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    Arquivo: Edição de 15-09-2005

    SECÇÃO: Tecnologias


    O projecto Debian: algo mais do que uma distribuição

    MURDOCK E AS ORIGENS

    Debian foi fundada em Agosto de 1993 por Ian Murdock, então estudante da Universidade de Purdue (Indiana, EUA), que tinha claro desde o princípio que a construiria [à distribuição] segundo as necessidades da comunidade de utilizadores e o modelo distributivo de Linux, desvinculado de interesses comerciais particulares. Uns meses depois, em Janeiro de 1994, o projecto contava com dezenas de entusiastas que publicaram um manifesto fundacional com a sua declaração de intenções (o “Manifesto Linux Debian”). No Manifesto, augurava-se, por um lado, que as distribuições iam adquirir um carácter estratégico na difusão de sistemas GNU/Linux (tal como se verificou) e constatavam-se as carências crescentes das distribuições comerciais: sistemas descuidados e cada vez mais inconsistentes, uma mistura de software livre e não livre, dificuldade de os utilizadores poderem tomar decisões ou intervirem na melhoria, etc.. O certo é que a ideia de Debian de criar um sistema operativo livre, baseado um Unix, que não requeresse nenhuma peça proprietária, surge anos antes, com o projecto GNU da Free Software Foundation (FSF). Debian compartilhou desde a sua origem tanto os fundamentos estratégicos do projecto GNU, como o seu conceito de software livre (não pelo preço, mas sim pela liberdade de cópia, modificação e redistribuição).

    Ian Murdock, de seguida, contou com o apoio da FSF para apoiar a distribuição do novo sistema e, durante um período-chave para a sua consolidação (1994-1995), a FSF esteve a financiar o projecto Debian. É importante ter em conta este facto para entender que Debian não está vinculado a um kernel determinado, e nesse sentido dizemos que é algo mais do que “uma distribuição Linux”. Se bem que, até agora, Debian tenha usado o kernel Linux, há um grupo de desenvolvedores de Debian e da FSF a trabalhar juntos para que, num futuro próximo, se possa optar paralelamente por outro núcleo diferente: o GNU/Hurd.

    DEBIAN/GNU/HURD

    O Hurd é o kernel do projecto GNU, e encontra-se em desenvolvimento activo uma versão do Debian baseada no dito kernel. De momento, não alcançou a estabilidade necessária para se poder publicar uma distribuição oficial, mas já se portou um bom número de pacotes de programas para Hurd e é possível instalá-lo experimentalmente para ajudar ao seu desenvolvimento. Quando for lançado poderá optar-se por usar o kernel Linux ou Hurd, e utilizar-se-á o mesmo sistema de pacotes, o que facilitará a transição para Hurd de novos utilizadores.

    DEPOIS DE MURDOCK

    A Ian Murdock sucedeu como líder do projecto Bruce Perens, em 1996. Nos anos posteriores, Perens foi determinante para estabelecer o Contrato Social de Debian e para alcançar um prestígio público como sistema muito sério e fiável. Além disso, encabeçou a iniciativa para criar a SPI (Software in the Public Interest), uma organização sem propósitos de lucro, que se fundou para dar viabilidade legal a Debian e canalizar os donativos ao projecto. A SPI criou-se também com a ideia de ajudar não só ao Debian mas também a outros projectos similares que se propuseram criar e distribuir software e hardware livre. Algum tempo depois Perens fundaria juntamente com Eric S. Raymond, OSI, que se baseou inteiramente nas Debian Guidelines para estabelecer o seu conceito de open source (em 1999, Bruce Perens abandonou a OSI, reclamando de novo a denominação free software para o movimento do software livre).

    Até 1996 não aparece a versão 1.0 do Debian... na realidade a 1.1, porque nunca houve a versão 1.0, para evitar a confusão provocada por um redistribuidor de CD de Debian que etiquetou erroneamente uma versão prévia congelada, como Debian 1.0--final. Esta falha levou a criar o conceito de “imagem oficial” do CD-Rom de Debian, com a ideia de ajudar os vendedores a evitarem estes erros. A partir desse momento sucedem-se as versões com regularidade, e cada nova versão adopta o nome de uma personagem do filme “Toy Story” (até agora Buzz, Rex, Bo, Hamm, Slink, Potato, Woody e Sarge, a distribuição actual – as duas últimas acrescentadas por “A Voz de Ermesinde” [AVE] ao texto original). Isto foi ideia de Perens que, à altura, trabalhava na Pixar, a companhia que produziu o filme de Walt Disney. Em Janeiro de 1998, Ian Jackson substituiu Perens, pouco antes do lançamento de Debian 2.0; a Jackson suceder-se-ão por sua vez [Wichert, AVE] Akkerman, Ben Collins, Bdale Garbee, Martin Michlmayr e Branden Robinson (os quatro últimos acrescentados por AVE).

    PONTO DE MASSA CRÍTICA

    Segundo muitos analistas, Debian alcançou no ano de 1999 a sua massa crítica, quer dizer o número suficiente de utilizadores e desenvolvedores para garantir a sua continuidade: dez distribuições comerciais baseadas em Debian [à altura, 1999 – AVE] avalizam-no, assim como o facto de que, no calor da “moda Linux”, muitos novos utilizadores instalam Debian nos seus computadores e exige-se-lhe o mesmo que a empresas com recursos milionários, cotadas no Nasdaq com capital de risco. Não obstante, Debian é construído pelos seus próprios utilizadores e é a comunidade de utilizadores que deve resolver os seus problemas e dirigir a sua estratégia: ninguém pode pois garantir nada em Debian, como ninguém pode garantir nada no software livre. Não obstante, Debian tem uma distribuição de qualidade extraordinária, que em nada tem que invejar a distribuições comerciais como RedHat (agora Fedora Core para utilizadores individuais, AVE), Mandrake (agora Mandriva, AVE), SuSE ou Caldera (entretanto desaparecido, AVE). As distribuições comerciais fixam a sua estratégia em captar novos utilizadores e em vender distribuições e serviços em torno dos seus produtos, com o que têm que deslumbrar com novas versões a cada vez menos tempo, novidades permanentes e instalações gráficas muito vistosas. Não há nisto nada de mal, mas Debian não é uma empresa comercial, e por isso não está sujeita ao vaivém que impõe o mercado nem à necessidade de obter lucros: pelo contrário, continua fiel ao seu “contrato social” de apoiar o software livre. Pese ao que costumam difundir os seus detractores, o certo é que o seu processo de instalação melhorou extraordinariamente nos últimos anos. Mas nunca tratou de simplificar a instalação mais do que o necessário, nem assumiu o risco de esconder o processo de instalação do utilizador.

    (...)

    PRIORIDADES

    Debian preferiu centrar os seus esforços em produzir um sistema de instalação e manutenção de pacotes extraordinariamente consistente, e se o utilizador gastar o tempo suficiente para ler a documentação e responder adequadamente às perguntas, disporá de um sistema que não terá de voltar a reinstalar nunca. A ideia é que, enquanto a instalação se realiza uma única vez, com o sistema trabalha-se diariamente. E foi à consistência do sistema e à sua correcta manutenção que deram prioridade os desenvolvedores de Debian, mais do que a um interface gráfico baseado em janelas para a sua instalação. Há que concluir, pois, que Debian é perfeitamente válido. Debian cresce e funciona tão bem porque os utilizadores se ajudam mutuamente, trocam os seus truques e soluções e costumam estar bem informados da marcha da comunidade, dos problemas, desafios, etc.. Trata-se de um exemplo notável de comunidade virtual, e de inteligência colectiva distribuída.

    (...)

    Por MIQUEL VIDAL – Extracto e adaptação de um artigo que esteve livremente disponível em La Espiral (www.laespiral.org), sob licença FDL (Free Document License). Tradução de “A Voz de Ermesinde”. Entretítulos de responsabilidade de “A Voz de Ermesinde”.

     

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