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Edição de 30-11-2024
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    Arquivo: Edição de 30-06-2012

    SECÇÃO: Destaque


    ENTREVISTA HENRIQUE RODRIGUES

    CSE: o saldo atual do relacionamento com este Governo (para já) é positivo

    Henrique Queirós Rodrigues, presidente da Direção do Centro Social de Ermesinde (CSE) traça, nesta conversa, os planos futuros e as perspetivas atuais da instituição, os seus constrangimentos, mas também as expectativas que decorrem do relacionamento das instituições particulares de solidariedade social com o atual Governo. E o que daí pode resultar no concreto para a vida presente e futura do CSE.

    Fotos URSULA ZANGGER
    Fotos URSULA ZANGGER
    “A Voz de Ermesinde” (AVE) - O padre Lino Maia concedeu, em março, uma entrevista ao jornal “A Voz de Ermesinde”, na qual abordou muitas das propostas do acordo das IPSS com o Governo. Dessas propostas, tudo se mantém ou há algumas que não avançaram tanto como aquilo que se estava à espera?

    Henrique Queirós Rodrigues (HQR) – Uma coisa é, em termos globais, a posição que tem o padre Lino Maia, como presidente da Confederação que representa todas as instituições – e também o Centro Social de Ermesinde –, em termos nacionais e também na sua relação com o Governo. E o que de facto se procurou sinalizar neste primeiro ano de relações com este novo Governo e do que o padre Lino Maia deu conta é que há algumas inovações. E a primeira inovação é no próprio estilo da relação.

    Tem sucedido que, ao longo de um período dilatado de um mesmo Governo, começam a acentuar-se sinais de alguma inflexibilidade; o Governo vai considerando cada vez mais que ele próprio conhece as soluções para tudo e diminui o espírito e o propósito de parcerias que, normalmente, no estado de graça inicial dos vários governos, marca o exercício dessas funções. Já tinha sucedido o mesmo no final do cavaquismo.

    Sucedeu o mesmo, também, no tempo final do Governo do Eng. Sócrates, uma espécie do adensar da crispação no diálogo com os restantes parceiros sociais. E com as instituições também isso se notava.

    Portanto, o que se tem evidenciado ao longo deste ano é que tem havido uma grande abertura para perceber, discutir e tentar resolver muitos dos constrangimentos que se põem relativamente à ação das instituições.

    De resto, outra questão que me parece interessante notar é o facto de o papel das instituições particulares de solidariedade social (IPSS) no combate à crise, no combate às desigualdades, como parceiro essencial no bem estar social geral da sociedade, voltar a estar no discurso político com este Governo.

    Tinha sucedido o mesmo no tempo do Eng. Guterres, em que o papel das instituições era assumido em termos do discurso político do então primeiro--ministro e dos setores politicamente mais relevantes do seu Governo, como agente essencial do ponto de vista do funcionamento da sociedade, e com reconhecimento e respeito pelo papel e pelas vantagens que um tão numeroso setor representa para a promoção da igualdade de oportunidades entre os cidadãos, para o apoio ao desenvolvimento, para a proteção social, e esse papel de alguma forma foi sendo desvalorizado nos governos posteriores. Ora, neste momento, volta a fazer parte do núcleo do discurso político governamental.

    Isso é interessante, não tanto que fiquemos vaidosos por ver reconhecido o papel das instituições, mas porque também nos parece que é importante para a sociedade que este papel seja potenciado. E de facto isto também tem marcado este tempo inicial, já que faz agora um ano que este Governo vem exercendo funções.

    Em alguns dossiers esta abertura de espírito e essa renovação da vontade de parceria tem tido boas soluções. Concretamente o Protocolo de Cooperação para 2011-2012, que foi celebrado em janeiro de 2012, tem alguns sinais importantes.

    O primeiro sinal é este: num tempo em que as prestações sociais têm sofrido cortes significativos – quer na área do desemprego, quer nas prestações familiares, quer no rendimento social de inserção –, em que tem havido diminuição dos valores absolutos alocados pelo Governo para essas medidas de proteção social, de acordo com as recomendações constantes do memorando de entendimento com as instituições internacionais que têm prestado assistência financeira ao nosso país, ter sido possível em relação ao apoio às IPSS dar um pequeno sinal positivo.

    Isto é, apesar de também fazer parte do memorando de entendimento que o volume das transferências na área da cooperação deveria sofrer um corte, o setor social acabou por beneficiar de um aumento, embora simbólico. E, por outro lado, o protocolo veio consagrar duas lutas antigas das instituições, que tinham sido objeto – pelo menos uma delas – de maus tratos no anterior Governo, que é a questão dos ATL.

    AVE - Em que se concretizaram esses maus tratos aos ATL e como reagiram as instituições às dificuldades então criadas? E o que há de novo, de positivo?

    HQR - A sociedade, há cerca de três ou quatro anos, organizou um abaixo-assinado que foi apresentado à Assembleia da República como uma petição para que o Governo de então revisse o ataque que estava a ser feito pela chamada “escola a tempo inteiro” e pelas “atividades de enriquecimento curricular” às atividades de tempos livres das instituições, e de facto este protocolo veio permitir que, desde que a vontade dos pais fosse nesse sentido, as IPSS voltassem a desenvolver atividades de tempos livres para crianças e jovens do I Ciclo do Ensino Básico nos ATLs, segundo o modelo que estava anteriormente em funcionamento; por exemplo, aqui no Centro Social de Ermesinde, esta é uma das valências mais significativas. Temos um acordo de cooperação para 150 utentes em ATL, e esta foi uma resposta social que sofreu alguma perturbação com essa concorrência das atividades de enriquecimento curricular. A nosso ver injustamente, já que sofreu uma desvalorização, porque era uma atividade fundamentalmente educativa e, de acordo com o figurino do Governo de então, foi estipulado que passássemos apenas a cobrir os períodos das pontas dos dias, ao princípio e ao fim do dia, e de facto este protocolo, celebrado com este Governo, veio reabrir a possibilidade de um funcionamento em termos educativos e pedagógicos do ATL em instituições e não na escola, desde que os pais queiram que assim seja.

    Também houve alterações significativas, quer no que respeita ao alargamento da capacidade das creches, sem prejuízo da qualidade e da segurança, e dos lares de idosos, o que também veio de encontro às preocupações do Centro Social de Ermesinde relativamente a essas respostas sociais, já que o Centro Social é a única IPSS em Ermesinde que assegura na cidade essas duas respostas com forte procura. Na medida em que as novas normas legais estabelecidas por este Governo, em cooperação com as instituições, permitiram alargar a capacidade.

    Na nossa perspetiva há uma potencial melhoria de funcionamento, quer da creche quer do lar de idosos.

    Portanto, até agora, o saldo do que tem sido a cooperação, na minha perspetiva e no que diz respeito concretamente ao Centro Social de Ermesinde, é de que o saldo, até agora, tem sido positivo.

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    AVE - A pesar de tudo, o Plano de Atividades do Centro Social de Ermesinde ainda não é muito otimista relativamente aos ATL...

    HQR - O Plano de Atividades não é muito otimista, de facto, mas porque, por um lado, foi apresentado em novembro de 2011 e o Protocolo de Cooperação entre o Ministério e a Confederação das IPSS é de janeiro de 2012 e justamente esta inovação e a consideração do direito de livre escolha dos pais relativamente ao modelo educativo está contida nesse Protocolo de 2012. Portanto achamos que é um facto novo que permite uma visão mais otimista que aquela que era traçada no nosso Plano de Atividades para 2012. Mas é evidente que após as perturbações, esperamos nós que agora, com o tempo, seja possível retomar a dinâmica que tinha antes o ATL.

    Mas isso será matéria que só mesmo o tempo é que vai resolver, até porque essa concorrência que as “atividades de enriquecimento curricular” faziam relativamente às “atividades de tempos livres” das instituições era uma concorrência desleal, na perspetiva em que, como eram um serviço público, havia preços administrativos fixados pelo Governo ou pelas autarquias, em que o Governo e as autarquias absorviam parte dos custos que deviam ser pagos pelos pais. Naturalmente que em situações de crise as famílias, mesmo que haja um serviço mais qualificado nas instituições, havendo um gratuito, para o mesmo período do dia na escola, tendem a preferir aquele que é gratuito ou que é objeto de preços administrativos.

    AVE - Essa diminuição de constrangimentos que havia sobre os ATLs e o facto de o Centro Social ter entretanto enveredado por uma via de grande rigor administrativo que lhe permitiu ter dois anos seguidos com exercícios positivos, torna líquido que o próximo exercício será também positivo? Ou há algumas dificuldades que podem ameaçar os resultados?

    HQR - A nossa expectativa é de que os resultados sejam positivos, isto é, neste momento não há nenhuma ameaça que faça infletir o que tem sido o rumo da gestão nos últimos dois anos, nomeadamente em termos de financiamento. Há ainda algumas perturbações. Por exemplo, vão ser – creio eu – abertas mais algumas salas de jardim de infância no próximo ano letivo, na cidade de Ermesinde, no âmbito dos centros escolares, que é também outra área em que tem havido concorrência, já que a planificação da construção dos centros escolares não teve em conta a realidade já existente em termos da resposta do pré-escolar, e por aí pode suceder um fenómeno idêntico àquele que sucedeu com os ATL, que é o Estado, através da construção dos novos equipamentos, vir fazer concorrência às respostas que já estão instaladas no terreno, já que não cumpriu as próprias leis feitas pelo Estado quanto à necessidade de planeamento relativamente a novos equipamentos.

    Como se sabe a Rede Social – que é uma espécie de Fórum em que estão representados, em termos autárquicos, os serviços públicos e os serviços sociais – estabelece que nenhum novo equipamento deve ser objeto de construção e de financiamento público sem o seu parecer favorável. Ora, a construção destes centros escolares com respostas como jardins de infância concorrentes a jardins de infância já existentes, ou o lançamento de atividades de enriquecimento curricular (AECs), muitas vezes com adaptações de espaços nas escolas, onde já havia atividades de tempos livres, tudo isso foi feito sem cumprimento dessa regra de um parecer prévio e de uma autorização por parte da Rede Social.

    Quer dizer, o Estado avançou com a construção de equipamentos gastando dinheiro mal gasto, deitando dinheiro fora para construir equipamentos para respostas que já existiam e, portanto, como, a partir do próximo ano letivo, vamos ter, em jardim de infância, um reforço da oferta pública, em Ermesinde, não sabemos ainda se isso vai ter ou não efeitos na procura do nosso jardim de infância, como tiveram as AECs relativamente ao ATL. Mas esperamos que isso não seja suscetível de perturbar o seu funcionamento nos termos em que até agora têm funcionado. E que essa ameaça seja sanável no âmbito do Centro Social de Ermesinde.

    Portanto, mantendo-se os pressupostos externos, como digo, não vejo neste momento nenhuma ameaça sensível. A nossa disposição internamente é manter a mesma contenção e o mesmo rigor relativamente à despesa e achamos, pois, que vamos continuar a ter resultados positivos, o que é essencial para o reequilíbrio financeiro do Centro Social de Ermesinde.

    Continuamos com dívidas a fornecedores, embora tenham diminuído, pois os saldos positivos que temos tido têm sido canalizados para o pagamento do que devemos a fornecedores, e vamos continuar este percurso.

    AVE - Poderá o Centro Social lançar agora mais algum projeto?

    HQR - Não sei, depende de como correr o exercício deste ano. Nós queremos ver se apressamos o pagamento [dos encargos assumidos]. Nós temos ideias para novos investimentos, para o alargamento da capacidade de respostas sociais do Centro Social de Ermesinde e não podemos avançar sem termos solidez financeira, e isso só se consegue com o equilíbrio das contas.

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    AVE - Mas na área da formação e do emprego, há também algumas ameaças...

    HQR - Há algumas ameaças, sim. Mas isso tem que ver com o modelo que este Governo tem, que é diferente do do anterior relativamente às respostas no âmbito da qualificação e do emprego. Como se sabe, este Governo tem manifestado algumas reservas relativamente aos Centros Novas Oportunidades (CNO), e foi apresentada agora uma avaliação feita pelo Instituto Superior Técnico, relativamente ao seu funcionamento ao longo destes anos.

    Eu devo dizer que tenho uma perspetiva muito positiva relativamente aos CNO. O Centro Social de Ermesinde (CSE) candidatou-se e foi uma das primeiras entidades a ter um em funcionamento. Passaram por aqui centenas de pessoas adultas que, por motivos da sua própria vida e por perda de oportunidades no tempo certo, tiveram que abandonar a sua formação escolar e profissional, e o facto de haver um serviço, uma instância, que reconduza para o processo de aprendizagem – quer profissional, quer escolar – pessoas em idade ativa e que estão desempregadas é, na minha perspetiva, do ponto de vista social, um dos maiores ativos deste programa. E depois também porque, no que nos diz respeito – não posso evidentemente falar por todos, porque não conheço o tipo de trabalho que era feito noutros CNO –, mas no que diz respeito ao que funciona no CSE, é injusta qualquer imputação de menor exigência relativamente aos índices de progressão na aprendizagem.

    E, portanto, quer do ponto de vista da sua eficácia e do valor social que tem esta iniciativa, quer do ponto de vista do valor intrínseco e da qualificação efetiva que ele traduziu, parece-me que deve ser realçado – nomeadamente quando é um programa que está tão acossado – o que de positivo teve quando é possível quantificar e medir isso. E nós aqui temos concretamente essa possibilidade, até porque grande parte, ou pelo menos uma parte significativa dos ativos que obtiveram qualificação e certificação no CNO, são trabalhadores do CSE.

    Pudemos, portanto, verificar em sede própria e através de processos de seguimento dos processos de qualificação, que foram de uma grande eficácia, do ponto de vista da autoestima e da gratificação dos trabalhadores. Ligada ao jornal “A Voz de Ermesinde” tenho um bom exemplo – entre os seus colaboradores – de uma pessoa que passou pelo CNO e que faz disso bandeira e que tem sido uma das pessoas que publicamente mais tem realçado o quanto, para a sua própria vida, representou ter passado pelo CNO. Agora, nós percebemos – e é legítimo – que este Governo tenha relativamente a esta área orientações diversas. Mas nenhum Governo pode ser insensível àquele que é o problema principal do País neste momento, que é o desemprego!

    A nossa convicção é, assim, de que continuará a haver investimento forte na formação de ativos, designadamente desempregados de longa duração, e também de jovens à procura do primeiro emprego, com programas de inserção na vida ativa. Pensamos que poderá haver alguma variação quanto aos modelos, mas achamos que este Governo não vai deixar de considerar prioridade absoluta programas que combatam esse que é o principal problema do País – e que será nos próximos anos –, que é a coexistência com taxas de desemprego que são impróprias de um país civilizado.

    E por isso, seja através de uns programas ou de outros, através de programas antigos ou de programas novos, penso que vamos poder continuar a ter formação no CSE, e centrada nesses que são os públicos habituais das IPSS.

    Porque quando o Governo refere que é fundamentalmente preciso trabalhar com pessoas em situação de desfavorecimento, com desempregados, com gente que está, de algum modo, desprotegida perante a sociedade, esses são os públicos tradicionais das IPSS. São os públicos com os quais estamos – mais do que qualquer empresa ou escola – habituados a trabalhar. E é nessa perspetiva que me parece que esta mudança de figurino para que aponta alguma da intervenção deste Governo, na área da Formação e do Emprego, pode até ser vantajosa do ponto de vista das instituições sociais, porque procura privilegiar o que são os públicos próprios destas instituições.

    Também por aí, portanto, não vejo que possa haver uma ameaça de fundo relativamente à área da Formação.

    AVE - Relativamente ao Lar, de acordo com as novas orientações e o entendimento entre a tutela e as IPSS, em princípio será possível que o Lar de S. Lourenço possa ter uma oferta maior, do que aquela que tem podido apresentar?

    HQR - Não é muito provável, porque a nova legislação relativamente aos lares veio, de facto, permitir outra flexibilidade quanto aos índices de ocupação, concretamente passando a instituir a tipologia de quartos de casal e quartos de três utentes, mas fazendo depender isso, evidentemente, de espaços compatíveis com essa capacidade. Será uma possibilidade para novos lares, na medida em que os projetos de arquitetura poderão ser reconfigurados de acordo com as novas regras e com as novas capacidades. Mas relativamente aos lares em que os quartos foram já construídos com uma certa dimensão e em que não caibam, segundo os novos ratios, mais do que dois utentes, não podemos passá-los a três. No caso do Lar de S. Lourenço, concretamente, só há o caso de um quarto em que tínhamos área compatível com o alargamento da capacidade e, portanto, isso traduziu-se, no CSE, no aumento de apenas um lugar de capacidade.

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    AVE - Esta situação, quer da recuperação do CSE em termos financeiros, quer da situação global da sociedade portuguesa, fez bloquear ou pelo menos adiar alguns dos projetos que havia? Por exemplo o projeto de requalificação do largo da feira velha, fazendo com que algumas das casas pudessem ficar ocupadas por pessoas que tivessem apoio do Centro mas pudessem ficar a viver no seu próprio espaço?...

    HQR - Quando dizia, há pouco, que não podemos crescer sem consolidação das contas, isto é um pouco como se passa no País. Eu entendo que as dívidas... é necessário pagá--las... há esse dever!, e portanto naturalmente que a Direção não vai descansar enquanto não tiver resolvida a questão das dívidas aos fornecedores. E isso, como é evidente, não permite canalizar verbas para investimento, isto é, todos os saldos de exercício que viermos a obter serão para a diminuição da dívida. Isso está estabelecido. E, de facto, como o dinheiro não dá para as duas coisas, isso significa que houve alguma paragem relativamente a esse processo.

    Portanto, o que é que temos feito? Mantendo a utilização e alguma rentabilidade nos espaços das casas que já temos disponíveis, concretamente através da sua utilização quer como sede do jornal, quer para salas de formação profissional, os espaços estão a ter uma utilização social relevante, do ponto de vista dos objetivos do CSE, embora uma intervenção de maior fôlego aguarde outras condições de financiamento, até porque a questão não é só que a falta de tranquilidade financeira nos deve recomendar que não avancemos com a alocação de fundos próprios para novos investimentos, mas também porque não há, neste momento, apoios públicos para novos investimentos. Toda a gente sabe como está o País, o discurso político do Governo tem andado também nesse sentido – de que não haverá nos próximos tempos, possibilidades de apoio em investimento para a construção de novos equipamentos –, e nessa perspetiva seria um pouco estar a trabalhar na areia pensar em soluções que não tenham garantia nem de financiamento próprio nem de financiamento público. Até que a situação do País e do CSE fique mais equilibrada isso tem que sofrer algum atraso, claro!

    AVE - Quando falava, há bocadinho, em novos investimentos, referia-se àqueles que já tinham sido apontados num horizonte temporal a mais breve ou longo prazo – que já estão mais ou menos definidos, em projeto –, ou ainda a propostas novas, para além das conhecidas, que ainda estão a esboçar-se?

    HQR - O CSE deve estar atento às novas necessidades que vão sendo evidenciadas e, na minha perspetiva, para além desses que são já projetos antigos do CSE, concretamente o aproveitamento de algumas casas do largo da feira para a construção de residências assistidas – para pessoas ou casais idosos –, dependendo um pouco do figurino que vier a ser definido para a área da Formação, eu pessoalmente acho que temos poucos espaços, do ponto de vista integrado, para a área da Formação.

    Nós conseguimos fazer a recuperação daquele prédio da padaria da Camila para o núcleo da Formação e Emprego, como disse há pouco temos utilizado várias das casas aqui do largo da feira também para atividades afetas à Formação Profissional, mas faz-nos falta um polo com mais alguma dimensão, se porventura o nosso trabalho na área da Formação Profissional se mantiver ou crescer.

    Essa é, portanto, uma área de possível expansão em termos de estruturas físicas.

    Uma outra, porque corresponde também a uma necessidade muito sentida por parte de Ermesinde – como também do País –, é mais uma creche.

    Nós conseguimos, e colaboramos nisso – nós enquanto País –, aquando do Governo do Eng. Guterres, atingir um nível de atendimento e de cobertura do pré-escolar praticamente ímpar na Europa. E hoje temos um nível de cobertura do pré-escolar de cerca de 98% em termos do País. O CSE colaborou nesse projeto de expansão da rede pré--escolar que, na altura, com o Eng. Guterres, o Dr. Marçal Grilo na Educação (depois o o Dr. Oliveira Martins), e o Dr. Ferro Rodrigues na área da Segurança Social, foi definido. E que foi muito importante do ponto de vista do aumento da escolaridade a partir de idades mais precoces, assim permitindo que as crianças cheguem ao fim do seu percurso escolar com mais igualdade, com um aprofundamento da igualdade de oportunidades, com mais competências para todos, independentemente dos seus recursos ou da sua inserção social e familiar, o que é importante num país decente e democrático. O CSE colaborou nesse objetivo em 1998.

    E há um objetivo idêntico relativamente às creches. O objetivo é que o País atinja cerca de 35% de cobertura em creches, e ainda não o atingiu. E sentimos que essa é uma das grandes necessidades, também aqui em Ermesinde, pois a nossa creche tem sucessivas listas de espera a que não conseguimos dar acolhimento. E não obstante haver também uma creche familiar, e as crianças em idade de creche – entre os três meses e os três anos – poderem ser atendidas por amas, nós achamos que o Centro Social de Ermesinde, quando tiver condições para isso, deverá levar a cabo a construção de mais uma creche na cidade.

    Sem prejuízo de avançar também para a resposta a outras necessidades que se vão evidenciando. Por exemplo, nesta altura, de grande empobrecimento do País e havendo muitas famílias que antes tinham condições de vida remediadas mas que, neste momento, com a crise, o desemprego, a diminuição da proteção social, estão em situação de dificuldade mesmo nas suas necessidades básicas, nós apresentámos a nossa candidatura para que, se a Segurança Social assim o entender, também aqui possa funcionar uma cantina social para famílias com necessidade de apoio alimentar.

    AVE - Quanto ao jornal, a questão das despesas está relativamente resolvida. E quanto às receitas?

    HQR - Na minha perspetiva, e os resultados de exercício têm sido disso a tradução – e creio que os resultados do próximo exercício vão continuar nesse sentido –, é evidente a redução da despesa. E não é possível reduzir mais a despesa, no quadro atual de funcionamento.

    Portanto agora o que temos também de conseguir é a estabilidade financeira do jornal, do ponto de vista da receita. E é nesse sentido que temos de avançar, desde logo numa perspetiva mais institucional, pois como se sabe uma das maiores fontes de receita dos jornais regionais locais é a publicidade institucional. Depois de um longo período em que o jornal não tinha nenhuma publicidade institucional, por opção das próprias entidades públicas, essa espécie de veto que na altura tinha sido estabelecido relativamente ao jornal tem sofrido algum esbatimento, e de vez em quando o jornal já recebe alguma publicidade paga por parte de entidades públicas, mas temos evidentemente que continuar a reforçar esse, que é tradicionalmente um dos pontos em que a receita tem mais relevo.

    E depois a resposta tem que estar na população de Ermesinde. Isto é, as receitas têm que estar na venda ou na assinatura do jornal. Porque ele é também, quer do ponto da informação, quer do ponto de vista da memória, quer do ponto de vista da cultura, património da Cidade de Ermesinde. E, na minha perspetiva, a Cidade deve retribuir isso. E não deve fazer impender o ónus da sustentação do jornal para a área da proteção social do Centro Social de Ermesinde. O jornal, na minha perspetiva, deve tender para o equilíbrio, deve ser auto-sustentável, mas depende fundamentalmente da população nesse objetivo.

    Como digo, e acho que isso é importante, a minha visão é a de que as pessoas de Ermesinde têm o dever de assegurar a sustentabilidade do jornal.

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    AVE - Está prevista alguma forma de sensibilizar a população para se obter uma resposta nesse sentido?

    HQR - Só há uma forma da população se encontrar com o jornal, é identificar-se com ele. Não há formas administrativas de resolver isto. Portanto o que temos é de aumentar o interface, a visibilidade, a empatia, as coincidências entre a cidade e o jornal sem, evidentemente, que isso implique cedências do jornal do ponto de vista da sua linha editorial. Mas o que temos é de aumentar os pontos de contacto com a população, aumentar a difusão. Recorrendo também a medidas administrativas, mas não é aí que está o ponto. O ponto está, na minha opinião, em as pessoas conhecerem “A Voz de Ermesinde”, reconhecerem-se em “A Voz de Ermesinde”, reconhecerem a cidade de Ermesinde em “A Voz de Ermesinde” e, nessa perspetiva de identificação, passarem a comprar o jornal e assegurarem por essa via a sua sustentabilidade sem perturbações. Porque também é importante que o jornal não sinta intranquilidade. Porque uma situação de défice crónico traz, sempre, evidentemente, alguma intranquilidade. Para obviar a isso, está também nas mãos da população assegurar essa tranquilidade, que é também elemento essencial da liberdade de expressão e de informação.

    Não há só pressões expressas – sabe quem anda nos jornais –, há muitas vezes também pressões ocultas ou implícitas. Não é a minha perspetiva relativamente ao jornal, porquanto para nós é importante que haja condições externas que assegurem a independência do jornal, enquanto órgão de informação. Aliás, refiro uma nota que é importante, não tem que ver propriamente com o jornal mas tem que ver com a cultura em si, do Centro Social de Ermesinde, e falo nisto à vontade, porque não é do meu tempo de diretor esta versão estatutária, embora como advogado tenha apoiado na altura a Direção a elaborar os estatutos nesta parte: é que é dos poucos estatutos das instituições que considera que os princípios da democracia são estruturantes do modo de intervenção do Centro Social de Ermesinde, com consagração estatutária. E isso não é comum em instituições deste tipo, assumir tão nitidamente esses valores como sendo valores da própria estrutura e organização da instituição.

    Isso também deve ser preservado relativamente ao jornal, mas, como digo, para isso é essencial, ou importante pelo menos, que o jornal sinta que não tem ameaças por esse lado.

    Esta é a mensagem que gostava de deixar ficar: a cidade de Ermesinde e as pessoas de Ermesinde têm o dever de manter o jornal, comprando-o.

    AVE - Quanto aos projetos da Associação Ermesinde Cidade Aberta, qual é o ponto da situação e perspetivas?

    HQR - A questão da Associação Ermesinde Cidade Aberta é diferente da do Centro Social de Ermesinde. Tem uma situação financeira tranquila, não tem dívidas. Embora esteja a assumir o pagamento do cinema, conforme foi contratado com o Centro Social de Ermesinde. Nesta altura, cerca de metade do custo do cinema está pago. Mas estamos com o mesmo constrangimento relativamente ao processo de reconstrução do cinema que temos quanto a outros programas de expansão do Centro Social de Ermesinde. Neste momento não há investimento público para equipamentos sociais e nessa perspetiva, enquanto não tivermos consolidadas as contas públicas nacionais, com capacidade para retomarmos o processo de investimento em equipamentos, não vale a pena sequer estarmos a pensar – e a nossa ideia nunca o foi – fazer a reabilitação do cinema com fundos exclusivamente próprios, era com recurso a investimento e financiamento público.

    Enquanto não reabrir essa linha não vale a pena pensar nesse assunto e portanto temos também aqui que arrumar a casa primeiro, e arrumar a casa primeiro significa pagar o resto que falta, que é cerca de metade do preço – cerca de 150 mil euros que ainda estão por pagar (embora 150 mil euros já estejam pagos).

    O que conduz a um outro constrangimento que é o facto de ter sido dado em hipoteca o edifício do cinema como garantia da dívida ao banco, e também enquanto essa hipoteca subsistir, não ser possível apresentar um projeto de financiamento público para a recuperação do cinema. Nós pensávamos, na altura, quando comprámos, que teríamos um apoio financeiro da Segurança Social, e se fosse assim e tivéssemos recebido esse subsídio o cinema, neste momento, já estava pago, e podíamos pensar em recuperá--lo, mas o Governo anterior, ao pedido que foi feito nesse sentido, recusou, na medida em que houve um parecer desfavorável aqui do Centro Distrital de Segurança Social do Porto. Tinha sido, de resto, estudada essa hipótese, mesmo quando o ministro, o Dr. Vieira da Silva, se deslocou a Ermesinde, num sentido favorável, mas, de facto, depois houve então essa intervenção do diretor do Centro Distrital de Segurança Social do Porto em sentido desfavorável e o Governo não pôde...

    AVE – Foi uma surpresa esse Parecer?

    Foi, evidentemente, uma surpresa, uma má surpresa! Se não fosse isso, tínhamos neste momento o cinema pago. Tendo sido o cinema até agora pago – já metade do custo – exclusivamente por receitas próprias, grande parte delas resultado de donativos de benfeitores do Centro Social de Ermesinde e da Associação Ermesinde Cidade Aberta, vamos ter de continuar neste ritmo até que a questão do preço esteja resolvida ou que este Governo – é uma das hipóteses que vamos pôr, já falei com o senhor secretário de Estado da Segurança Social relativamente a esta matéria – nos possa deixar retomar o projeto de acordo com a ideia inicial.

    Por: LC

     

     

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