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Edição de 30-04-2024
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    Arquivo: Edição de 10-12-2005

    SECÇÃO: Tecnologias


    Cimeira sobre a Sociedade da Informação – ronda tunisina (2)

    LIBERDADE DE EXPRESSÃO

    Problema sério tratado no caso da Internet foi a Liberdade de Expressão, onde muitas vezes os países acabam por ser pedra e vidraça.

    Os Estados Unidos, estranhamente, não aceitaram que o racismo ou a xenofobia (ódio a estrangeiros, relacionado com o nazismo) fossem incluídos como temas a serem deplorados no cyber-espaço, alegando para isso parte da Primeira Emenda de sua Constituição, que declara que o principal valor americano é a liberdade de expressão. Por isso não é tão estranho que sites norte-americanos sobre racismo e xenofobia sejam tão prósperos em “net-solo” americano.

    Esse mesmo princípio que os faz extremamente tolerantes à difusão de ideias xenófobas e racistas no seu território fê-los ir contra o Grande Firewall da China (um filtro de conteúdo nacional que não permite que chineses acessem sites como o do New York Times ou sobre o Dalai Lama).

    Mas se, por um lado, a China quer barrar certos tipos de conteúdo, do outro os EUA querem censurar o conteúdo pornográfico na Internet. Para isso estão dispostos a tudo, inclusive a impedir a criação de um novo domínio chamado “.xxx” (lembrando que XXX é uma notória convenção para indicar-se pornografia explícita, principalmente em fitas de vídeo e DVDs) e a exigir que empresas “suspeitas” divulguem incondicionalmente informações sobre “conteúdos polémicos”. Estranhamente, os EUA possuem muitas leis bizarras sobre a questão sexual, inclusive com estados que permitem a zoofilia (sexo com animais) e até mesmo a necrofilia (sexo com pessoas mortas).

    CYBERJUS (OU LEIS PARA A INTERNET)

    Na área de crimes digitais, o consenso existe quando se trata de crimes contra bancos, roubos em contas bancárias a partir do roubo de senhas e demais versões informáticas de crimes “do mundo físico”. Fora isso, tratar do Direito Informático ainda é um problema enorme, e pode ficar ainda maior. Principalmente se a WSIS tivesse sido pressionada a aceitar leis rígidas como a DMCA (Digital Millenium Copyright Act - Lei de Copyright do Milénio Digital).

    A DMCA é uma lei que impede a engenharia reversa (ou seja, a pesquisa do funcionamento e possíveis formas de contornar “entraves de segurança” digitais), considerando-a crime de pirataria de dados. O maior problema desse caso é que a DMCA está a ser usada como uma forma de impedir a disseminação cultural e tecnológica. Os Estados Unidos, para variar, são os principais defensores da ideia de leis que blindem legalmente tecnologias de protecção, também chamadas de leis anti-contorno (anti-circunvention em inglês). Já países como o Brasil, China e Índia defendem modelos de copyright mais maleáveis, como aquelas baseadas em Creative Commons, para uma maior difusão sócio-tecno-cultural.

    Outros dois problemas sérios na Internet também fazem parte dessa discussão. São eles a questão da pirataria e do spam.

    A pirataria é inegavelmente nociva, mas o maior problema da questão da pirataria não é o facto em si, mas o que está por trás dele, que é uma supressão velada da cultura de outros países, cuja cultura será substituída pela cultura americana. Esse facto já acontece, mas as empresas de média e de software têm o desejo de conseguir mercados consumidores para os seus produtos, não importa o que aconteça. Países de diversos tipos vêm defendendo um modelo que permita que supostos piratas (normalmente pessoas que baixam músicas de bandas pouco conhecidas, como os irlandeses do Ceolbeg ou os coreanos do Banya) possam pagar preços justos pela música, ao invés de serem obrigados a pagar US$ 20,00 por um CD do qual aproveitarão uma ou duas músicas. Claro que as empresas de média são contra, uma vez que perderiam parte expressiva da receita.

    Já em se tratando de mensagens de propaganda abusiva (os famosos spams), existem queixas americanas de que os países em desenvolvimento seriam o ponto de partida da maior parte deles. Por sua vez, a maior parte dos países defende que o spam é disparado por empresas norte-americanas que usam de adulteração dos e-mails para indicarem as suas origens em endereços legítimos nas regiões em desenvolvimento.

    A questão da invasão de sistemas, principalmente a do defacement, onde a página de um site é removida e é colocada outra, também tem a sua polémica, principalmente sobre como deverão e quem deverá ser responsabilizado. Há uma tendência de que se responsabilize também o administrador de qualquer sistema que tenha sido usado para essa invasão. Mas há casos em que esta decisão se torna deveras injusta, como ocorre com o tipo de ataque DDoS (Distributed Denail of Service, Negação de Serviço Distribuída). O DDoS pode ser comparado a uma espécie de “trote colectivo” capaz de desactivar um servidor de conteúdo da Internet, e pode utilizar (muitos) computadores inocentes. Se a responsabilização se estender aos donos desses computadores, afectará pessoas que nada têm a ver com o problema e que podem ter tido suas máquinas transformadas em zumbis (termo que quer dizer: transformar-se uma máquina comum numa preparada para participar - sem conhecimento do seu dono – de um ataque de DDoS).

    INCLUSÃO DIGITAL

    O tema Inclusão é o único tema de concórdia entre todos os países na WSIS, já que não existe país que não reconheça a importância da Inclusão Digital e da Internet, e não saiba que para uma evolução no 3° Milénio é necessário combater o Analfabetismo Funcional.

    O ponto de discórdia resume-se a como ela deve ser feita.

    Os países em desenvolvimento, liderados por Brasil, China, África do Sul e Índia, sugeriram um modelo de inclusão baseado na preferência pelo software livre, o que permitiria menores custos e um maior intercâmbio de tecnologia. Esse modelo também possui proponentes na Rússia, Alemanha, Polónia e outros países da União Europeia.

    Porém, os países desenvolvidos, liderados principalmente pelos Estados Unidos, sugerem um “modelo neutro”, sem preferências, o que em geral acaba abrindo espaço para o tradicional lobby do modelo proprietário de software, que termina sendo imposto por algumas empresas de software, principalmente pela Microsoft. Tais países também possuem interesse em manter o eterno atraso tecnológico dos países em desenvolvimento.

    CONCLUSÃO

    Enfim, a WSIS teria tudo para ser um campo de decisões unânimes, se prevalecesse o bom senso e houvesse real preocupação com os países ainda-não-desenvolvidos ou em desenvolvimento. Se houvesse uma real preocupação com uma globalização justa. Mas como não há, de que adianta serem razoáveis?

    As acções, os grupos e suas motivações estavam bem delineadas. O importante é que as motivações fossem compreendidas e debatidas, e que a sociedade não aceitasse nenhum tipo de indefinição que favoreça pequenos grupos de elite. É sempre bom notar que, por mais que os actuais donos da Internet entendam assim, a Internet não é um shopping center virtual. Ela é muito mais que isso, e foi fundada com outro objectivo, o objectivo que grupos como FSF, EFF, Creative Commons e outros defendem... A livre troca de conhecimento, para melhoria não apenas de um ou outro país, e sim da humanidade como um todo.

    O que está em jogo para os donos do mundo não é a melhoria dos pequenos, mas a preparação de um mercado consumidor nesses países, e só. Temos, na Cimeira – o que não se verificou ainda na ronda tunisina –, uma chance de mudar as coisas como são hoje, pelo menos no mundo da Informática.

     

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