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Edição de 30-04-2024
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    Arquivo: Edição de 15-09-2010

    SECÇÃO: Crónicas


    Férias de um burro de carga

    Dizem que em determinada aldeia do nosso país havia um agricultor muito avarento, como se verá pela história que segue. Esse senhor tinha um burro, que é animal trabalhador sem grandes exigências laborais ou de manutenção alimentar. Adequado, portanto, à condição económico-agarrada de seu dono. No entanto, em situação de crise, vale tudo e o velho agricultor resolveu pôr o burro a dieta, que agora estamos no Verão e até é bom perder uns quilitos para perder alguma celulite acumulada. Vai daí, foi diminuindo a ração da palha ao pobre do asno: menos um fardo por semana, menos dois na outra e por aí adiante até que o burro magrinho já quase que não se tinha nas patas. Por fim, depois de duas semanas sem alimento, o animal apareceu morto no local de trabalho. Conclusão do dono: «- Que pena! Agora que ele já tinha aprendido a trabalhar sem comer…».

    A ideia não é falar de anorexias nervosas ou dos direitos dos animais, mas dessa outra doença do século que - embora apenas afecte alguns… - consiste em não ter aprendido a largar o trabalho e descansar.

    Uma das grandes conquistas da civilização judaico-cristã é o dia de descanso semanal: no nosso caso, o domingo. Algo insólito para os chineses, por exemplo, que verificamos não saberem o que significa uma semana de 40 horas ou 22 dias de férias - outras conquistas dos trabalhadores que consideramos um avanço civilizacional de grande monta. Não são os únicos, pois, frequentemente, os empresários, as mães e outros trabalhadores por conta própria também desconhecem essas limitações ao horário de trabalho e terminam irremediavelmente exaustos.

    É aí que entra a lição do nosso amigo asinino: é preciso cuidar do corpo que é um instrumento de trabalho como outro qualquer e também precisa de “papas e descanso”. Garantir uma alimentação equilibrada, cuidar da saúde, fazer desporto e aprender a repousar são deveres de qualquer trabalhador que se preze. Descansar não é sinónimo de não fazer nada – o que aliás se tornaria extremamente aborrecido e até mesmo cansativo. Mudar de actividade também relaxa e dedicar algum tempo à família, ao desporto, a um passatempo, à leitura, ir a uma festa ou ao cinema, dormir mais um pouco, passear…mais do que luxos, acabam por ser deveres. O mesmo se poderia dizer desse costume - que convém não perder - de fazer as refeições em família, sentados à mesa. Hora de parar, de estar juntos, de conversar, de comer devagar e com correcção. Que oportunidades de repor as forças e de educar se perdem por não querer ter esse trabalho…

    E depois, porque não desligar a TV mais cedo e ir para a cama? Quantas vezes nos podem dizer, mais ou menos explicitamente, perante o nosso mau-humor ou impertinência: «-Deixa, que o teu mal é sono!». Talvez tenhamos estado a cortar na nossa ração de horas de dormir….ou então na ração dos outros…

    A propósito - e só para aqueles que têm a humildade de tentar encontrar esses tempos de reposição de forças -, conta-se de João Paulo II que, um dia, ao fim da tarde, e ao vê-lo vir curvado e a arrastar os pés, alguém lhe disse compassivamente: «- Vossa Santidade está demasiado cansada! Tem de descansar!». Ao que o Papa respondeu: «- Se a esta hora não estivesse cansado, é porque não teria cumprido o meu dever».

    Por: Maria Amélia Freitas (*)

    (*) Professora

     

     

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