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    Arquivo: Edição de 30-09-2008

    SECÇÃO: Tecnologias


    Entrevista de Linus Torvalds ao Simple-Talk (3)

    Linus Torvalds, criador do Linux, concedeu uma entrevista ao Simple-Talk (http://www.simple-talk.com/opinion/geek-of-the-week/linus-torvalds,-geek-of-the-week/), onde fala sobre o kernel (e um pouco sobre o seu desenvolvimento), licenciamento, o motivo de sua preferência pela GPL, patentes, distribuições e muito mais.

    Leonardo Saibot (Terramel, BR-Linux.org) resolveu traduzir a entrevista. Como ela é muito extensa, dividimo-la aqui em três partes, publicando-se hoje a última. Não houve a preocupação em fazer uma tradução literal. O que se tentou fazer foi «uma tradução que realmente mostrasse o que foi dito e não uma que traduzisse fielmente cada palavrinha». Posteriormente foi feita uma adaptação para o Português local pel'”A Voz de Ermesinde”.

    Nesta terceira parte, Torvalds fala da diversidade das distribuições, da relação de forças com o Windows, e dos benefícios da competição.

    Richard Morris: A GPL é um assunto religioso para si ou foi escolhida por algum motivo doido?

    Linus Torvalds: Nenhum dos dois, sinceramente. Não é religioso – veja a minha explicação sobre como eu tento evitar todo o assunto de “liberdade” pelo factor de ser uma argumentação sem sentido – mas também não foi por nenhum motivo doido. A GPLv2, mesmo que já faça quase duas décadas que a escolhi, continua a ser a minha licença preferida.

    Claro, eu também não posso dizer que foi tudo bem premeditado ou que passou por muito planeamento. A GPLv2 não foi a minha primeira licença – eu comecei o Linux com uma licença mais restrita que dizia que se deveria redistribuir o código fonte e não se podia vender de forma alguma.

    Então o facto de ter acabado por usar a GPLv2 foi devido a várias circunstâncias aleatórias e “porque estava lá”, mas não foi nenhuma doideira em que eu não sabia onde me estava a meter.

    Muitas outras coisas foram mais “doidas”. Eu acho que fiz um trabalho bom e bem informado na escolha da licença, mas muitas das minhas outras escolhas do passado certamente não foram bem informadas. Eu nunca pensei que o Linux cresceria tanto até se tornar o que é hoje – nem mesmo nos meus sonhos mais loucos. E toda essa coisa de começar a criar meu próprio Sistema Operativo do zero, isso sim foi uma doideira.

    Richard Morris: John “Maddog” Hall costumava dizer que 5,2 biliões de pessoas ainda precisam de escolher o seu sistema operativo e que há de sobra pra todos. Bastava apenas chegar a elas antes do Bill e do Steve terem chegado. O que virou isso? A China, a Índia e a Indonésia já escolherem os seus sistemas operativos? Ou as universidades das BRICs começaram a apreciar os benefícios do .Net sobre o Mono?”

    Linus Torvalds: Eu acho que o código aberto tem um grande papel a fazer em vários lugares, não tanto pelo custo, mas por estar a criar uma infraestrutura própria e conhecimento de software.

    Essa é uma das vantagens do código aberto – não se está apenas a comprar uma “caixa preta”, está a comprar-se toda uma infraestrutura que se pode estudar e criar a sua própria.

    E eu acho que parece estar a ser assim em alguns lugares. Especialmente em algumas partes da América do Sul, por alguma razão (provavelmente cultural). Mas eu certamente não acho que isso é uma coisa do tipo “ou tudo ou nada”, então enquanto esses países aumentam os seus consumos de computadores, eu não acho que será radicalmente diferente de qualquer outra área.

    Richard Morris: A proliferação das distribuições Linux é uma coisa boa ou ruim? Você preferiria que houvesse mais esforços e menos distribuições?

    Linus Torvalds: Pessoalmente, eu sou uma pessoa que acredita na escolha. Sim, pode ser confuso, e sim, pode fazer o mercado parecer mais fragmentado, mas por outro lado, também gera competição. E competição é uma coisa boa – é uma coisa boa mesmo dentro de um projecto. É o que faz as pessoas tentarem coisas diferentes e acaba sendo bem motivacional.

    Então eu não acho que teríamos chegado a algum lugar sem esse monte de distribuições que temos por aí. Eu prefiro ter um pouco de boa discussão e até mesmo brigas do que uma paisagem calma com um único vendedor (ou dois vendedores que modelam o mercado).

    AS DISTRIBUIÇÕES LINUX

    E AS CERTIFICAÇÕES

    Richard Morris: É quase como se a “economia das distribuições” do Linux fosse parecida com o modelo de Taiwan; por exemplo: a economia taiwanesa é diferente da japonesa, da coreana e da chinesa enquanto há uma desnatação orgânica constante e um limite ao crescimento das empresas individuais e ainda assim é altamente inovadora tecnologicamente. Red Hat e SuSE uma vez prometeram ser a Ford e a GM do Linux mas aonde elas estão agora? O Ubuntu veio do meio do nada e bateu-as facilmente. O mesmo acontecerá com o Ubuntu?

    Linus Torvads: Eu acho que isso é bem saudável. E eu sei que todo o modelo significa que se tem que correr para se manter (em evolução, é chamado de “A Corrida da Rainha Vermelha”, quando tem que correr apenas para manter o seu lugar – de Alice no País das Maravilhas).

    E isso é bom. Faz com que todos nós sejamos correctos. E eu digo “nós”, porque eu acho que efeitos similares acontecem dentro de cada projecto também: mantenedores não podem acomodar-se apenas por causa da fama e encostar os seus projetos, porque se não se fizer o trabalho bem, outra pessoa pode chegar e fazê-lo por si – e acontece ocasionalmente aos projectos de código aberto e às pessoas pessoas que falam em fork.

    Richard Morris: O boom da certificação Linux nos últimos anos teve um efeito positivo na confiança das empresas na plataforma? Ou foi a grande adopção pelas empresas que causou a demanda por certificação? Parece ser argumentável que a confiança na plataforma aumentou inversamente enquanto o status de um engenheiro de suporte caiu do nível de guru místico ao nível de um humilde técnico?

    Linus Torvalds: Hmm. Eu não vejo nesses termos, porque eu não acho que sejam pontos de vista opostos, mas o contrário – apenas a progressão natural da economia empresarial.

    Sim, a adopção e a confiança de uma empresa estimula o interesse nas áreas que as empresas pagam, então a confiança de uma empresa obviamente resulta em maior demanda de certificações. Mas sim, também é um ciclo de feedback positivo, onde a disponibilidade da certificação acaba alimentando a confiança da empresa. E “confiança” é apenas outra forma de “familiaridade” – o mercado irá adoptar o que for familiar para as empresas para que essa familiaridade possa crescer. Então eu não vejo nenhuma divisão aqui. Não é algo como “isso ou aquilo”, na verdade é o inverso. Quanto aos engenheiros de suporte e o “status ter baixado”, eu acho que faz parte da mesma coisa. O que uma empresa menos quer são surpresas: ela quer estabilidade, labuta, mais do mesmo, planeamento a longo termo. Por outras palavras, quer familiaridade e confiança, e quer a mesma familiaridade e confiança nos seus subordinados. Não quer surpresas.

    Então a última coisa que o mercado quer é um “guru místico”. O Linux já está por aí há tanto tempo que o mercado confia no modelo e até gosta de ser associado com toda essa gente doida e incontrolável do código aberto (porque todos querem pensar que eles são imprevisíveis, até mesmo o menos imprevisível entre nós!), mas eles definitivamente também querem o mesmo engenheiro trabalhador chato e certinho de sempre.

    Não é que as coisas caíram do nível do “guru místico” ao do “humilde técnico”, é que o mercado empresarial adicionou o técnico humilde, porque no fim das contas, o que o mercado realmente quer é labuta.

    E eu posso perceber que a palavra “labuta” não precisa ser levada ao pé da letra, mas deve ser, e é o que o mercado empresarial quer. Eles também querem saber que têm um guru místico ao lado deles (eles conhecem o tipo, você só precisa imaginar), mas para o trabalho maçador, eles irão pegar no técnico humilde, ainda bem.

    Então isso não tem nada a ver com aquele negócio de um contra o outro, é uma coisa mais do tipo “levo os dois”.

    Richard Morris: Eu não posso terminar sem perguntar sobre a citação do Steve Ballmer. Conhece aquela em que ele diz que o «Linux é um cancro que infecta tudo aquilo que toca, no sentido de propriedade intelectual». O que acha que ele quis dizer com isso?”

    Linus Torvalds: Para mim é difícil entender o que diabo o Ballmer está a fazer. Primeiro a dancinha do macaco, depois joga cadeiras. Uma vez ele chamou o Linux de “anti-americano”, aparentemente porque ele não gosta de competição. Depois a coisa do cancro. Agora essa fixação com o Yahoo! Quando isso irá terminar?

    O que posso dizer? Acho que ele quis dizer que o código aberto cresce tão agressivamente e acaba por tomar o controlo (o que é bom – se se está dentro de todo esse negócio de mercado em expansão), mas ele quis dar a entender como se fosse algo que cresce sem controlo e é ruim para o que está a crescer. Por exemplo: cancro.

    Então eu certamente posso ver a lógica na escolha dessa palavra.

    Richard Morris: Acha que tem algum sentido?

    Linus Torvalds: Se eu acho que tem algum sentido? Não. É claro que o código aberto cresce agressivamente: Por que não? Custo baixo, grande qualidade, e o facto de não estar acorrentado a alguma empresa comercial em que não se ode confiar por se saber que ela apenas fica feliz se puder continuar a tirar o seu dinheiro. Claro que ele cresce.

    E sim, esse crescimento tem um custo para a Microsoft, mas isso é chamado de “competição”. Isso não faz dele um “cancro” mais do que um dia possa ter feito dele “anti-americano”.

    Por: Richard Morris

     

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