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    Arquivo: Edição de 30-07-2011

    SECÇÃO: Crónicas


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    A invasão muçulmana de 711

    Homens morenos, vestidos de branco, de albornozes ao vento, que mais pareciam fantasmas, montados em velozes ginetes ricamente ajaezados, brandindo alfanjes curvos e reluzentes, invadiram a Península Ibérica, destroçando o reino visigótico do rei Roderico (Rodrigo), nas margens do rio Guadalete. Corria o ano 711 da Era de Cristo e o ano 91 da Hégira.

    Parecia imparável a carga da cavalaria sarracena que, em pouco tempo, dominava toda a Hispânia gótica exceto um pequeno reduto nas Astúrias, nos Picos da Europa, então inacessíveis, onde se refugiou o que restava do destroçado exército cristão.

    E assim foi. Este ano, faz precisamente mil e trezentos anos que as tropas muçulmanas, sob o comando de Tarik ben Ziyad, invadiram a Península Ibérica, dentro dum plano de expansão islâmica (jihad) iniciado por Maomé, na Hégira e que ainda não terminou.

    No ano de 710 sobe ao trono visigótico, por eleição da Aula Régia, Roderico, filho do assassinado duque Teodofredo de Híspalis (Sevilha). Os apoiantes dos filhos do rei anterior, Vitiza, protestam e um deles, o bispo Oppas de Sevilha, tio dos pretendentes e o conde Julião de Ceuta, solicitam ajuda ao Vali árabe de Marrocos e governador da Ifriqiya (Tunísia), Musa ou Muça ibn Nuzaiyr que ali tinha chegado, há pouco mais duma década. Este, com autorização do califa omíada de Damasco, Soleiman al-Walid, envia um contingente de tropas, cerca de 12 000, na maioria berberes, comandado pelo seu lugar-tenente, Tarik ben Ziyad que invade a Bética (Andaluzia) precisamente em abril de 711. O rei Rodrigo, encontrava-se no Norte, a combater os vasconços de Pompeia (Pamplona). Regressa, junta as tropas disponíveis, cerca de 20 000 combatentes mas, traído pela fação dos filhos de Vitiza, que passam para o campo muçulmano, é vencido na batalha travada nas margens do rio Guadalete ou Barbate, em 19 de julho de 711, e nunca mais foi visto.

    As tropas de Tarique entram na Hispânia
    As tropas de Tarique entram na Hispânia
    Os sarracenos, aproveitando o êxito da operação militar levada a efeito, nunca mais retiraram para o Norte de África donde vieram, como esperavam os traidores do rei Rodrigo. Antes, pelo contrário, embrenham-se pelo interior da Hispânia na direção do norte, ocupando a cidade de Toledo, capital do reino, quase sem luta. No ano seguinte, em 712, chegam mais tropas, comandadas pelo próprio Musa e o seu filho Abd Al Azizz ibn Muça, que invadem a Península, unindo-se a Tarik e destruindo e conquistando tudo o que era o reino visigótico de Toledo. E o “Regnum Visigoturum Toletanum destructum est”.

    Muitos visigodos refugiaram-se nas montanhas inacessíveis das Astúrias (Picos da Europa) e, sob o comando de Pelágio ou Pelayo, filho do assassinado Fávila, iniciaram a resistência à invasão árabe e depois a formação do reino de Oviedo ou Astúrias, em 722, que viria a ser o futuro reino de Leão nos princípios do séc. X.

    Entre 714 e 716, Abd al Azizz conquista a maior parte do Ocidente peninsular, correspondente à Lusitânia e ao futuro território português e entra na cidade de Portugale (Porto), que é tomada, e continua para norte ao encontro das tropas do pai, Musa, que vem do norte da Galiza, conquistando Lucus, Brigantium (Corunha), Iria Flavia, Tude, Aurense e grande parte das cidades galegas, desde a sua chegada à Galiza, em 714. A cidade metropolitana de Brácara foi destruída por ter oferecido grande resistência e o bispo foge para o Norte, para Lucus e Britónia (Mondonedo).

    O confronto com os resistentes godos das Astúrias, comandados por Pelayo, será em 718, no desfiladeiro de Covadonga, perto de Cangas de Onis, onde, com a ajuda de astures, cantabros e galegos, os rebeldes do norte vencem o contingente sarraceno comandado por Al-Kama e o bispo godo Oppas de Hispalis (Sevilha), dando início à reconquista cristã da Península, que iria durar quase oito séculos, até à expulsão do último rei de Granada, em1492, pelos Reis Católicos (até 1249 no território português). (Crónicas Asturianas. Crónica Rotense de Afonso III das Astúrias, séc. IX).

    Ousados, fanáticos e insaciáveis, não satisfeitos com a conquista da Península, os sarracenos, comandados por As-Samah Ibn Malik al-khaulani, atravessam os Pirenéus, entram no reino dos Francos, ocupando Narbonne, Béziers, Nimes, Carcassonne, Toulouse. Mais tarde, em 732, o emir do Al Andalus, Abd’al Rahman ibn Abdullah al-Ghafeki, crente nos desígnios de Allah, atreve-se a seguir para norte. Vence o duque Eudon da Aquitânia, que pede auxílio aos francos, toma Bordéus, passa o Garonna, chega a Dordogne, Charente e vai pôr cerco a Tours. O mordomo dos Francos, Carlos Martel, duque da Austrásia e avô do futuro imperador Carlos Magno, considera que já é atrevimento demais. À frente dum grande exército, marcha para Tours e os mouros, não se atrevendo a enfrentá-lo, retiram para sul, sendo intercetados perto de Poitiers, onde são desbaratados durante dois dias e o emir Al-Ghafeki é morto. Assim termina, como diz o historiador espanhol Garcia de Cortázar, o sonho árabe duma Europa cheia de mesquitas e minaretes, que está novamente a recomeçar pela imigração.

    Pela influência que os muçulmanos tiveram na cultura ibérica e na ação que levou à formação do nosso país, há que assinalar esta efeméride com o relevo que merece.

    Fontes: Al Razi, “Invasão árabe”; Ibn Abd’ál Munim (geógrafo), in “Kitab-al-Rawd al Mitar”, Al Magari, in “Nafh al-Tib” (Expansão muçulmana na Espanha); Ajbar Machmua, “Cordiba” séc. X. Sobre Queda da Espanha gótica e invasão muçulmana: “Crónica de Afonso III das Astúrias”, “Crónica Rotense”, séc. IX; “História de Portugal”, Alexandre Herculano; “História de Portugal”, José Mattoso; “Historia de España”, de García de Cortázar.

    Por: Reinaldo Beça

     

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