EDITORIAL
Na noite de S. João
Segundo a tradição popular esta é das noites mais misteriosas do ano.
Variando de terra para terra, encontramos em todo o país tradições de práticas mágicas, crenças, divinações, “sortes»”e muitas mouras encantadas, «em regra assoalhando os seus tesouros, e em que têm lugar as práticas que lhes dizem respeito, e designadamente aquelas em que se dá o seu encantamento ou desencantamento».(1)
(…) Assim, por exemplo, em Valongo, no dia de S. João, antes de nascer o Sol, ouve-se, nas minas – e advirta-se que se trata das galerias mineiras de ouro, da época romana – tocar o sino debaixo da terra». (1)
Noite festiva em que se associam diversos rituais relacionados com o fogo, a água, o sal, as ervas, sempre com uma preocupação de adivinhação ou de purificação e de fertilidade, quer em relação ao ser humano, aos animais e às terras.
S. João é um santo casamenteiro, talvez porque a maioria destas “sortes”, divinações e crenças têm a ver com namorados, casamentos e procura de felicidade.
Curioso é S. João ser quase sempre representado como um pastor com um cordeiro ao colo e serem o Santo António, Santo Amaro e até S. Mamede os santos protetores do gado.
Mas nas cascatas lá está ele, sempre acompanhado com um rebanho de ovelhas, ovelhas essas que servem para a cascata e para o presépio das pessoas mais simples.
De qualquer forma a transumância da Serra da Estrela para Montemuro era no dia de S. João e em muitas regiões do nosso país come-se nesse dia cabrito ou borrego.
Aqui nas antigas “Terras da Maia” existia a tradição de enfeitar um pinheiro com papéis de seda coloridos, bandeiras, ramos de flores e folhagens de outras árvores, à volta do qual se organizava um espaço com balões e enfeites feitos com fitas de papel, verduras e flores, aí decorria o bailarico à volta da fogueira.
Ermesinde já teve num passado recente noitadas de S. João organizadas em diferentes lugares da cidade, lembro-me em especial do S. João da Gandra, mas havia outros mais pequenos mas muito característicos, como o da Ramadinha.
Quanto às plantas, sejam elas para a culinária ou para cura de alguns males do corpo ou da alma, «devem ser apanhadas sem que os raios do sol as toquem e façam evaporar o orvalho da noite sagrada» (1)
A sorte do ovo é praticada em diferentes zonas do país e consiste em «partir um ovo, à meia-noite do S. João, dentro de um copo com água, que se deixa ao relento; na manhã seguinte, antes de nascer o sol, observam-se as formas que as claras tomavam, e interpretavam-se essas formas, um pouco como procediam os oráculos que liam os sinais proféticos».(1)
Esta prática é referida aqui bem perto em Santo Tirso, onde esta quadra é conhecida
S. João, de Deus amado
S. João de Deus querido
Dizei-me nesta noite
Quem vai ser o meu marido
Hoje as festas são outras e a realidade do país também, é caso para tentar adivinhar alguma coisa que nos torne mais felizes!
Porque não tentar as “sortes”?
Não à procura dum marido, mas dum caminho que nos ajude a tirar este país deste sufoco.
(1) Ernesto Veiga de Oliveira, “Festividades Cíclicas em Portugal”, Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1984.
Por:
Fernanda Lage
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