Compensação de Crédito (2.ª parte)
Posto isto, e estando reunidos os pressupostos legalmente exigíveis, é atribuído ao devedor o direito de compensar.
Alguns sistemas legislativos estabelecem que a compensação opera ipsoiure, i.e., automaticamente, extinguindo os dois créditos (ativo e passivo) de forma imediata – compensação legal. Deste modo, estando preenchidas as exigências para a compensação, esta opera imediatamente, sem que seja necessária qualquer manifestação de vontade para a sua concretização.
Outros sistemas legislativos fazem depender das partes o exercício do seu direito a compensar, mediante declaração, via judicial ou extrajudicial. Nestes sistemas, estabelece-se que a declaração tem eficácia retroativa.
O atual Código Civil, de 1966, estabelece o regime para a compensação mediante declaração da parte interessada (artigo 848.º), contrariamente ao de 1867, que consagrava a compensação legal
Aquele direito de compensar é um direito potestativo. Quer isto dizer que o seu exercício depende de uma declaração unilateral de vontade, imposta à contraparte.
A par da não automaticidade da compensação, deve falar-se do momento em que a mesma começa a produzir os seus efeitos.
É certo que no entendimento dos dias de hoje a compensação tem eficácia retroativa, fazendo com que os créditos se considerem extintos desde o momento em que se tornaram compensáveis (artigo 854.º).
Esta questão afigura-se pertinente para proteger a confiança das partes da relação jurídica, pois resulta na extinção daquela relação recíproca credor-devedor, deixando claro que, a partir do momento em que os créditos se determinem como compensáveis, nenhuma das partes permanece obrigada a prestar perante a outra.
Caso tal não estivesse previsto, podia suceder que o credor, por exemplo, continuasse a entender que podia executar o devedor para cumprimento da obrigação que julga ainda existir, sob pena de enriquecimento sem causa (artigo 473.º do C.C.) – situação de um património enriquecer ilicitamente à custa de outro, o que resulta na posterior obrigação de restituir o que a pessoa adquiriu sem fundamento legal.
Esta alusão à compensação de créditos, ainda que breve, não pode deixar de fazer referência às causas que a excluem, também reguladas no Código Civil, no seu artigo 853.º.
Indubitavelmente, a compensação não opera caso o crédito principal seja emergente de um facto ilícito doloso. Por outras palavras, o devedor não pode invocar o contracrédito que só exista por força de uma atuação fraudulenta da sua parte. A título de exemplo pode falar-se da obrigação de indemnizar por danos corporais em virtude de uma agressão. De facto, se o devedor está obrigado a pagar uma indemnização dado que culposamente feriu outrem – o seu posterior credor – compreende-se que não seja equitativo ou justo permitir que ele invoque um outro crédito de que dispõe contra o lesado, numa outra relação jurídica, para se livrar deste.
Do mesmo modo, também não existe o direito de compensar quando o crédito principal seja impenhorável, pois estes têm em vista, regra geral, garantir a subsistência do credor ou da sua família. Contudo, caso o contracrédito seja da mesma natureza daquele, i.e. seja impenhorável pelas mesmas razões, pode verificar-se a sua compensação. Por exemplo, o crédito emergente da obrigação de prestar alimentos ao ex-cônjuge, em sede de divórcio, não é suscetível de penhora e, bem assim, impossível de compensar. Nos casos em que o credor e o devedor são ex-cônjuges, o devedor não pode livrar-se da obrigação de prestar alimentos ao seu credor invocando um outro qualquer crédito que, mesmo tendo surgido na sequência do divórcio não seja impenhorável nos mesmos termos.
A terceira causa de exclusão ocorre quando o crédito principal pertença ao Estado ou a outras entidades públicas.
Além do supra referido, jamais é admitida a compensação se a invocação do contracrédito prejudicar direitos de terceiros, caso estes se tenham constituído antes de os créditos se tornarem compensáveis. Para simplificar, se sobre o contracrédito incidir um qualquer direito (de penhor, usufruto, etc.) pertencente a terceiro, não poderá ser invocado em sede de compensação pois isso implicaria sacrificar um direito legítimo que outrem tem sobre a coisa e que deixaria de ter caso se operasse a compensação pelo facto de os créditos com ela se extinguirem.
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Por: José Puig*
*Advogado
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