LER É O MELHOR REMÉDIO (7)
“Ensina-me a voar sobre os telhados”
Invulgar livro este, que me chegou às mãos por via de um presente de aniversário. “Ensina-me a voar sobre os telhados” é a última obra publicada por João Tordo e foi o meu primeiro contacto com o autor que venceu o Prémio Literário José Saramago em 2009.
O livro conta a história de quatro gerações da família Tsukuda, a partir do ano de 1917 (taisho 6), e a história do nosso narrador (e personagem principal), um antigo alcoólico que trabalha como coordenador pedagógico do Liceu Camões, em Lisboa. Estas histórias correspondem a uma história extraordinária e a uma história banal, respetivamente, e vão-se cruzar de maneira assaz inesperada.
Em janeiro de 1987, o professor Tavares suicidou-se no próprio liceu. O chocante acontecimento foi como rasgar o véu que tapava os medos, angústias e problemas íntimos dos outros professores da escola, e motivou o nosso narrador a organizar reuniões semanais de partilha, inspirado na sua experiência nos grupos de apoio aos alcoólicos. Foi numa das reuniões de quarta-feira na sala de ciências naturais que apareceu um homem de nome português e apelido japonês que viria a mudar profundamente a vida do nosso narrador e dar a conhecer uma história extraordinária passada no outro lado do mundo. O seu nome era Henrique Tsukuda, “um narcisista com um padrão invasivo de grandiosidade”. Pode-se dizer que o peso existencial que carrega a família Tsukuda é à medida da loucura do seu membro mais novo.
Trata-se de um livro extenso, com quase 500 páginas divididas por 14 capítulos. Todo ele é impregnado pelo conflito entre possível e impossível, sonho e realidade, felicidade e tristeza, angústia e prazer, verdade e mentira, força e fraqueza, passado e futuro. O local da ação vai variando entre Portugal e Japão e vão-nos sendo dadas a conhecer as intrincadas personagens que povoam o romance. Assim, percebemos que o tormento, assombro, desespero, insanidade, violência e ódio são alguns dos sentimentos que o nosso narrador e Henrique Tsukuda conhecem melhor. No entanto, o nosso narrador tem algumas características que não encontramos em Henrique: foi alcoólico e foi ajudado por terceiros; foi pai e teve um filho surdo; foi casado e acabou sozinho. Estas semelhanças, tal como as diferenças, levaram o nosso narrador a desenvolver uma preocupação próxima da obsessão relativamente ao japonês que não é recíproca. Após o incidente na escola na noite da festa de fim de ano letivo, o narrador consegue chegar a contacto com o pai de Henrique (Saburo Tsukuda) e na conversa entre os dois se tenta trazer alguma luz sobre o porquê dos atos do japonês e mais uma vez se desafia a razão, a fronteira do real e do imaginário e se contraria a natural tendência humana de explicar os acontecimentos através da lógica. A lenda, o mito, o segredo dos Tsukudas talvez fosse mais propriamente designado pelo termo maldição, tal foi a raiva, crueldade, frustração e insuportável existência que causou a várias gerações da família. Será dádiva e maldição ao mesmo tempo? Se isto lhe deixou a pulga atrás da orelha então talvez seja uma boa leitura para si.
Tecendo agora algumas considerações pessoais acerca do livro, de referir que gostei da personagem do filho do narrador, João, que muitas vezes lhe tocava nas feridas com a sua desconcertante sinceridade e até descaramento; a sua intuição mordaz para as perguntas mais incómodas. Num jantar com o filho e a nora o nosso narrador fica irritado com esta situação e roga para que não se sentisse constantemente “uma marioneta presa por fios, espartilhada por leis cruéis que [ditam] a [sua] angústia “.
Apreciei também a forma como
(...)
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Por:
Eduardo Tavares
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