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    Arquivo: Edição de 23-04-2012

    SECÇÃO: Crónicas


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    O homem das sapatilhas e o abelhão

    Há tempos atrás a Géni entrava no nosso gabinete de trabalho com os seus bons dias e logo a seguir dizia-me para abrir o mail e ver uma coisa que sabe que eu ia achar interessante – uma pessoa que tinha intervindo no programa “Linha da Frente” e que se identificava muito com a minha atitude, aquela que adotei para ultrapassar os obstáculos da vida que estou a reconstruir.

    Quando visionei a gravação do programa deparei-me com um homem, que por acaso era do Norte, e falava com convicção da sua filosofia de vida e a forma como encara os desafios e desamarra constrangimentos, conceitos e barreiras. Chamava-se Miguel Gonçalves e esta exposição pública foi também o grande acontecimento que o catapultou para as luzes da ribalta, fazendo-o sair do anonimato conforme constatei posteriormente.

    Ao ouvi-lo lembrei-me de uma coisa que me foi recomendado ler e que tento nunca esquecer:

    Pedras no caminho

    Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes,

    Mas não esqueço de que a minha vida é a maior empresa do mundo.

    E que posso evitar que ela vá à falência.

    Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver

    Apresar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise.

    Ser feliz é deixar de ser vitima dos problemas e

    Se tornar um autor da própria história.

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    É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar

    Um oásis no recôndito da sua alma.

    É agradecer a Deus cada manhã pelo milagre da vida.

    Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.

    É saber falar de si mesmo.

    É ter coragem de ouvir um “não”.

    É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.

    Pedras no caminho?

    Guardo todas, um dia vão construir um castelo…

    (Fernando Pessoa)

    Esta personagem de um mundo que é real havia de se juntar a muitas outras que já conheci e muitas outras com quem a vida me haveria de cruzar e que não passando pelos ecrãs da televisão são também personagens do teatro da vida, numa arte exímia de representar os papéis que se vão adaptando a uma sociedade que muda velozmente e que nos obriga a mudar de “indumentária” a um ritmo assustador em que a verdade de hoje não é garantidamente a verdade de amanhã e nada podemos dar como garantido numa metamorfose que nem nos dá tempo de olhar para o “colorido” da vida.

    E, num mundo que é redondo, fui convidada para um evento em que se falava de criatividade, inovação, excelência e qualidade. Íamos ter um convidado surpresa e que para mim, foi mesmo uma surpresa: Miguel Gonçalves, o homem de quem se fala, que num discurso forte e dinâmico voltava a relembrar aquilo que tinha dito meses atrás na televisão e explicava que usava sempre sapatilhas, o calçado que lhe permitia andar de forma veloz e as mangas arregaçadas, uma das suas “imagens de marca” – a atitude de desafio, audácia e mudança.

    Referiu alguns dos inúmeros comentários que faziam aos seus vídeos e em que lhe chamavam vendilhão de sonhos, pregador e “louco”, penalizando-o pela sua audácia, por gostar de sonhar acordado e construir como o tem feito. Referia que pensava e sentia no sentido inverso, lamentando todas essas pessoas que já cruzaram os braços e deixaram morrer os seus sonhos e as suas ilusões.

    Ao ouvi-lo atentamente voltei a fazer um backup rápido a tanta gente que eu conheço e que mesmo sem se darem conta têm um bocadinho dele: gente que trabalha dois turnos para assegurar a subsistência dos seus, gente que se reorganiza e se reinventa, gente que voa através dos ideais que constrói e muita outra que anda na procura de soluções para sustentar os seus negócios e assegurar os postos de trabalho de quem depende deles. Gente que continua a acreditar e não perde a coragem entregando-se a causas nobres e altruístas e que envolvem jovens, idosos e carenciados.

    Aqui precisei também de me fixar num grupo de colaboradores de um jornal regional “A Voz de Ermesinde”, que acorreram a um apelo da sua Direção – ajuda para tentar sobreviver e continuar a cumprir a sua missão: informar com transparência, independência e pluralismo. Numa task force coletiva sentamo-nos à mesma mesa e delineamos a estratégia em que cada um de nós está a contribuir com a ajuda que se ajuste ao nosso perfil e aqui também nós acreditamos que vamos conseguir dar continuidade a um sonho que dura há mais de 50 anos em cerca de 900 números já editados.

    Nesta teimosia pela sobrevivência quem se safou no meio disto tudo foi um abelhão que um dia destes na paragem em que esperava pelo autocarro caiu ao meu lado e assustou-me, mas também me fez ficar curiosa, porque tinha caído de costas e ficou ali de patas para o ar a tentar dar a volta à situação delicada em que se encontrava.

    O meu primeiro instinto foi pisá-lo com o pé e aniquilá-lo, mas depois ponderei que ele não me tinha feito mal nenhum e também quis ver como se safava ele daquele imbróglio; e o certo é que não desistiu e após tentar insistentemente, durante alguns minutos, ele conseguiu voltar-se e retomar a sua rota de voo, aproveitando a oportunidade de estar vivo.

    Hoje, ao refletir sobre o discurso que ouvi ao Miguel Gonçalves percebi que ele não nos dá respostas, somente nos indica o caminho que escolheu ele próprio seguir usando no seu discurso um termo que é muito seu: “bater punho” que será a mesma coisa que bater às portas da vida na procura de oportunidades, soluções ou mesmo ajuda.

    Ouvindo-o, continuo a associá-lo às “pedras do caminho”, aquelas que precisamos de usar para que cada um construa o seu próprio castelo e aqui o único reparo que registo ao lembrar-me do termo “punho” é desejar que estes não estejam cerrados, mesmo para partir essa mesma pedra, porque com os punhos cerrados não se conseguem cumprimentar as pessoas e essa prática nunca deve ser esquecida - por uma questão de boa educação e também de bom senso, pois há um quê de verdade na máxima que um dia li: “Cumprimenta as pessoas quando sobes porque podes encontrá-las quando desces”.

    Por: Glória Leitão

     

     

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