Nova lei das finanças locais
O Conselho de Ministros acaba de aprovar uma Nova Lei das Finanças Locais que enviará para a Assembleia da República com vista a que as novas regras entrem em vigor em Janeiro de 2014.
Conhecida que é a situação de endividamento financeiro de muitas das 308 câmaras municipais, o Governo tenciona aproveitar a elaboração do novo instrumento para impor às autarquias locais regras que impeçam que se repita a situação de “falência” em que algumas se encontram, ao mesmo tempo que tenciona promover a constituição de um fundo de resgate, mediante um plano de redução da dívida e a entrada de um gestor nomeado pelo fundo, que acompanhará a gestão dos municípios sobre endividados, enquanto para os demais será exigido a certificação das suas contas por um auditor externo.
A constituição do fundo de apoio municipal observará princípios de “mutualização da dívida e solidariedade intermunicipal”, e será alimentado pelos próprios municípios através de receitas do Imposto Municipal sobre Imóveis, com contribuições do Governo, na sua fase inicial.
Para garantir o equilíbrio e a aplicação das novas regras, a proposta do Governo preverá, também, a criação de um conselho coordenador constituído por representantes do Ministério das Finanças, da Associação Nacional de Municípios Portugueses e da Associação Nacional de Freguesias.
Como se vê, do que nos é dado a conhecer pelo Jornal de Notícias e pelo Diário Económico, não é de estranhar a reação dos autarcas, uns atacando a colocação de gestores a vigiarem os gastos das autarquias, enquanto outros, de câmaras com contas em ordem, não aceitam participar no esforço destinado a equilibrar as finanças dos inveterados “gastadores”.
Ao defender a discordância da designação de gestores para acompanhar as autarquias, o presidente da Câmara de Melgaço entende que na mesma linha de raciocínio, também o Governo central, que cometeu o mesmo erro de endividamento exagerado, deveria ser substituído na aplicação dos dinheiros por gestor externo indicado pelas entidades financiadoras da dívida pública, coisa que Solheiro não concebe em regimes democráticos, repudiando, por isso, que igual figura seja imposta ao Poder Local pela entidade que financiará a regularização das suas dívidas.
Sabendo-se que as decisões do Governo são amplamente condicionadas por imposições da conhecida Troika, o que terá escapado a Rui Solheiro para ignorar que a gestão governativa tem muito mais a ver com os “gestores externos” do que com a vontade dos governantes apoiados pela maioria dos deputados eleitos pelos cidadãos? Com efeito, na prática, antes do Poder Local ser vigiado por um qualquer gestor externo, já o governo do país está submetido a essa figura desde que recorreu à Troika para evitar a bancarrota.
Quanto a nós, parece-nos adequada a proposta da designação de gestores para supervisionar o funcionamento das autarquias no que a despesas diga respeito. Dúvidas surgir-nos-ão se a designação ficar ao alcance do poder e controlo dos partidos, e o não cumprimento das missões que a lei fixar a esses “vigilantes” se ficar por consequências que não afetem o seu património, a sua liberdade pessoal e, se se tratar de revisores oficiais de contas, ou de técnicos oficiais de contas, como as circunstâncias recomendam, se vejam impedidos de continuar a exercer as respetivas atividades.
Um outro risco dos objetivos do legislador ficarem pelo caminho reside em atribuir às assembleias municipais a designação do auditor externo para certificar as contas municipais. Pressupondo que os honorários sejam suportados pela autarquia, sabendo-se que as maiorias nas assembleias são quem suporta os executivos, só por magia é que os selecionados não serão próximos dos aparelhos partidários, limitados, por isso, na realização de um trabalho que verdadeiramente assegure o cumprimento escrupuloso de toda a legislação aplicável e evite que se repita o regabofe que foi a gestão das autarquias desde que começaram a beneficiar dos fundos comunitários.
Parece-nos que os resultados seriam melhor conseguidos e as legítimas preocupações menores, se a designação dos auditores fosse da responsabilidade da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas e os gestores indicados pela Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, respondendo, então, os primeiros perante as assembleias municipais e os segundos, à administração do Fundo de Apoio Municipal. E, mais seguro seria se o pagamento dos honorários destes técnicos de contas fosse assegurado pelas respetivas ordens profissionais, recebendo estas das autarquias verba calculada necessária para prover aos correspondentes dispêndios.
Não seguindo estas ou práticas semelhantes, bem poderá acontecer que as autarquias venham a suportar um custo acrescido continuando tudo na mesma: relatórios e mais relatórios com direito ao contraditório, acabando tudo no fundo das gavetas, nos arquivos municipais como matéria-prima para historiadores, ou mesmo no caixote do lixo. Algo parecido com as auditorias do Tribunal de Contas que ciclicamente censuram ou emitem reservas às contas públicas, não se conhecendo consequências palpáveis para os respetivos executores dos orçamentos e responsáveis pelas contas da administração pública.
Por:
A. Alvaro de Sousa
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