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Quaresma
Quaresma, quarenta, quarentena são palavras da mesma família. Para a Igreja Católica e a generalidade das Igrejas cristãs, é o período de 40 dias em que se prepara a festa da Páscoa. Porque as grandes festas preparam-se! E, para os cristãos não há festa maior. Eles querem chegar renovados e revitalizados à festa das festas. E por isso a Igreja mobiliza-os para exercícios, para um tempo de concentração e estágio.
Na sua origem, a quaresma foi organizada como última etapa da preparação dos catecúmenos para receberem os sacramentos da Iniciação Cristã (Batismo + Crisma + Comunhão) na Vigília Pascal: é um tempo intensivo de purificação e iluminação. A este "retiro" dos catecúmenos veio associar-se a etapa final da preparação dos "penitentes" (Batizados culpados de pecados especialmente graves) para receberem a absolvição e serem readmitidos à Comunhão eucarística. Essa celebração da reconciliação acontecia em quinta ou sexta-feira Santa. Para o conjunto dos batizados que acompanhavam catecúmenos e penitentes nas suas caminhadas, a quaresma vai tornar-se um tempo de conversão em ordem à recuperação da graça batismal e à celebração plena da Páscoa.
A princípio, os 40 dias contavam-se desde o 6º Domingo antes da Páscoa até Quinta-feira Santa: os dois últimos dias da última semana já pertenciam ao Tríduo Pascal. O Rito Ambrosiano (Lombardia, Itália) continua a contar assim a sua Quaresma. Entretanto, nem todos esses dias são de penitência. De facto, os antigos Concílios proibiam fazer penitência ao Domingo! Desejosos de se preparar para a Festa da Ressurreição com 40 dias de penitência, os cristãos passaram a contabilizar também os dois últimos dias da Semana Santa e acrescentaram-lhe mais quatro dias da sétima semana antes da Páscoa, antecipando a entrada deste tempo de penitência para quarta-feira de cinzas.
Os exercícios da chamada "observância quaresmal" são, tradicionalmente, três: oração, jejum e esmola. Os três são inseparáveis. mediante a oração, o cristão revitaliza a sua relação filial com Deus; mediante a jejum, exercita-se na liberdade em relação a si próprio e à sua necessidade de bens materiais, tomando consciência de que "nem só de pão vive o homem"; pela "esmola" - hoje diríamos: partilha solidária de bens com os mais carenciados - o fiel abre o seu coração aos outros homens que é chamado a acolher e amar como irmãos.
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Será que ainda faz sentido jejuar? Como primeira resposta, podemos constatar que hoje são muitos os que "jejuam". Os motivos é que nem sempre são espirituais e de fé. Jejua-se por prescrição dos nutricionistas, jejua-se - faz-se "greve de fome" - para dar força a um protesto ou reivindicação… Aparentemente igual no exterior (não comer ou comer significativamente menos), o nosso jejum tem de ter uma motivação específica: exprime a nossa "solidariedade" com Cristo, a nossa determinação a morrer, de algum modo, com Ele: para o egoísmo, para vícios que nos tiranizam, para indiferença e o pecado. Nós não vivemos para comer, comemos para viver! Mas não vivemos só do pão material que sacia o ventre… Por outro lado, a privação voluntária de alimentos permite-nos experimentar "na pele" um pouco do que sofrem tantos homens e mulheres que passam fome. Essa experiência abre-nos o coração à partilha fraterna. Não faz sentido jejuar para amealhar!
E a abstinência, ainda faz sentido? Trata-se de uma forma mitigada de jejum: em vez da quantidade de alimento, a abstinência incide sobre a qualidade. Consiste em renunciar a alimentos mais ricos, requintados, dispendiosos. Tradicionalmente, guardar abstinência era não comer carne… No passado, quando não havia frigoríficos nem rede de frio, fora das zonas piscatórias em que se podia ter peixe fresco, uma alimentação à base de peixe era "penitência"! Hoje, nem sempre é assim. Olhando para o espírito e menos para a exterioridade, é certamente mais "abstinência" comer um prato de frango de que um prato de marisco…
Por: Padre João Peixoto*
*Pároco de Ermesinde
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