Recordando a desordem do 1º de Maio de 1931
O 1º de Maio de 1931, em Portugal, foi uma jornada de luta contra a Ditadura Militar, que envolveu estudantes universitários, políticos da oposição e operários anarco-sindicalistas e comunistas.
Embora a manifestação fosse mais forte em Lisboa, teve repercussões noutras cidades, designadamente no Porto e em Coimbra.
A edição do “Avante!” de 6 de junho de 1931 começava, assim, a notícia da comemoração desse 1º de Maio em Lisboa: «O 1º de Maio de 1931 em Lisboa, marca uma página brilhante da luta do proletariado contra a burguesia (...)».
O 1º de Maio de há 83 anos foi mais uma frente de guerrilha política, a juntar à Revolta da Madeira (só solucionada a 2 de maio) e à Revolta na Guiné (com a rendição dos revoltosos a ocorrer apenas a 6 de maio).
O jornal “Diário de Lisboa” do dia 2 de maio de 1931, na última página, que dedica inteiramente a este assunto, com o título “Sublevação da Madeira” e o subtítulo “Os revoltosos do Funchal renderam-se hoje, às 9 horas, sem condições”, começa assim:
«Conforme noticias recebidas esta manhã pelo Govêrno, da base de operações contra os revoltosos da Madeira, estabelecida em Porto Santo, sabe-se que os rebeldes do Funchal, enviaram ao sr. Ministro da Marinha um radio, comunicando-lhe que se rendiam em virtude da superioridade numérica e de material das forças governamentais, e para evitar que houvesse vitimas entre a população civil da ilha.
Os rebeldes julgaram, deste modo, inútil prosseguir uma luta em que tinham poucas probabilidades de vencer, resolvendo entregar-se às autoridades constituídas anteriormente à rebelião.
A Republica vive no coração de todos os que a servem, segundo a sua posição, e com ela, a Patria precisa tranquilidade, pois o instinto nunca lhe faltou para resolver os seus destinos, até nas horas mais delicadas».
No dia 25 de abril de 1931 a movimentação estudantil tinha--se iniciado com uma greve na Faculdade de Medicina de Lisboa, que provocou bastante agitação no meio académico, que rapidamente se propagaria às universidades de Coimbra e do Porto, extravasando para a rua.
No dia 30 de abril a multidão que se juntou no funeral do estudante portuense João Martins Branco (que faleceu durante os confrontos com a polícia nos dias anteriores) manifestou--se claramente contra os métodos policiais usados pela Ditadura. Por isso, o último dia de abril e o primeiro de maio daquele ano foram de enorme agitação estudantil e popular em Lisboa e no Porto.
Os estudantes universitários apoiavam a luta que se travava contra a Ditadura, na Madeira e na Guiné, acreditando que o retorno à República seria melhor para o povo e para o País.
Em Lisboa, nas ruas da Baixa e sobretudo no Campo de Santana, a balbúrdia desse 1º de Maio foi enorme. Foram distribuídos manifestos estudantis e de organizações operárias. Elementos anarco-sindicalistas e comunistas envolveram-se também.
O povo concentrou-se no Rossio, para celebrar o 1º de Maio, mas a GNR dispersou os manifestantes. Passados alguns minutos rebentou uma bomba nas imediações daquela praça a que se seguiram mais dois rebentamentos que lançaram o pânico.
A iluminação esteve apagada durante a noite e, às 23 horas, a polícia mandou fechar os estabelecimentos comerciais ainda abertos (cf. “Diário de Lisboa”, de 2 de maio de 1931).
Só nas instituições de saúde de Lisboa, no dia 1 de maio, foram socorridas 26 pessoas (21 homens e 5 mulheres), sendo de admitir que o número de feridos fosse maior, mas para não terem de se identificar, alguns preferiram tratar-se junto da família. Destas quase três dezenas de feridos oficiais, viriam a falecer quatro homens (três no Hospital de S. José e um no Hospital de S.ta Maria).
No Porto, o 1º de Maio decorreu com normalidade até meio da tarde, depois, registaram-se incidentes que provocaram ferimentos em pelo menos um agente das forças policiais e em diversos populares (o “Diário da Manhã”, de 2 de maio, refere cerca de 20 feridos), o que levou as autoridades a mandar encerrar todos os estabelecimentos.
Os tumultos revolucionários de apoio aos revoltosos da Madeira ocorreram noutras partes do País, quase sempre provocados por elementos considerados extremistas e próximos dos comunistas e dos anarco-sindicalistas.
O “Diário da Manhã” de 4 de maio noticia «mais uma tentativa de descarrilamento próximo de Pombal» (Linha do Norte), mas antes já se haviam registado descarrilamentos no Porto, na Figueira da Foz e noutras localidades.
No princípio de maio de 1931 a polícia conseguiu fazer uma importante apreensão de bombas, espingardas e material de guerra, em Lisboa e Alverca. Até os taxistas da capital colaboraram neste rebuliço com uma greve.
Em suma, o 1º de maio de 1931 foi uma jornada de luta, inequivocamente, a favor dos revoltosos e contra a Ditadura. Houve bastante protagonismo, nestes tumultos, por parte dos estudantes universitários, mormente das faculdades de Medicina e de Direito. Registaram-se pelo menos quatro mortos, cerca de uma centena de feridos nos confrontos com as polícias e dezenas de prisões. Mas verificou-se, também, que a oposição não estava só nas Academias. Havia outras organizações por detrás da desordem, conforme explica Raúl Rêgo (História da República, página 181): «Como se a oposição à ditadura tivesse bases ideológicas que não apenas atitudes individuais ou profissionais».
Felizmente, vivemos hoje em democracia e, desde 1974, em cada 1º de Maio as pessoas podem manifestar-se pacificamente e dar largas às suas reais preocupações que, infelizmente, são cada vez mais, nos difíceis tempos que vamos vivendo.
Por:
Manuel Augusto Dias
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