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    Arquivo: Edição de 15-06-2009

    SECÇÃO: Cultura


    EM MAIS UMA “VISITA DE ESCRITORES À BIBLIOTECA DE VALONGO”

    Pacheco Pereira falou dos seus livros e da História recente

    Historiador, professor universitário, filósofo, analista político e escritor, José Pacheco Pereira passou pela Biblioteca Pública Municipal de Valongo no passado dia 29 de Maio deixando vivo testemunho dos seus multifacetados saberes e experiências, sobretudo nesta última área de intervenção; a de escritor.

    E foi na pele de homem de letras que Pacheco Pereira anuiu ao convite de Isaura Marinho, a directora e uma das grandes dinamizadoras da acção cultural que se faz naquele espaço de leituras, tal como o programa “Os Escritores Visitam a Biblioteca” lançado pouco tempo depois da inauguração do edifício, em 17 de Junho de 2005. Ao longo destes cinco anos, por lá passaram já 25 escritores que vêm estabelecendo contactos coloquiais com os seus leitores e não raras vezes com jovens estudantes das escolas do concelho.

    Fotos MANUEL VALDREZ
    Fotos MANUEL VALDREZ
    GREVES E CENSURA

    A mediática figura de Pacheco Pereira atraiu dezenas de pessoas que, encheram, primeiro o átrio da biblioteca, onde actuou “A Tela”, grupo de música e bailado de Arcos de Valdevez constituído por Miguel Fernandes, Carlos Pinto, Estela Novais e Inês Sousa, e depois o auditório.

    Natural do Porto, Pacheco Pereira iniciou a sua carreira universitária em Lisboa onde começou por estudar Direito, mas foi na Faculdade de Letras da Universidade do Porto que concluiu a sua licenciatura em Filosofia.

    «Como escritor posso dizer que já escrevi vários milhares de páginas publicadas e não publicadas», começou por afirmar Pacheco Pereira.

    Foi porém na história das lutas operárias contra a carestia de vida em Portugal e a greve geral de Novembro de 1918 (livro editado em 1971), na biografia de Álvaro Cunhal, que escreveu em dois volumes dados à estampa em 1999 e 2001, e no crivo censório da polícia política, que Pacheco Pereira mais se deteve, atalhando, de resto, a este propósito, que os dois primeiros livros da sua carreira como escritor foram apreendidos pela Pide.

    Sobre Álvaro Cunhal e para tentar explicar o trabalho de pesquisa que teve de elaborar nesses dois livros biográficos, “O Jovem Revolucionário (1913-1941)” e “Duarte, O Dirigente Clandestino (1941-1949)”, Pacheco Pereira referiu, por graça, que «quase podia publicar um outro livro contando só as histórias do modo como foi realizada essa escrita».

    1918 – ANO ATÍPICO

    Já em relação à sua estreia literária, “As lutas operárias contra a carestia de vida em Portugal: A greve geral de 1918”, Pacheco Pereira sublinhou que se trata de um estudo sobre a História Portuguesa no ano em que terminou a 1ª Guerra Mundial, um ano muito especial para a Europa e particularmente para Portugal. «Foi o ano da gripe espanhola (pneumónica) que vitimou milhões de pessoas na Europa e muitos milhares em Portugal», sublinhou Pacheco Pereira.

    «Foi um ano de enormes tumultos. Havia escassez de bens, assaltavam-se as mercearias, as lojas, os armazéns de mantimentos. É um período de grande instabilidade política com tentativas de instauração de regimes ditatoriais e com assassinatos políticos». Um ano atípico como enfatizou o escritor, acrescentando que contrariamente à ideia erradamente apregoada, Portugal, não é um país de brandos costumes.

    «E embora o século XX não tenha sido muito mortífero, se descontarmos a guerra em África, a verdade é que 1918 é o ano de maior violência política em Portugal. É o ano de assassinatos por razões sociais, é o período em que o patronato português, à imagem do espanhol, cria um exército de acção armada constituído por pistoleiros cujo objectivo era furar as greves», sintetizou Pacheco Pereira.

    EFEITO SURPRESA

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    «Na minha geração não se fazia a mínima ideia que isto acontecera. Na Universidade nunca se passava do século XVIII, quando não se ficava mesmo pelos Descobrimentos. Chegávamos à Revolução Francesa e não havia História de Portugal», revelou.

    Era como se se tivesse apagado a memória colectiva. Nada se sabia do que ocorrera na I República. «Tínhamos uma ideia muito vaga do que tinha acontecido antes do Estado Novo ou quem era Afonso Costa». Sabia-se da existência do Partido Republicano, mas ninguém sabia que tinha havido partidos políticos legalizados, inclusive o Partido Comunista Português, que é a mais antiga organização política em Portugal, para além da Maçonaria. Também não se sabia que havia um poderoso movimento sindical e uma importante Confederação de Sindicatos, a CGT, que viria a dar origem à actual CGTP», esclareceu o historiador, que abordou ainda a proliferação de grupos anarquistas e anarco-sindicalistas na cidade do Porto, alguns dos quais com nomes bem bizarros como o “Dinamite Cerebral”.

    Toda a informação que fundamenta o conhecimento histórico de Pacheco Pereira sobre essa época foi cimentada – como elucidou – na Biblioteca Pública do Porto que frequentava, duas ou três vezes por dia. E ironizou: «Era já um leitor mal visto pelos funcionários, por tanto trabalho de busca a que eram obrigados».

    Aí descobriu toda a Imprensa da 1ª República que, por feliz acaso, estava depositada na Biblioteca de S. Lázaro. Em Lisboa, a biblioteca tinha sido censurada. «Eu nem sabia que existiam títulos de imprensa como “O Comunista”, “A Comuna” ou “A Batalha”, onde colaboraram Aquilino Ribeiro e Vitorino Nemésio. Descobri-os por acaso, porque muitos desses jornais estavam fechados», revelou o historiador, que começou a sua militância política no PCP-ML, do qual foi fundador, no Norte.

    «Quando publiquei, em 1971, o meu primeiro livro sobre essa época, o efeito surpresa foi enorme, porque a oposição dessa época, por tradição, não falava destes conflitos. Falava, isso sim, das liberdades, dos direitos cívicos, da repressão, mas evitava falar da luta de classes, de conflitos sociais e das greves».

    Quanto ao Partido Comunista Português, Pacheco Pereira enumerou algumas dificuldades de acesso a fontes documentais e a diversos arquivos que impediram a recolha e o estudo de factos e acontecimentos para a reconstituição da História do Partido, optando antes por escrever a biografia política de Álvaro Cunhal.

    Por: Álvaro Mendonça

     

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