Subscrever RSS Subscrever RSS
Edição de 31-03-2024
  • Edição Actual
  • Jornal Online

    Arquivo: Edição de 30-06-2013

    SECÇÃO: Destaque


    Fotos URSULA ZANGGER
    Fotos URSULA ZANGGER

    Eliseu Pinto Lopes - Deveria haver referendo local nas questões decisivas para os munícipes

    Advogado, militante do Bloco de Esquerda desde 2005, e radicado politicamente no concelho a partir de 2009, Eliseu Pinto Lopes crê que é chegado o momento do Bloco eleger um vereador. As próximas candidaturas do partido irão refletir uma nova perspetiva, mais virada para a juventude, constituindo como que uma nova etapa na vida do partido no concelho.

    “A Voz de Ermesinde” (AVE) – Está há relativamente pouco tempo no concelho. Como veio para aqui? Como foi o seu primeiro contacto? Que sensação teve nesse primeiro contacto com o concelho de Valongo?

    Eliseu Pinto Lopes (EPL) – O meu primeiro contacto com o concelho de Valongo teve sobretudo a ver com razões profissionais. Eu terminei o meu curso de Direito na Universidade Lusíada do Porto e necessitava de fazer o estágio na Ordem dos Advogados subsequente à licenciatura e o meu patrono tinha escritório precisamente aqui em Valongo, e foi então nesse âmbito que acabei por vir trabalhar para Valongo e, a seguir ao estágio, montar o escritório onde comecei a exercer advocacia, mantendo-me aqui em Valongo.

    AVE – Quando começou a trabalhar aqui em Valongo já era militante do Bloco de Esquerda?

    EPL – Sim, sou militante desde 2005.

    AVE – Como foi a sua aproximação ao Bloco? O que é que lhe interessou nessa força política?

    EPL – Eu acompanhei a política do Bloco desde a fundação. O Bloco apareceu em 1999, eu entusiasmei-me desde início com o projeto, mas fiquei na expetativa de ver o que é que este projeto novo, à esquerda, ia trazer à sociedade portuguesa. E assim que percebi que o projeto, de facto, era aliciante, era um desafio interessante e ia abrir um novo espaço na esquerda portuguesa, decidi aderir, um pouco mais tarde, mas a ideia foi sempre de contribuir para que este projeto fosse avante e crescesse.

    AVE – Foi, portanto, a sua primeira experiência partidária...

    EPL – Sim, nunca estive noutro partido. Tive funções na Ordem dos Advogados, fui presidente do Instituto de Apoio aos Jovens Advogados, entre 2008 e 2010. E basicamente, depois de 2010, estive sempre ligado à política local, na Assembleia Municipal de Valongo, a representar o Bloco de Esquerda.

    AVE – Como é que veio encontrar o Bloco de Esquerda no concelho?

    EPL – O Bloco de Esquerda já tinha enraizamento no concelho, quando eu cheguei, tinha inclusivamente, já, representação na Assembleia Municipal, desde as Autárquicas de 2005. O Bloco de Esquerda tinha já um projeto implantado, mas estava numa transição daqueles que tinham feito o início do Bloco de Esquerda no concelho para aqueles que chegavam agora, mais novos, e vinham numa ótica de renovação do partido em termos locais. Pouco depois de chegar apresentei-me como candidato à Câmara Municipal de Valongo, em 2009.

    AVE – Acha que era absolutamente necessária essa renovação?

    EPL – Sim, os partidos necessitam de renovação,necessariamente, porque outras ideias também são necessárias e a verdade é que o próprio Bloco em si foi uma golfada de ar fresco que entrou em termos da política no concelho. O Bloco quando entrou para a Assembleia Municipal em 2005 – isso é reconhecido até pelos nossos adversários políticos – trouxe uma outra exigência e rigor na maneira de fazer política, institucionalmente na Assembleia, mas também fora desse quadro, na vida económica e social do concelho.

    foto

    AVE – Que balanço é que faz deste seu mandato na Assembleia Municipal de Valongo?

    EPL – O balanço é francamente positivo, porque o Bloco conseguiu trazer propostas diferentes, assumiu-se como um defensor da democracia local, lutou arduamente em algumas matérias, nomeadamente na questão da reorganização administrativa territorial autárquica, onde defendeu com muita firmeza a realização do referendo local, o que contou com a oposição dos partidos da direita, bem como noutras propostas, por exemplo na questão da taxação das caixas multibanco, uma medida que poderia melhorar as finanças da Câmara, no uso dos mecanismos previstos no código do IMI para agravamento fiscal dos prédios devolutos e degradados – um problema reconhecido aqui no concelho –, e em muitas matérias de índole mais social, em que tivemos também uma intervenção forte.

    AVE – Como é que veio encontrar o município e o trabalho da sua direção na Câmara de Valongo?

    EPL – O balanço que temos que fazer é claramente negativo, Valongo teve um crescimento astronómico em termos urbanísticos na década de 90, teve um crescimento populacional também muito assinalável, aliás os últimos censos demonstram precisamente que Valongo, entre 2001 e 2011, passou a ter mais oito mil residentes no concelho, o que levou a que o concelho em si ficasse refém dessa estratégia de construção desenfreada e especulação imobiliária, sem grandes preocupações com a qualidade de vida dos munícipes. Na verdade a gestão autárquica tem sido muito desleixada. O balanço tem que ser negativo, porque se olharmos para aquilo que a coligação de direita deixa no concelho ao fim de vinte anos de gestão, teremos que reconhecer que o concelho está numa situação gravíssima, e a própria Câmara à beira da falência, com um passivo superior a 70 milhões de euros, uma Câmara fechada sobre si própria, onde se despreza a opinião dos munícipes, e onde as pessoas não têm sido preocupação, ao contrário do que querem fazer crer.

    AVE – O Bloco de Esquerda encontra alguma diferença entre a gestão de Fernando Melo e a gestão de João Paulo Baltazar?

    EPL – A diferença é mínima. É evidente que há um esforço da direita em impor uma nova narrativa, de forma a tentar branquear a sua ligação à herança que recebeu de Fernando Melo, que foi presidente enquanto teve folga financeira e todo o dinheiro para investir em eleitoralismo despesista, em projetos que não tiveram depois concretização prática, e de facto nota-se que o candidato do PSD faz um esforço enorme para se demarcar dessa herança, mas a verdade é esta: ele foi um dos contribuintes ativos para a situação económico-financeira que temos hoje na Câmara Municipal. Aliás, o Bloco foi, das forças políticas no concelho, a que se bateu com mais coerência contra os orçamento que a coligação PSD-CDS foi apresentando nos órgãos municipais. Orçamentos irrealistas, com receitas insufladas para dar cobertura a despesas. Aliás isso é reconhecido pelo PSD. Mas não é reconhecido de facto o contributo de João Paulo Baltazar e daquela direita que esteve sempre sentada na Assembleia Municipal, confortavelmente a viabilizar Orçamento atrás de Orçamento, naquele tempo dizendo que os orçamentos eram muito equilibrados. Quer dizer: ao longo de dezoito anos os orçamentos foram “equilibrados”, e depois, nos últimos dois anos,os orçamentos afinal mostram a situação que temos em termos de situação caótica do ponto de vista financeiro. Isto mostra que o Bloco tinha razão quando, coerentemente, votou sempre desfavoravelmente os orçamentos. Também aqui fizemos a nossa diferença relativamente ao Partido Socialista, que viabilizou sempre os orçamentos apresentados pela coligação de direita, viabilizou o Plano de Saneamento Financeiro, viabilizou o PAEL – Programa de Apoio à Economia Local, no fundo foi conivente também com o desaire que, ao longo dos anos, se adivinhava. Aliás, o Partido Socialista, quando sai [da liderança] da Câmara, em 1993, com o antigo presidente, Moreira Dias, deixa um passivo de cerca de 25 milhões de euros. Há portanto aqui uma linha de continuidade do ponto de vista financeiro, no que os munícipes devem refletir - se de facto querem este dois partidos a continuar a governar a Câmara.

    AVE – Para si, então, o PS não é nenhuma alternativa. Mas parece-lhe que a situação aponta para a perda da Câmara por parte do PSD ou acha que não?

    EPL – Ninguém gosta de fazer futurologia, mas é evidente que PSD, ao longo destes 20 anos de poder, está muito desgastado, e mostra sinais claros de esgotamento político naquilo que podem ser soluções para o concelho. Mesmo neste mandato, o PSD deixou muitas das suas promessas, feitas em 2009, por cumprir. Eu penso que já em 2009 teriam existido condições para umas viragem política em termos de Câmara, o Partido Socialista, se não fossem as candidaturas independentes poderia, de facto, ter ganho a Câmara Municipal, mas não foi possível. Penso que nestas eleições esse objetivo poderá estar mais próximo, mas não me deito a afirmar que isso poderá acontecer. Pela nossa parte mostraremos sempre que o Partido Socialista ganhar a Câmara de Valongo não será alternativa, mas sim mera alternância.

    AVE – A conjuntura favorece os resultados eleitorais do Bloco de Esquerda no concelho?

    EPL – Eu penso que sim, sinto que se está a dar uma viragem naquilo que pode ser a identificação das pessoas com o projeto do Bloco de Esquerda. Nós, nestas Autárquicas, iremos assentar o nosso programa essencialmente em três eixos fundamentais – a defesa e aprofundamento da democracia local, a resposta à crise e emergência social, e a juventude. Não podemos ignorar que tivemos aí o pacote autárquico Miguel Relvas, o maior ataque desde o 25 de Abril ao Poder Local, com a questão do corte arbitrário de freguesias, extintas a régua e esquadro, a questão da retirada das competências e da constituição das CIMs – comunidades intermunicipais, em que passam importantes competências para órgãos que não são eleitos e suscetíveis de fiscalização pelas oposições, que serviriam quando muito para dar cargos a presidentes de Câmara que não fossem agora elegíveis, por força da lei de limitação de mandatos, e depois também a própria lei de financiamento autárquico restringe muito as possibilidades de financiamento das Câmaras e vai empurrá-las para apertarem ainda mais o garrote financeiro aos próprios munícipes, por via de se verem obrigadas a arranjar mais receitas fiscais para conseguirem consolidar a sua situação financeira.

    A defesa da democracia local é para nós uma bandeira. Vamos propor que existam os orçamentos participativos, questão de que muito se fala e que sempre propusemos, mas que ao longo destes anos, a coligação de direita nunca quis implantar.

    Defendemos também que deve haver referendo local nas questões que são decisivas para os munícipes – como por exemplo na privatização ou concessão de serviços públicos, como abastecimento de água, saneamento, recolha de resíduos sólidos, soluções de parqueamento automóvel, tudo isso matérias que não podemos sujeitar à lógica de lucro dos privados, porque têm a ver com direitos fundamentais, questões que dizem respeito a uma existência condigna das pessoas, e que devem ser objeto de referendo. Infelizmente a direita assim não entendeu, e foi privatizando todas essas áreas importantes para a população, em que ela não foi ouvida, e em que se veio agora a saber que são parcerias ruinosas para o município.

    AVE – São essas as áreas prioritárias para o Bloco?

    EPL – Sim, são áreas fundamentais para nós, nas quais temos apostado fortemente, temos aliás de ponderar muito bem os termos de uma nova concessão, foi aliás agora constituída uma comissão para avaliação da concessão da água e estamos quase a chegar ao meio da duração da concessão, e a partir do meio dessa concessão é possível o seu resgate, e temos de ponderar – e nisso também queremos ouvir os munícipes – para ponderar o resgate da concessão ou, em alternativa, pelo menos ver as condições em que essa concessão tem funcionado, porque hoje é seguro, pelos dados que vão chegando, que a Câmara, com a renegociação de contrato em 2004, abdicando de uma retribuição anual de 650 mil euros, pelo uso dos meios antes investidos, perdeu qualquer coisa como quatro milhões e duzentos mil euros a favor do privado. Estas situações não podem acontecer. Quem diz a questão da água diz a dos parquímetros, outra situação grave, em que a Câmara ficou com o ónus de pagar os salários dos fiscais, o que representa cem mil euros todos os anos. É muito dinheiro! E é nestes negócios que temos que estar atentos e não transigir naquilo que é defesa do interesse municipal.

    foto
    Também nesta matéria, muito rapidamente, quero dizer-lhe que queremos uma Câmara mais transparente aberta aos cidadãos, queremos que todas as reuniões da Câmara sejam públicas e públicas as suas gravações áudio e, se possível, vídeo, no portal da Câmara, para que todos os munícipes tenham acesso ao conteúdo dessas reuniões, assim como das reuniões da própria Assembleia Municipal, para que as pessoas possam, de facto, nelas participar.

    Iniciativas cidadãs, petições de cidadãos para assuntos relevantes – tem que se regulamentar a petição municipal, enfim tudo o que seja a democracia participativa a funcionar, o Bloco estará desse lado.

    Quanto à questão da juventude, para nós será uma bandeira desta campanha, já o era, mas vamos insistir agora ainda mais nisso, é também uma área em que a direita não cumpriu com as promessas que apresentou em 2009 – a pousada de juventude na serra de Santa Justa não se concretizou, o Conselho Municipal de Juventude não está a funcionar, tanto quanto sei, o Plano Municipal de Juventude nem sequer foi elaborado e apresentado, portanto foram matéria em que a direita prometeu e não cumpriu e que nós queremos desenvolver, que os jovens não sejam apenas residentes no concelho, mas que vivam o concelho, é preciso que este concelho deixe de ser o dormitório do Porto, em que as pessoas trabalham no Porto, e que aqui apenas venham dormir. Quando querem ver um concerto vão ao Porto, quando querem assistir a uma peça de teatro vão ao Porto, para ir ao cinema vão ao Porto... não! O que o Bloco quer é que os mais jovens e mesmo aqueles que se iniciam no mercado de trabalho, que iniciam agora o seu projeto de vida, gostem de estar aqui no concelho e não se sintam obrigados a ir a concelhos vizinhos porque a autarquia não lhes dá a possibilidade de se enraizarem aqui, no concelho onde vivem.

    AVE – Que propostas tem o Bloco, por exemplo, para áreas como as dos Transportes da Saúde, da Economia, da Educação...?

    EPL – Na questão dos transportes, nós defendemos isso desde há muitos anos, e isso está escrito nos nossos programas, a criação de uma rede de transportes municipal. Valongo é daqueles concelhos em que mais se justifica, pelo resultados que temos vindo a assistir, a criação de uns transportes urbanos geridos pela autarquia, porque o temos em Valongo é um concelho completamente retalhado, nós temos vários privados que operam aqui no concelho e que, ao longo do tempo, vão escolhendo as linhas que sejam mais lucrativas, deixando ao abandono os acessos em áreas que, de facto, não lhes interessem do ponto de vista financeiro. E o que temos hoje no concelho, mesmo aqui em Ermesinde, são muitos sítios em que as pessoas se queixam de falta de transporte, em que o autocarro não vai ou pouco vai. E é preciso, de facto, criar uma harmonização. Até a própria ligação entre as freguesias do concelho se ressente com isso, porque os privados não se interessam por essas linhas menos rentáveis, e o Bloco quer, de facto, mudar isso.

    Em termos de Saúde, o Bloco sempre defendeu os serviços públicos de saúde, aliás uma das grandes batalhas deste mandato foi precisamente a questão do encerramento das urgências noturnas do Hospital de Valongo. O Bloco foi precisamente uma das primeiras forças políticas a pegar nessa questão. Estivemos contra, fizemos pressão para que a Câmara tivesse um papel ativo para evitar a concretização do encerramento noturno das urgências, e para já foi possível evitar-se a concretização desse encerramento, mas atenção!, que ele está em cima da mesa, ao contrário do que tem dito o candidato do PSD e atual presidente de Câmara, João Paulo Baltazar. Temos mesmo conhecimento de serviços de apoio às urgências noturnas que estão a ser encerrados. Serviços relacionados com Imagiologia, com exames, de noite já não funcionam. Tudo se perspetiva para que, a seguir às Autárquicas, o encerramento possa acontecer.

    Na questão da Educação –uma área importante – continuamos a defender o apoio às famílias, a distribuição de manuais escolares gratuitos às famílias mais desfavorecidas, perceber as insuficiências da rede escolar e colmatá-las, fornecer o pequeno almoço nas escolas, o que propusemos em Assembleia Municipal e foi aprovado, a aberturas das cantinas – tudo isto entronca na resposta à emergência social, uma área em que temos uma afirmação programática, não apenas numa vertente assistencialista – uma das críticas que fazemos a este Executivo – que faz um esforço de resposta mas apenas nessa perspetiva, por exemplo no fornecimento de refeições. Ora isto não chega. Esta resposta tem que existir – reconhecemos que ela é importante –, mas temos que ir mais fundo. O Bloco defende uma visão integrada, tem que haver um mínimo de direitos garantidos à população, tem que haver um consumo mínimo de água, por exemplo, a que os mais desfavorecidos teriam direito, a Câmara deveria assumir isso. Isto também tem o pressuposto de que deveria ser a Câmara a gerir esses serviços, o que não é... As pessoas têm que ter acesso à água, a habitação... – eu não entendo como é que em Valongo existem quase mil pedidos de famílias para habitação, e tenhamos ao mesmo tempo, paradoxalmente, cerca de sete mil prédios devolutos ou degradados, com a vereadora do pelouro da Ação Social a dizer: «Não podemos fazer nada». De facto, quando a crise mais aperta, mais a Câmara diz que não pode fazer nada.

    Nós defendemos que haja um investimento específico para esta área. O Bloco, neste mandato, vai propor que haja um investimento na ordem dos dez aos quinze milhões de euros só para a questão da criação de uma bolsa municipal de imóveis, para arrendamento a famílias mais vulneráveis e aos jovens, que têm que ter acesso à habitação. Porque neste momento, os bancos estão a cortar a tudo, ainda hoje li uma notícia em que se dizia que os bancos apenas financiam cerca de 66% do valor da casa, com spreads altíssimos e isto vai implicar que, a longo e médio prazo, os jovens e os mais vulneráveis não vão ter acesso a habitação, a não ser por via do arrendamento. E por isso o Bloco quer dinamizar o mercado do arrendamento no concelho. Não se justifica um concelho que até já é conhecido como o cemitério dos prédios abandonados, que não haja uma reconversão desses prédios, que não haja uma bolsa de imóveis para arrendamento a baixo custo, a que as pessoas possam aceder. E nalguns casos, até isentas de renda. Porque isso é fundamental, permitindo às pessoas fixar-se no concelho e tenham acesso à habitação, um direito fundamental.

    O mesmo se passa com o direito à água – hoje já reconhecido pela ONU como direito fundamental da dignidade humana –, que continua a ter os preços exorbitantes que estamos a ter. Desde que a concessão ocorreu aqui em Valongo o preço da água triplicou, e está a chegar a um limite insuportável. Aliás, na última auditoria à Veolia, de 2012, afirma-se preto no branco, duas coisas essenciais, que a Câmara está a ser prejudicada porque abdicou da retribuição dos tais 650 mil euros por ano, e que a Veolia não tem cumprido com a fixação do tarifário social, que é uma recomendação da ERSE, a entidade reguladora. E outra coisa, é que essa auditoria encomendada pela Câmara e realizada por uma entidade privada, diz também que a Câmara não tem cumprido com os deveres de fiscalização da própria concessão. Isto é a Câmara demite-se de fiscalizar e o concessionário faz praticamente tudo o que quer. Isto não pode ser. A questão da não existência do tarifário social então é inadmissível.

    Isto são áreas fundamentais que o Bloco propõe na resposta à crise, porque a pobreza não se combate só nas consequências, isso não resulta, tem que ser combatida nas causas. E as causas são, por exemplo, a indisponibilidade de alimento que as famílias têm hoje. E por isso temos que arrepiar caminho por estas soluções e desafiar os órgãos autárquicos e as próprias pessoas a debatê-los. É isso que queremos propor às pessoas e aos munícipes.

    AVE – Quanto ao PDM, há alguma coisa que o Bloco tenha a dizer?

    EPL – O PDM é, de facto, um dossier muito relevante, mas que está com um imenso atraso, descurado pela autarquia. O PDM (Plano Diretor Municipal) já devia ter sido revisto há muito mais tempo. As questões que nele mais nos preocupam são essencialmente duas: primeiro, não estamos muito de acordo com a estratégia global nele delineada, na verdade a estratégia em termos da caracterização a médio e longo prazo aponta para que o concelho deva ser uma plataforma logística e ponto de ligação entre concelhos do litoral e o interior. O concelho passaria a ser vocacionado para uma plataforma de transporte de mercadorias, ligação entre o aeroporto e os concelhos mais interiores. Para nós isso é limitar muito a projeção futura do concelho, remetido a lugar de passagem, onde não se fixariam indústrias que pudessem fixar pessoas ou trouxessem mais valia ao concelho em termos económicos. Ora a empregabilidade nestas estruturas de ligação ou plataformas logísticas é relativamente diminuta, e o concelho não teria a projeção em termos empresariais que o concelho precisa de ter. Aliás, somos críticos da forma como o Executivo, nos últimos vinte anos, tem orientado a questão de tecido empresarial. Criou áreas empresariais numa série de sítios, nomeadamente a área empresarial ex-libris do concelho seria a Zona Industrial de Campo, e nós vemos bem o que ela é hoje – um projeto absolutamente falhado, em que não se enraizaram empresas, donde não vem o retorno esperado e em que se gastaram muitos milhões de euros – a fazer a Via Distribuidora e outras acessibilidades e isso tudo...

    E depois também não aceitamos a ideia de descaracterizar o concelho a retalho, isto é, poderem criar-se zonas industriais em tudo quanto é lado sempre que certos interesses privados o justifiquem. Refiro-me, por exemplo, à Zona Industrial de Alfena, aquela nova Zona Industrial de Alfena de que tanto se falou, e aonde iria instalar-se aquele empreendimento da Jerónimo Martins,. Não concordamos que as coisas se façam desta maneira. Na altura, quando a Chronopost foi para aquela zona, o processo já foi estranhíssimo – foi a uma reunião de Câmara e foi aprovado, salvo erro com sete abstenções e dois votos a favor. As coisas têm que ser transparentes. Neste investimento da Jerónimo Martins é evidente que o Bloco entende que é preciso investimento, mas não é investimento a qualquer custo, aquilo era uma zona de Rede Ecológica Nacional gigantesca, que vai ser desafetada para construção do empreendimento, sendo certo que depois ali nunca mais teremos controlo da situação, porque depois virão outras empresas que vão querer fixar-se e a zona irá ser completamente desbastada. O Bloco tem resistências a este tipo de empreendimento. E o que nos foi dito numa das reuniões com a equipa do Plano Diretor Municipal é que isso tinha sido uma decisão política em relação à qual os técnicos não iam pronunciar-se. Ou seja, deu-me a sensação de que a própria equipa do PDM não estava muito confortável com a decisão de acolher aquele investimento em Rede Ecológica Nacional. O PDM tem que ser um instrumento que permita o ordenamento do território, mas não a qualquer custo. E outra coisa: o Bloco apresentou uma recomendação na Assembleia Municipal, aliás aprovada, para que o PDM ainda nesta fase de elaboração, fosse discutido publicamente e que a Câmara tomasse a iniciativa de organizar reuniões nas juntas de Freguesia, e em algumas associações, em locais que entendesse convenientes, para elucidar a população sobre o que o PDM prevê para o concelho de Valongo e para permitir, sobre as questões que estão em cima da mesa, a participação das pessoas nesse processo. Para que se possa perceber qual será a estratégia definida para o concelho nos próximos 10 anos. Decorridos estes meses (já lá vão sete ou oito) e nada! A Câmara não promove a discussão pública das matérias e as pessoas não ficam informadas da finalidade do seu território, das estratégias, e passa ao lado disto tudo. Não é o período reduzido de cerca de 30 dias a 45 dias, já na fase final do processo, que vai permitir às pessoas a análise de um documento da complexidade do PDM, e a sua participação e contributos. A discussão tem que se fazer desde muito antes.

    AVE – Quais são as expetativas eleitorais do Bloco?

    EPL – O Bloco de Esquerda, desta vez, vai entrar no Executivo. Estamos convictos de que vamos eleger um vereador e reforçar a representação na Assembleia Municipal. Estamos num ciclo que será mais favorável à esquerda, a coligação de direita está muito desgastada e há uma rutura entre os parceiros de coligação, o CDS já não quer ficar ao lado do PSD na fotografia, vai apresentar candidatura própria, o PSD tem uma herança pesadíssima e acho que com o aparente desaparecimento do movimento independente Coragem de Mudar e com a ausência da outra candidatura independente [do Tino], que não voltará a verificar-se, tanto quanto sei, a esquerda vai ter aqui margem para crescer. E o Bloco de esquerda, com o projeto que apresenta, pode ser uma alternativa para fazer aquilo que já fez na Assembleia Municipal, que é ser uma oposição mais atenta, mais combativa, mais rigorosa. Passar a fazê-lo também no Executivo camarário, mudar a política no concelho.

    Chegou também a altura das pessoas perceberem que as autarquias também têm um papel fundamental, neste momento de crise. A autarquia pode funcionar em contraciclo daquilo que são as políticas nacionais. E as pessoas não se devem esquecer que votar, neste momento, no PSD ou no CDS, é de certa forma, ao nível local, corroborar aquilo que é a política de desastre ao nível nacional, com esta austeridade que está a matar a democracia e a afetar as pessoas de numa forma muito grave e profunda. Quem decidiu a extinção a régua e quadro das freguesias? O estrangulamento do financiamento às autarquias? E quem afirmou com mais coerência um projeto alternativo? O Bloco sempre esteve contra essas políticas e o tempo veio dar-nos razão.

    O programa do Bloco em 2009 ainda está muito atual,, porque, com antecedência, conseguimos prever que este regabofe despesista da direita na Câmara iria trazer uma situação muito grave para as pessoas. Aliás o PAEL é um programa para catorze anos, por enquanto, e que vai afetar as pessoas nos três ou quatro próximos mandatos camarários, por causa das suas restrições.

    foto
    E a verdade é uma, nem todas as Câmara do País estão, nem de longe nem de perto, como está a Câmara de Valongo, apesar de se tentarem fazer generalizações para nos fazerem crer que as Câmaras estão todas mal. Não é verdade. Um terço das Câmaras do País recorreu ao PAEL, as outras não. Tivesse Valongo tido orçamentos participativos como o Bloco defendeu, se calhar hoje não estávamos a defrontar-nos com o desastre financeiro que a Câmara apresenta.

    A verdade é que o Partido Socialista também não esteve à altura, porque ainda há bem pouco tempo o candidato do PS dizia que uma das bandeiras do PS é o orçamento participativo. Então pergunto, porque é que todos os orçamentos têm sido viabilizados pelo Partido Socialista quando nenhum deles continha a vertente de orçamento participativo.

    As pessoas têm que ver quem é que tem exercido a política de forma coerente e quem não o tem feito.

    Mesmo na questão da extinção de freguesias, o candidato do PSD, João Paulo Baltazar, já disse publicamente que defende a fusão e extinção de municípios e isso, na nossa ótica é grave. Porque não só manifesta o apoio ao pacote autárquico Miguel Relvas, como ainda quer ir ainda mais longe, não basta a extinção de freguesias, também quer a dos municípios. Não sei se para Valongo defende a fusão com Paredes e a Maia.

    AVE – O Bloco já definiu os cabeças de lista às Juntas de Freguesia?

    EPL – Alguns sim, outros não. Já temos definido o cabeça de lista à Assembleia de Freguesia de Valongo – José Daniel Faria –, um jovem independente, que mostra bem como as nossas candidaturas são abertas, e é com muito gosto que o temos a encabeçar este desafio. Estamos em fase de conclusão da candidatura aqui para Ermesinde, mas como é um processo ainda não encerrado, não gostaria de adiantar mais nada. Quanto às outras freguesias, Alfena e União das Freguesias de Campo e Sobrado, os processos estão um bocadinho mais atrasados.

    AVE – Não tendo, de momento, mais nada a questionar, há alguma coisa mais que entenda pertinente acrescentar?

    EPL – Eu gostava só de salientar que queremos apostar, especificamente para esta freguesia de Ermesinde,em algumas propostas, algumas delas bem interessantes, e das quais têm sido dado conta

    num evento a que dou particular importância, que é a Assembleia Municipal de Jovens (AMJ). A Casa da Juventude, em Ermesinde, tem que ser uma realidade a muito breve prazo. É recorrente, na AMJ os alunos das escolas aqui de Ermesinde reivindicarem a Casa da Juventude, e o Bloco de Esquerda, sendo a juventude uma bandeira nossa, lutará, se formos eleitos, para que se concretize aqui a primeira Casa da Juventude no concelho, modelo esse que possa ter réplica noutras freguesias. Os jovens devem poder viver aqui na freguesia e estar nela enraizados, e para tal têm que ter espaços para isso, também aqui em Ermesinde tem que se resolver o problema das instalações degradadas do antigo cinema, um prédio muito bonito que devia estar requalificado e continua a degradar-se sem se ver da parte da autarquia nenhuma dinâmica para contrariar isso. Depois há ainda aqui algumas questões importantes. Por exemplo, a questão do Edifício Dr. Faria Sampaio tem que ser resolvida também, sei que há um anúncio de um investimento estrangeiro que irá utilizar aquele edifício, mas primeiro: não passa de um anúncio – fez-se um protocolo, mas nós já vimos, noutras eleições autárquicas, o PSD a fazer grandes anúncios de obras, depois sem concretização. Por exemplo, no antigo quartel dos Bombeiros em Valongo pôs-se um grande painel a anunciar que ali ia ser a casa do município, e até hoje não está lá nada e o prédio está a degradar-se e não se construiu lá nada. Entretanto, o candidato do PSD já veio dizer que não há condições para ser a Casa do Município, mas que pode vir a ser uma Loja do Cidadão. É mais uma das promessas que fica por terra. Temo que o Edifício Faria Sampaio seja uma coisa do género, em que se faz um grande anúncio, depois passam as Autárquicas e cai tudo no esquecimento e lá fica o edifício abandonado.

    O candidato do PSD até tinha apresentado para lá uma proposta que achamos interessante, que era criar ali um ninho de empresas, que apoiasse projetos que pudessem ser a rampa de lançamento de propostas que trouxessem mais valias e novos negócios para o concelho. Essa ideia era interessante. Afinal a Câmara acabou por desistir desse projeto, em favor de um investimento que há de chegar não se sabe bem quando.

    Em Ermesinde também são preocupantes as questões da segurança – uma freguesia muito urbana, com muita população, em que tem de se tratar disso. Não é uma responsabilidade específica da Câmara, mas ela pode também lutar por isso.

    E finalmente, uma última questão, sobre uma suposta venda da Veolia a um grupo estrangeiro, de capitais chineses. Tentámos obter o máximo de informação que pudemos na Comissão de Avaliação da concessão, mas a verdade é que a Câmara não disponibilizou informação dessa hipotética venda. Mas ela parece estar confirmada. A Veolia assegura a distribuição de água em vários municípios, Valongo, Paredes, e penso que ainda em Mafra e Ourém. A empresa pública de capitais chineses que a terá adquirido terá a participação do município de Pequim e, de facto, como sabemos que há uma força política na esquerda que combate tanto a privatização da água, e tem invocado uma coerência em torno dessa bandeira, a confirmar-se esta notícia, isto é espantoso, pois como se sabe o partido que está no Governo na China é o Partido Comunista Chinês, e não deixa de ser curioso que os chineses agora estejam a comprar quase tudo em Portugal, a começar na EDP, na REN, e agora, se calhar, nas águas. É uma curiosidade que haja estes entendimentos diferentes, conforme a geografia!

    Por: LC

     

     

    este espaço pode ser seu Este espaço pode ser seu Este espaço pode ser seu
    © 2005 A Voz de Ermesinde - Produzido por ardina.com, um produto da Dom Digital.
    Comentários sobre o site: [email protected].