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    Arquivo: Edição de 30-08-2005

    SECÇÃO: Destaque


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    Combater a tragédia dos incêndios

    Ano após ano, e este mais grave que os anteriores, Portugal assiste à tragédia de ver o fogo consumir a sua área florestal, não obstante a abnegação dos destemidos bombeiros voluntários, que dias e noites seguidas enfrentam o inferno das chamas, evitando tragédias maiores. É realmente confrangedor ver imagens televisivas em que centenas de bombeiros, muitos populares, viaturas terrestres e meios aéreos se revelam totalmente impotentes para contrariar o avanço das frentes de fogo que, em milhares e milhares de hectares espalhados por todo o país, consomem a manta verde, deixando atrás de si um confrangedor espectáculo de destruição de arvoredo, muito dele não recuperável nas próximas décadas, durante as quais muitas economias domésticas se depararão com dificuldades financeiras inultrapassáveis, sabido que para muitas famílias rurais, a floresta é o seu único pé-de-meia que a violência das chamas num ápice reduz a cinzas.

    FOTO: Manuel Valdrez
    FOTO: Manuel Valdrez
    Ciclicamente, como os incêndios, os responsáveis pela gestão da coisa pública lamentam no final da época dos fogos o que acontecera, ao mesmo tempo que fazem promessas de ajuda às vítimas da tragédia e anunciam medidas que tomarão para que, no futuro, não assistamos a dramas de igual dimensão. Infelizmente, a realidade tem desmentido, sistematicamente, uma e outra das promessas, havendo, por isso, que procurar soluções alternativas, sem o que dentro de breves anos, Portugal deixará de ser um país com largas manchas de vegetação, para ser apenas um território de serras e vales queimados, donde desaparecera o que restava da agricultura, e a pastorícia será coisa do passado.

    Esta dura realidade, à qual devemos juntar uma outra, que é o parcelamento da propriedade rural de reduzida dimensão, muitas vezes sem condições de acesso e sempre sem tratamento que previna o não aparecimento de incêndios, ou que os minimize, impõe que se encontrem soluções que assegurem um sistema de prevenção minimamente eficaz, salvaguardando, contudo, o título de proprietário do território a quem o possua, ao mesmo tempo que lhe assegure rendimento fixo e permanente, pago por entidade gestora da área florestal intervencionada, sendo que o mais importante é que contribuam de forma decisiva para a manutenção da mancha verde que identifica o país e condiciona as condições atmosféricas nacionais.

    A NECESSIDADE DE MEDIDAS INOVADORAS

    Um objectivo desta transcendente importância e rara envergadura, implicará medidas completamente inovadoras, privilegiando práticas que tenham como alvo:

    I) Iniciar um projecto que privilegie a prevenção ao qual sejam afectos um volume de recursos financeiros correspondentes ao que se tem gasto com o combate aos incêndio e perdido em material queimado, ficando como ganho a preservação da floresta;

    II) Substituir tudo e todos quantos até hoje têm estado investidos em funções e cargos de serviços relacionados com a prevenção de fogos, exceptuando, naturalmente, os bombeiros, medida que visa a procura de uma lufada de novas soluções pensadas por gente descomprometida;

    III) Considerar a praga dos incêndios como o mais sério e preocupante inimigo nacional a abater, entregando o combate da sua eliminação às Forças Armadas, em regime de exclusividade, tornando público e claro que esta é a sua missão principal;

    IV) Organizar a prevenção de forma inteligente e completamente desburocratizada, assegurando que o país passe a dispor, todo o ano, de frotas próprias de reconhecimento aéreo de solos, com equipamento que possibilite identificar qualquer foco de incêndio no seu início e em qualquer parte do país;

    V) Que esta frota seja completada com uma outra que assegure um combate imediato e eficaz logo que detectado qualquer princípio de ignição;

    VI) Que os fundos europeus sejam prioritariamente canalizados para fomentar a radicação de famílias na ocupação e tratamento de áreas rurais;

    VII) Que as florestas sejam patrulhadas diariamente por vigilantes que não tenham qualquer outra missão para além da defesa do território florestal;

    VIII) Que toda esta área seja reunida numa única entidade gestora, a fim de que possa organizá-la segundo processos de segurança e rentabilidade económica;

    IX) Procurar que as áreas florestais sejam objecto de um contrato de cedência de uso por período longo, a fim de que os investimentos a realizar possam ser recuperados, e o respeito pela propriedade privada se conjugue com o direito do país a defender-se do flagelo do fogo.

    NECESSIDADES DE TRANSPARÊNCIA

    Sendo esta componente do programa (a concentração da propriedade para efeitos de gestão) a que julgamos de maior dificuldade, e a certeza que o emparcelamento voluntário é totalmente impossível, o seu sucesso passará pela transparência que o processo transmita e pelas garantias que sejam dadas aos proprietários quanto ao pagamento regular do rendimento negociado e participação em eventuais lucros da gestão dos produtos florestais, bem como, findo o prazo da “cedência”, a garantia da propriedade voltar a ficar livre do ónus, sem prejuízo de novo contrato a que as partes estejam receptivas.

    Proprietários e governo devem, pois, pôr em marcha um programa diferente de tudo quanto se tem feito na defesa da floresta, concebido por uma reduzida estrutura altamente qualificada, onde as FA estejam representadas, capaz de começar a “rasgar” as nossas florestas com aceiros que assegurem o combate por terra e contrariem o avanço das chamas quando tenham deflagrado; que utilize a tecnologia portuguesa existente no fabrico, manutenção e actividade de meios aéreos; que auxilie o governo a produzir legislação que torne possível intervir de imediato em toda a área florestal portuguesa, fixando critérios para quantificar as “rendas” a pagar, deixando aos interessados a incumbência de fazerem prova perante a entidade gestora de que são legítimos proprietários da área intervencionada, assim como das espécies arbóreas existentes e do rendimento que dela obtinham.

    Se nada de parecido com o proposto for implementado, continuaremos a assistir a discursos de imputação e de rejeição de culpas. A promessas de que para o ano haverá mais meios disponíveis e novas políticas. Ao anúncio de mais e mais comissões, tudo para, como no passado, de concreto registarmos mais uns milhares de hectares de floresta queimada, umas largas centenas de portugueses ainda mais pobres e Portugal transformado, de jardim à beira mar plantado, em país onde a terra queimada substituiu o verdejante da nossa flora, matou a riqueza da fauna nacional e depauperou ainda mais a já frágil economia das gentes que teimam em permanecer nos meios rurais. E não se diga que o que se tem feito é o mais adequado e o que as enormes áreas ardidas são uma fatalidade. Basta, para o desmentir, dar um “passeio” pela vizinha Espanha para concluir que é possível fazer melhor com os mesmos recursos financeiros.

    Por: A. Alvaro de Sousa

     

     

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