Recordando o tempo da Restauração
No dia 26 de junho de 1662, há 351 anos, ocorreu um golpe palaciano em Lisboa, que pôs fim à regência de D. Luísa de Gusmão e fez com que o debilitado D. Afonso VI assumisse a titularidade do seu reino e a fação do 3º Conde de Castelo Melhor chegasse ao poder, que manteve praticamente até ao fim das guerras da Restauração.
De todos os textos constitucionais, a Carta Constitucional de 1826 foi, sem dúvida, a que mais tempo vigorou em Portugal, até hoje. Outorgada a 29 de abril de 1826, por D. Pedro IV (D. Pedro I, do Brasil), a Portugal, quase logo após a morte de D. João VI, seu pai, a 10 de março de 1826, seria suspensa a 3 de maio de 1828, na conjuntura da aclamação de D. Miguel.
Mas na Ilha Terceira (Arquipélago dos Açores) ela seria restaurada, no dia 22 de maio de 1828, fez, há escassos oito dias, precisamente 185 anos. Em boa verdade, poder-se-á dizer que a Ilha Terceira se manteve como o único baluarte do liberalismo em Portugal, no período das guerras liberais, uma vez que nunca se submeteu à autoridade de D. Miguel.
O novo texto constitucional (Carta Constitucional de 1826) baseava-se na Constituição Brasileira que, nalgum do seu articulado, se filiava no texto constitucional francês de 1814. A Carta Constitucional de 1826 evidenciava também influência da 1ª constituição portuguesa (Constituição de 1822) e da Constituição Setembrista (1838) Tratava-se de um texto moderado, que representava um compromisso entre os revolucionários vintistas (cujo ideário é consagrado na Constituição de 1822) e os defensores de um reforço do poder régio. O rei passava a ter o poder moderador que anexava ao poder executivo e ainda nomeava os membros, vitalícios e hereditários, da Câmara dos Pares.
O poder legislativo era entregue a duas câmaras: dos Pares (de nomeação régia) e de Deputados (eleitos). O sufrágio era indireto e censitário (só podiam votar os homens com mais de 25 anos e que tivessem de rendimento líquido anual 100$000 réis ou mais). Este novo texto constitucional garantia aos cidadãos os direitos à liberdade, segurança individual e propriedade. A Carta (cartismo) esteve em vigor em Portugal Continental e Insular (à exceção da Ilha Terceira): de 31 de julho de 1826 a 3 de maio de 1828 (regência de D. Isabel Maria); de 27 de maio de 1834 a 9 de setembro de 1836 (D. Maria II) e de 1842 (golpe de Costa Cabral) a 1910 (implantação da República).
Com o regresso da Carta Constitucional de 1826, após a vitória liberal na Guerra Civil (1834), Mouzinho da Silveira, enquanto Ministro da Fazenda e da Justiça (1832) produziu um conjunto de decretos que permitiram transformar o velho “Portugal feudal” num país, progressista e liberal.
Em termos político-sociais garantiu a salvaguarda jurídica da liberdade individual em todos os setores (código penal, administração, ensino, pensamento, propriedade, segurança e trabalho); em termos económicos procurou compensar o país pela perda do Brasil, liberalizando a economia: libertou a propriedade agrária dos antigos direitos senhoriais, aboliu alguns morgadios (os de rendimento inferior a 200$000 réis), aboliu todos os dízimos (que eram pagos à Igreja), limitou o pagamento da sisa à transação dos bens imóveis; acabou com as portagens, aboliu os direitos de pesca e reduziu as taxas alfandegárias para as exportações a 1%.
Era, efetivamente, um texto constitucional mais conservador do que aqueles em que se inspira, mas, mais adaptado à realidade portuguesa, e daí a sua longevidade, até à proclamação da República, em 1910, com apenas três revisões, noutros tantos Atos Adicionais (1852, 1855 e 1896).
Entre os valorosos liberais do período vintista, refira-se o nome de D. António José de Sousa Manuel de Meneses Severim de Noronha, 1º Duque da Terceira, que se bateu corajosamente nas lutas liberais contra o Absolutismo, que tiveram o seu epílogo, precisamente aqui (recordo a lápide tumular que existe à entrada da Igreja de Santa Rita e que guarda os restos mortais de muitos soldados que tombaram nessas guerras liberais) na região do Grande Porto, entre 1832 e 1834, tendo a vitória sorrido à causa liberal.
Nos anos seguintes, desempenhou vários cargos políticos: foi Par do Reino e Governador das Armas da Província do Alentejo (reprimindo algumas movimentos militares que se levantaram a favor do Absolutismo). Mais tarde, iria para a Ilha Terceira onde a sua ação também é relevante, na expansão do liberalismo a outras ilhas daquele arquipélago, antes de vir para o continente, onde participou nas guerras liberais, ao lado de D. Pedro. O Duque de Saldanha, o Duque de Palmela e Mouzinho da Silveira são outros nomes insignes do liberalismo português.
ALGUNS DOS PROTAGONISTAS
D. João IV
Rei entre 1640 e 1656 – cognome: "O Restaurador".
Nasceu no dia 19 de Março de 1604, em Vila Viçosa e faleceu no dia 6 de Novembro de 1656, em Lisboa. Casou com D. Luísa Francisca de Gusmão.
Foi o monarca que recuperou a verdadeira independência nacional. Embora todo o País quisesse a separação da Espanha, houve ainda algumas manifestações de revolta, de que se destacou a do marquês de Vila Real e a do duque de Caminha, seu filho, que foram executados. Continuaram os ataques dos inimigos da Espanha a diversas regiões do Ultramar, nomeadamente em Angola e no Brasil, obrigando-nos a fazer grande esforço para conservar umas e recuperar outras. Houve cidades que se perderam, como aconteceu com Malaca e como antes ocorrera com Ormuz e outras praças de guerra.
Uma das suas medidas mais famosas foi proclamar Nossa Senhora da Conceição (Imaculada Conceição) padroeira e rainha de Portugal.
D. Luísa de Gusmão
N. em S. Lucar de Barrameda, na Andaluzia, Espanha, a 13 de outubro de 1613 e faleceu em Lisboa a 27 de fevereiro da 1666. Mostrou ser muito corajosa e ambiciosa, apoiando o marido e incentivando-o a que aceitasse a coroa. Diz-se dela que na altura da indefinição inicial do marido terá afirmado “mais vale ser rainha por uma hora, do que duquesa toda a vida!”. ou então que “era preferível morrer reinando do que viver servindo!”. Quando o marido morreu assumiu a regência e nesses seis anos (1656-1662) foi capaz de suportar a guerra com a Espanha no seu auge, tendo sido nessa altura que ocorreu a importante batalha das linhas de Elvas.
Conde de Castelo Melhor
Luís de Vasconcelos e Sousa foi o 3º conde de Castelo Melhor (filho de D. João Rodrigues de Vasconcelos e D. Mariana de Lencastre e Vasconcelos). Nasceu em 1636 e faleceu em 1720. Através de golpe palaciano conseguiu pôr termo à regência de D. Luísa de Gusmão, em 1662. Notabilizou-se como governante por ter conseguido levar a Guerra da Restauração ao seu termo. Depois foi exilado, regressando ao país em 1685. Fez parte ainda do Conselho de Estado de D. João V e foi o 12º Capitão Donatário da Ilha de Santa Maria (Açores).
Por:
Manuel Augusto Dias
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