Avaliação do doente com síncope
A síncope é uma perda de consciência (PC) por hipoperfusão (diminuição da circulação sanguínea) cerebral global e transitória.
Muitas síncopes são autolimitadas e têm um prognóstico benigno. No entanto, 1/3 dos doentes em três anos tem uma recorrência e cerca de 1/3 têm traumatismos ligeiros. Seis por cento têm traumatismos graves e, nalguns casos, a síncope é um sinal premonitório de morte súbita (risco sobretudo associado às síncopes de causa cardíaca, quer estrutural, quer arrítmica).
A avaliação dos doentes com síncope deve ter três objetivos em mente:
1) Confirmar o diagnóstico de síncope (versus outras PC como por exemplo a epilepsia)
2) Determinar a causa da síncope (síncope cardíaca por alterações estruturais ou do ritmo cardíaco; síncope reflexa ou síncope secundária – a hipotensão ortostática).
3) Estratificar o risco do doente (sobretudo de morte súbita, mas também de traumatismo e recorrência).
Por vezes apenas a confirmação do diagnóstico e a estratificação do risco são conseguidas, uma vez que a causa da síncope pode ficar por determinar em até um 1/3 dos doentes.
A avaliação deve começar com uma história clínica cuidadosa; observação do doente e eletrocardiograma (ECG). Esta atitude permite a determinação da causa da síncope em 23 a 50% dos casos. Nos restantes permite a estratificação do seu risco.
A presença de critérios de risco (por exemplo. história de morte súbita na família, antecedentes de enfarte ou síncope com o esforço) implica uma avaliação intensiva ou mesmo internamento e, no caso de não se obter um diagnóstico, está preconizada a colocação de um detetor de eventos implantável (DEv impl) para monitorização contínua do ECG.
Na ausência de critérios de risco, se a síncope é única ou rara poderá não se justificar a realização de outros exames; se é recorrente duas estratégias são aceites:
1) A realização de exames cardíacos ou para despiste de síncope reflexa de acordo com os resultados da avaliação inicial; ou...
2) Privilegiar a documentação do traçado ECG durante uma síncope espontânea, colocando um Holter de 24 horas se os episódios sincopais são semanais, um DEv externo se mensais ou um DEv impl quando menos frequentes.
Optando pela primeira estratégia, o diagnóstico é muitas vezes inferido (se o doente tem pausas assintomáticas, períodos em que o batimento cardíaco para temporariamente, assume-se que a síncope resulta de uma pausa mais prolongada).
A segunda permite um diagnóstico (ou exclusão) inequívoco de arritmia, uma vez que se espera por um episódio sincopal clínico e verifica-se o ritmo cardíaco nesse exato momento. Esta estratégia implica um maior tempo de espera até ao diagnóstico, mas permite um maior número de diagnósticos. Na verdade, a utilização dos DEv impl tem revelado que nos doentes com 40 ou mais anos de idade, com síncopes recorrentes, sem doença cardíaca estrutural e com um ECG normal a causa pode ser arrítmica em até 50% dos casos.
Por: KATYA REIS SANTOS (*)
(*) Cardiologista e secretária-geral da APAPE – Associação Portuguesa de Arritmologia, Pacing e Electrofisiologia.
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