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    Arquivo: Edição de 30-09-2005

    SECÇÃO: Cultura


    Mestre Fintas (I)

    Tem treze anos. Meio palmo de altura. Mas é mestre na arte de fintar. Aliás mestre Fintas, tem muitas e variadas artes.

    Não há igual nas dificílimas caçadas aos grilos.

    É único e velho na vício de construir cabanas com tábuas e plásticos, onde apenas dá entrada a certos e predilectos iniciados que disputam, no clube secreto das bouças, um lugar ao sol no interior soturno das luras que constrói.

    Possui, ainda, muitos e variados conhecimentos nas artes marciais do pontapé no traseiro de quem lhe faz frente; dos "chapotes" nas fuças dos atrevidos; dos puxões de cabelos nas trufas dos malandrins que se atrevessem no caminho - apesar de não chegar a cinco reis de gente!

    Tem, além de mais, várias paixões secretas ou confessadas: as "porno-chanchadas" em revistas ou cassetes; os esconderijos de dinheiro arrancado a ferros ao avô ou aos trocos dos recados; as aldrabices bem ou mal inventadas - tanto lhe dá! - para fugir a tudo o que seja obrigação.

    Mas, mestre Fintas, tem uma paixão cega e dominante: o seu Futebol Clube do Porto. São dele as vitórias do clube, são dele as receitas da bilheteira; pertence-lhe - pasme-se! - a conta secreta na Suiça que julga que o seu clube tem, para necessidades que não admite serem inconfessáveis. Enfim, o seu F. C. Porto é-lhe tão querido como qualquer pessoa da família. Claro que nem é preciso dizer que as derrotas são choradas copiosamente. Especialmente se infligidas pelos "mouros", terrífico rival. Também não gosta de se vestir de vermelho.

    Paralelamente à paixão cega pelo seu "Porto" e de igual quilate, tem um único e irremediável ódio: o estudo. E, de enxurrada, os professores, os livros, as salas de aula, (os recreios são amados até à medula); odeia tudo o que lhe cheire a prisão ainda que preventiva. Por isso vêm à tona, constantemente, as mil e uma arte de ludibriar e fintar quem o queira fechado e de livros nas unhas. Desde as dores de barriga até à "inocência" do esqueci-me, vale tudo para fintar novos e velhos, pequenos e grandes, pais e professores.

    Mas a mestre Fintas tudo se lhe consegue perdoar. Verdade, mesmo verdadinha! É que não há sorriso inocente, como o dele, mesmo quando aldraba; não há abraço de ternura, como o dele, mesmo quando é para fugir ao estudo; não há beijo mais doce mesmo quando, logo a seguir, vem a proposta de trocar os livro por uma escapadela.

    Mestre Fintas é mesmo como o seu clube favorito: ame-o ou deixe-o; não se compreende, não se explica.

    Mas, mestre Fintas, por mais que finte, continua e continuará, apesar de tudo, a ser amado por todos os que o conhecem. Exactamente por ser como é - um diabo em figura de gente.

    Por SÍLVIA MARIA GONÇALVES

     

     

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