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Edição de 30-06-2025
Jornal Online

SECÇÃO: Local


NOTÍCIAS DO CENTRO SOCIAL DE ERMESINDE

As vidas que se dão à luz num palco

Espetáculo de fim de ano letivo na E2OV foi levado à cena no Centro Cultural de Alfena, no passado dia 13 de junho. Uma sexta-feira de sorte para os alunos que se estrearam a pisar o palco.

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“E2OVELHANEGRA – És Ovelha Negra Na Selva”

Gabriela Cardoso tem 16 anos e frequentou a Escola Segunda Oportunidade de Valongo (E2OV) nos últimos dois.

Na peça de teatro que se começou a construir em setembro do ano passado carregava a responsabilidade de assumir, publicamente, que era uma aluna invisível para o sistema de ensino dito “regular”. “Eu não sou apenas aquela que se senta do outro lado da vossa mesa”, diz – a certa altura – na peça. E completa: “tenho sonhos, medos e experiências de vida que fazem de mim quem eu sou”.

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A “Bibi”, como diz que é conhecida entre os seus pares, e que agora se despede do estabelecimento de ensino, conta que foi na E2OV que encontrou quem a ouvisse e olhasse da maneira que precisava. “Tive momentos bons e maus, como é normal. Mas foi aqui que consegui deixar para trás a miúda que eu era e que não se encaixava na escola “normal”. Ainda me estou a construir, mas sinto que já estou muito diferente e que estou preparada para agarrar o meu futuro, porque me deram a oportunidade de mostrar quem verdadeiramente sou.”

Uma perspetiva muito semelhante têm Raul Oliveira e Vítor Vilacova. Partilharam o palco em dois momentos diferentes. Primeiro numa peça que retrata um grupo de amigos perdidos na selva, que aprendem a valorizar a distância das redes sociais e a aprofundar o espírito de entreajuda para enfrentarem a situação com que se deparavam. Depois num momento musical a dois, que abordava a experiência de uma vida sentida “à margem”. Marcada pela diferença e pelo estigma, que está – tantas vezes – na origem da distinção que a sociedade (e a escola) faz dos jovens oriundos de contextos sociais mais difíceis.

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“É um projeto incrível, nunca vivi nada igual. No meu ponto de vista ajudou-me muito, como sei que ajuda os outros também. Adoro isto. Aprendi, ao longo do meu percurso, que devemos pensar antes de agir, amarmo-nos como somos e os outros, como eles são”, afirmou Raul.

Vilacova salientou “a união do grupo, a confiança que aprendemos a ter nas pessoas e amigos que vamos conhecendo e a certeza de que nunca devemos desistir dos nossos sonhos.” E acrescentou que “esta escola ajudou-me a recuperar o orgulho em mim mesmo.”

Quem se sentou no auditório na noite de sexta-feira 13, percebeu que havia magia no ar. Que uma equipa inteira, constituída por alunos e professores, estava a expor, no palco, as fragilidades, os desafios e as superações de um sistema que nem sempre acolhe toda a gente da mesma forma. Mas que, apesar de tudo, oferece uma segunda oportunidade. Que os alunos têm de saber agarrar. E eles agarraram-na.

Fizeram um verdadeiro espetáculo, com momentos musicais (houve um aluno a compor a música que cantou, outro que juntou a sua guitarra e voz ao enredo “selvagem”), de interpretação e de dança. “És Ovelha Negra Na Selva” foi um jogo de luz e de cor, de palavras e de ritmos. Que mostrou que este palco a que chamamos vida tem papéis e lugar para toda a gente.

No discurso de despedida, no final da noite, “Bibi” – ainda no palco e dirigindo-se ao público - lembrou que nunca tinha pisado um.

Sentiu-se o bem que lhe fez. A ela e a todos os outros.

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Florentino Silva, diretor da escola, estava emocionado com o trabalho desenvolvido pela equipa: “guardamos, em memória, os momentos que vivemos juntos, as barreiras que ultrapassámos e as descobertas que fizemos. Fica um aperto de saudade, já”, discursou.

Filipe Moreira escreveu e encenou a peça, Jorge de Vasconcelos apoiou na preparação dos jovens. “É um trabalho que se faz com e para eles, onde tudo o que importa é o que esta experiência lhes acrescenta”, afirmou o professor Jorge.

“Um espetáculo que, de certa forma, os constrói e prepara para as suas caminhadas”, destacou Filipe Moreira. “O mais importante de tudo é aprenderem que a vida é um palco e que, lá fora como aqui dentro, erros acontecem, há que contar com os improvisos e que se alguma coisa falha, seguimos sempre em frente. Afinal, quem está a assistir não sabe se o tropeção fazia parte da cena, ou não”, finalizou.

E2OV INTERNACIONAL

Com seis anos letivos em atividade, a Escola Segunda Oportunidade de Valongo inclui um grupo de seis estudantes senegaleses.

A maioria deles está há cerca de um ano, a ano e meio em Portugal. Na E2OV trabalham para a certificação no 9º ano de escolaridade e contam poder preparar-se para o mercado laboral.

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Khadim e Makhary participaram no espetáculo de final de ano: “eu tenho duas participações, a dança das lâmpadas e a coreografia de uma música; foi muito difícil aprender a dançar, mas eu gostei muito”, disse o primeiro.

“Esta escola é muito importante para nós porque nos ajuda a aprender o português. Queremos muito saber falar a língua bem”, completou Makhary.

A escola oferece-lhes um currículo adaptado, com inglês, mundo atual e, também, ensino de diversas formas de arte.

HELENA CASTRO - MEDIADORA LINGUÍSTICA E CULTURAL

 

 

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