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Edição de 31-01-2025
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    Arquivo: Edição de 15-12-2023

    SECÇÃO: Crónicas


    foto

    Colo vazio

    Deolinda estava muito constrangida pela perspetiva de passar o primeiro Natal sozinha. Fazia-lhe falta o filho, emigrado. Duas ou três vizinhas, viúvas e reformadas como ela, enganavam a solidão com um cão. «Um animal em casa, não!», decidira.

    Em cima da data, resolveu passar o Natal na terra ― uma aldeia do interior beirão. A casa pareceu-lhe mais silenciosa que habitualmente. Cada móvel, cada divisão, traziam-lhe à memória um episódio conjugal, uma piada do filho. Fez um chá, comeu uma torrada e deitou-se. A cama parecia molhada, de tão fria.

    O dia seguinte, véspera de Natal, amanheceu escuro e frio. Depois de um almoço frugal, Deolinda saiu para um descafeinado. Não encontrou ninguém conhecido, só gente nova. Em tempos, não dava um passo sem encontrar pessoas de família.

    Voltou para casa, sem saber como ocupar o tempo. Se calhar, não tinha sido boa ideia vir nesse ano à terra! Deambulou pelas divisões silenciosas, a olhar as fotografias cinzentas: aqui, jovem, com o marido, no casamento de um primo; ali, sorridente, com “os seus homens”, numa visita a Cáceres; mais além, o pai aprumado numa farda do tempo da tropa.

    Lá fora, começara a cair uma chuvinha miúda. Deolinda ficou um bocado a olhar a rua vazia e a ver as gotículas de chuva a formarem pequenos veios na vidraça. Assim eram os seus dias, a escorrerem, não sabia para onde.

    Ilustração: @RODOLFO.BISPO.77
    Ilustração: @RODOLFO.BISPO.77
    Acendeu a lareira da cozinha, comeu qualquer coisa e sentou-se a olhar as línguas de lume que consumiam mansamente os cavacos com que as ia alimentando. Assim a sua vida se ia consumindo, placidamente, sem dramas, sem objetivo. Aguentou-se por ali a cabecear, a fazer horas para a missa do galo.

    Junto ao adro, o cheiro a madeira queimada, tão familiar, fê-la lembrar-se dos antigos natais. Um bando de rapazes, indiferente à chuva miudinha e gelada, mantinha uma algazarra regada a vinho junto aos madeiros em chamas. Entrou na igreja, logo reconhecida, e sentou-se junto à coxia.

    Lá estavam, parados no tempo, os santos da sua meninice ― Santo António, a Senhora das Dores, São Sebastião, o Coração de Jesus. Durante toda a missa, foi recordando alguns episódios tão longínquos ligados àquele espaço ― o crisma, o casamento da tia Matilde, o batizado do primeiro sobrinho, um dos primeiros afogueamentos, quando reparou que um rapaz mais velho olhava para ela de uma forma especial.

    Quando o celebrante levantou a hóstia, Deolinda sentiu-se muito desamparada. Intimamente, implorou:

    «Sejas Tu quem fores, ajuda-me; ajuda-me, por favor!»

    No fim da missa, Deolinda ficou ainda um pouco, ajoelhada, em recolhimento. Aproveitando a porta aberta pelas pessoas que iam saindo, entrou na igreja um gatinho ainda pequeno, molhado e enregelado, a abrigar-se do tempo hostil. Era malhado de preto e branco, parecia confuso e miava debilmente, entre o receio e o queixume. Foi caminhando pela coxia central, enquanto o seu miado se tornava mais suplicante, sobressaindo por cima da vozearia lá de fora. Deolinda ouviu-o, mas, muito imersa no seu espírito, demorou a surpreender-se. Quando olhou, o gatinho parara a olhar para ela e a miar. Deolinda ficou paralisada a ver aqueles olhos azulados e vítreos, como se lhe custasse a perceber o que via. Depois, pegando no bichinho,

    (...)

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    Por: Joaquim Bispo

     

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