prato era preparado: em panela de barro bem vedada para evitar que o vapor escapasse e o cozido secasse depressa.

    Florianópolis, capital do Estado de Santa Catarina, foi a derradeira etapa do nosso périplo em terras brasileiras. Situa-se numa ilha ligada ao continente por uma ponte rodoviária e pedonal. É unanimemente elogiada pela sua beleza natural, embora o tempo não nos tivesse ajudado a usufruir dela como convinha. Durante a semana em que ali permanecemos, o céu apresentou-se de mau humor e houve mesmo dias chuvosos. Comprovámos a impossibilidade de conhecer bem a ilha sem transporte individual, dada a sua extensão: 50 Km de comprimento. Tentámos tirar o máximo proveito do tempo e fomos à procura dos “manezinhos” da praia de Santo António de Lisboa. O epíteto é dado aos imigrantes portugueses procedentes dos Açores, assim como aos seus filhos e netos que ali se mantêm. O lugar é conhecido, além da arquitectura característica, pelo excelente peixe servido nos vários restaurantes e pela extrema simpatia das pessoas que nos atendem. Almoçámos numa casa acolhedora debruçada sobre o mar, rodeados de flores de vários tipos e matizes. Percorremos também o centro da cidade, fizemos compras no comércio tradicional e nos seus dois shoppings: Beira-Mar e Itaguaçu. Fomos à Lagoa da Conceição e à Barra da Lagoa, locais famosos pela agitada vida nocturna, sobretudo no Verão. Deslocámo-nos a Nova Trento, cidade onde Santa Paulina, a primeira brasileira a ser canonizada, viveu e exerceu a sua obra de apostolado e assistência aos cancerosos; Brusque, conhecida pelo comércio de vestuário, ocasião para mais algumas compras, e Balneário Camboriú, o mais famoso local de veraneio do sul do Brasil.

    Não posso falar das magníficas praias catarinenses porque estávamos em pleno Inverno mas a fama que têm chegou até nós. Até breve!

    Por: Nuno Afonso

     

     

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