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Edição de 31-03-2024
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    Arquivo: Edição de 31-05-2021

    SECÇÃO: Crónicas


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    A GUERRA COLONIAL PORTUGUESA (21)

    Alguns precedentes históricos

    (continuação do número anterior)

    III

    O MASSACRE DE MUEDA

    No seguimento do tema que encetámos na nossa anterior crónica sobre alguns precedentes históricos que conduziram ao início da luta armada nas nossas ex-colónias ou províncias ultramarinas, em África, e respeitando a sua sequência cronológica, vamos agora falar do incidente que ficou conhecido por “Massacre de Mueda”, em Moçambique.

    Mueda era, à época, 1960, um aldeamento, tendo sido erigido à categoria de vila, em 1967, curiosamente fundada em torno dum aquartelamento do exército colonial português, vindo a tornar-se sede do distrito homónimo, na província de Cabo Delgado, no extremo nordeste do país. É habitada maioritariamente por Macondes, uma etnia que ocupa geograficamente esta região nordestina de Moçambique e o sudeste da Tanzânia, outrora África Oriental Alemã (1880-1919), passando esta, a partir de 1920 (após a I Guerra Mundial) e por mandato da Sociedade das Nações, a ficar sob o domínio da coroa britânica. Viria a tornar-se independente em 26 de março de 1964, com a atual designação de Tanzânia. Antes, porém, designara-se Tanganica.

    Com efeito, rezam as crónicas que grande número de Macondes, fugindo à ocupação colonial portuguesa e às severas condições de vida que o regime lhes impunha, nomeadamente através do estatuto do indigenato de que, noutra sede, já aqui falámos, se havia deslocado para o vizinho Tanganica, onde o regime imposto pelo capitalismo da coroa britânica se mostrava mais moderno, liberal, tolerante e flexível, sobretudo no que concerne às condições de trabalho e de acesso ao mesmo. Daí que, entre finais do ano de 1959 e meados do ano de 1960, várias delegações representativas da população maconde residente nessa colónia vizinha e que pretendia regressar massivamente às suas origens, se tenha apresentado ao governador do distrito de Cabo Delgado, comandante de marinha Teixeira da Silva, reivindicando liberdade para si e para as suas terras, assim como condições de trabalho idênticas às que vinham usufruindo naquela colónia inglesa, designadamente a abolição do trabalho forçado e da exigência da 4.ª classe do ensino primário para a obtenção de carta de condução. Em face disso e no sentido de falar diretamente à população, tanto mais que o desconforto causado pelas reivindicações já havia levado as autoridades coloniais a prender alguns desses delegados, esse mesmo governador mandou convocar a população e seus representantes para uma grande reunião, a ter lugar precisamente em Mueda, planalto dos Macondes, no dia 16 de junho de 1960. Reunião à qual terão comparecido à volta de 5.000 nativos, um milhar deles com as suas bicicletas, desarmados, sem as suas tradicionais catanas, por recomendação do administrador da circunscrição dos Macondes, de nome Garcia Soares, que, melhor conhecedor do ambiente tenso que ali já se vinha vivendo, legitimamente temia pudessem ocorrer incidentes.

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    Ao dirigir-se à multidão, o governador terá falado de diversos assuntos, menos daquele que mais interessava aos presentes e que os havia motivado a comparecerem: a liberdade para a terra e para quem nela vivia. Em face disso, elementos de uma das delegações levantaram a voz reclamando essa mesma liberdade, ao que aquele respondeu com ordem de prisão, de imediato cumprida pelo aspirante Godinho, elemento da segurança do governador. Tal gesto tido por inoportuno, prepotente e persecutório causou a indignação e revolta da população que avançou na sua direção, sendo que um dos manifestantes o terá chegado mesmo a agredir com uma bomba de bicicleta, ao mesmo tempo que perguntava aos circunstantes se alguém, por ali, dispunha de uma faca. Em face disso, o aspirante Godinho disparou sobre o agressor, abatendo-o, fazendo aumentar a ira dos nativos, que terão tentado a todo o custo impedir que a delegação, algemada e presa, fosse transportada para Pemba, capital do então distrito de Cabo Delgado e sede do respetivo governo. Perante a revolta coletiva, os sipaios ali presentes às ordens do administrador dispararam as suas armas, ainda de carregar pela boca, anteriores à I Guerra Mundial, tendo abatido um número indeterminado de manifestantes, sendo que, na fuga precipitada que se lhe seguiu, mais alguns terão morrido espezinhados.

    Não se sabe ao certo quantos terão perecido neste episódio de violência que, como foi referido, ficou conhecido por “Massacre de Mueda”. Há testemunhas oculares que falam em algumas mortes, uma delas refere terem sido precisamente 16 (dezasseis). Porém, 5 anos mais tarde, o jornal da FRELIMO publicado em Argel fala em 150, sendo que o fundador daquele Movimento/Partido, Eduardo Mondlane, no seu livro “Lutar por Moçambique”, cita um testemunho que avança com o número de 600.

    Ora, este último número, dadas as disparidades dos testemunhos, parece-nos substancialmente inflacionado, oferecendo-nos, por isso, legítimas reservas, na medida em que parece óbvio que, enquanto elemento propagandístico, mobilizador das consciências nativas, constituiria um excelente catalisador para agudizar a resistência ao colonialismo e incrementar o sentimento nacionalista, por essa altura, ainda bastante incipiente naquele território. Em suma, um número politicamente conveniente.

    Fosse qual fosse o número de baixas, a verdade é que ajudou, como se disse, a despertar o sentimento nacionalista moçambicano, de libertação do jugo colonial, servindo de bandeira política e unindo algumas organizações emancipalistas pré-existentes em torno do grande movimento independentista de que já aqui falámos, a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), fundada em 25 de junho de 1962, em Dar-es-Salam, no então Tanganica, atual Tanzânia, sob os auspícios de Julius Nyerere, líder do movimento independentista daquele país e do qual veio a ser presidente até 1985, ano em que se retirou da política.

    (...)

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    Por: Miguel Henriques

     

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