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    Arquivo: Edição de 30-09-2012

    SECÇÃO: Crónicas


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    “Não matem o mensageiro”

    Aprendi que as diferenças também se completam em si mesmas se forem encaradas de forma construtiva. Há dias, numa “tertúlia” interessante com uma pessoa ligada à área de Produção de uma empresa que se mantém saudável e produtiva, foi-me feita uma pergunta de rajada: “A senhora é de esquerda?”. Não soube responder no imediato, porque nem mesmo eu sabia muito aquilo que era e a procura desta resposta tornou-se no meu desafio para os dias seguintes.

    Penso que os meus 52 anos de vida, aliados ao facto de ter ficado ligada aos recursos humanos a partir dos meus 17 anos me levaram a uma “apartidarização” natural, tendo em conta que nesta área temos que ser isentos e este exercício é mesmo difícil. “Ausentarmo-nos” das nossas crenças e convicções para partilhar mundos com os quais muitas vezes não concordamos não é propriamente tarefa fácil e, se calhar, muitas vezes falhamos neste propósito e aqui falamos de “meter a mão na consciência” e não responder à toa dizendo “eu não, isso nunca me aconteceu”.

    Ao atrever-me a abordar um assunto delicado e muito sensível, política, e no tanto que a vida me tem ensinado no respeitante a este tema, fica um entendimento muito meu – um respeito tremendo pelos políticos, os que sabem fazer política, e isto quer sejam governo ou oposição, pois são todos precisos lá, no hemiciclo, a desempenhar com mestria um papel que as pessoas lhes confiaram. E se ao lerem me disserem “não o fazem” eu teria que responder “têm que o fazer, é o seu trabalho, aquilo com que se comprometeram em quem confiou neles”.

    Neste ponto a minha “máxima” é mesmo a liberdade e o respeito pelas crenças e defesas que cada um faz das suas convicções, hasteando o bastião da democracia, convicções que devem estar muito para lá dos seus próprios interesses pessoais porque, isso sim, tem que ser muitas vezes relegado para segundo plano – o “preço” por se ter abraçado aquele tipo de profissão.

    Eu tento estar atenta ao que me rodeia, gosto de ouvir programas de intervenção onde se sentam pessoas de diversas ideologias, “girando por todas elas”, tentando apanhar o melhor de cada uma e cruzá-lo com a realidade que conheço sobejamente, porque são mais de 30 anos a viver e conviver junto de pessoas a quem na sua maioria chamamos “povo” e ouvir as suas opiniões, os seus desalentos, mas também as suas motivações e crenças, ainda mais que sou fã incondicional da visão sistémica, tendo em conta que todos estamos interligados e todos somos precisos, quer seja na máquina humana, quer seja numa empresa, quer seja numa associação, mesmo num pequeno negócio e também, acima de tudo, num País.

    Na minha visão política de cidadã, resumi em crónica anterior a base em que me sustento – a democracia, representada no ato de votar, o único que é genuinamente nosso, porque em sociedade muita gente diz e desdiz conforme o ondular da maré, mas naquele momento em que se está na pequena cabine com o boletim de voto na mão aí sim, é o voto na crença, o voto de confiança em quem se acredita ou o ajuste de contas com quem falhou. Acredito que muitas vezes essa decisão nem sequer tem a ver com os partidos políticos em que se está filiado, um dos fortes motivos porque são as sondagens feitas à “boca das urnas” que conseguem extrapolar os resultados praticamente garantidos dos resultados eleitorais.

    A liberdade de imprensa é também um dos pilares onde assenta a democracia e por gostar de ouvir pessoas de pensares distintos é que me preocupo com os órgãos de comunicação social e o seu dever de informar, mesmo que se calhar um pouco distantes da isenção que nós lhes cobramos. Possivelmente teremos que admitir que simpatizarmos mais com os que tratam as notícias num formato que converge mais com as nossas ideias e que se transformam assim nas nossas verdades diferentes - correntes de opinião que formam o equilíbrio de uma sociedade e nos obrigam a negociar, a ceder, a repensar, recuar para depois avançar.

    A mim, com carácter pessoal, assustam-me os extremos e os extremistas - aqueles que não dão espaço de manobra ao outro, o que pensa e que é diferente. Impõem e implementam à força as ideias que foram construindo nas suas mentes. Há tempos ouvia um senhor de idade falar com revolta do que faria ele às crianças que têm comportamentos mais rebeldes e entusiasmando-se, não se dava conta do ódio que deixava transparecer e que só vinha carregado com a sua própria frustração, isto ao ponto de eu ter que lhe dizer “o senhor está a falar de crianças!”. A resposta foi: “e então?”.

    O meu grande medo é este mesmo, as pessoas de maior “poder” seja ele de capital, de força fisica, ou mesmo os que gostam de manejar a “força da sua influência” - formas de tirania que muitas vezes exercem com dureza, pensando “ter os seus a salvo”, protegidos das consequências deste tipo de atuações.

    Na realidade não se dão conta que ninguém protege ninguém do ódio que é fabricado e gerado por uma sociedade da qual todos fazemos parte e, se calhar seria mais sensato adotar-se outro tipo de atitude, com a consciência de que os que lhes sucederem, mais tarde ou mais cedo ficarão expostos e por sua conta, nesta mesma sociedade que a “inverter-se” transformará, de forma implacável a “caça” em “caçador” .

    LIBERDADE DE IMPRENSA

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    Pelo amadurecimento da idade também fui adquirindo uma responsabilidade social que penso está a crescer paredes meias com a “crise”, e fiquei contente porque atenuei alguns dos meus medos e avancei numa atitude que adotei ao responder ao pedido de ajuda feita aos colaboradores deste jornal, que decidi apoiar de forma voluntária e porque também foi uma forma justa de devolver o que recebi durante um ano letivo em que, apoiada, pude frequentar uma faculdade.

    Disponibilizei-me para a angariação de publicidade e de novos assinantes, para que se continue a divulgar e apoiar este jornal que há mais de 50 anos se mantém a informar-nos. Ao abordar pessoas e comerciantes verifiquei que eles também querem que isso aconteça, reforçando o que escrevi a uma dada altura: «… Escrevendo enquanto me ia levantando do chão, motivada por sentir que iam publicando as minhas reflexões e que tem significado para mim reconhecimento e respeito por parte do jornal “A Voz de Ermesinde”, uma das valências do Centro Social, preciso de deixar expresso o meu profundo respeito pelo facto de nunca me ter sido perguntada a minha conotação política, a minha orientação religiosa ou qualquer outra coisa que eu sentisse privar-me da minha liberdade que esse sim é o segundo maior bem depois da saúde…».

    Foi exatamente o que senti por parte das pessoas com quem vou falando - ninguém, que eu tenha contactado em representação do jornal me fez qualquer tipo de reparo em relação a conotações políticas, nem mesmo tendências religiosas, e essa não é a principal motivação que os leva a aceitarem comprar publicidade, serem seus assinantes ou mesmo amigos do facebook.

    Sentem sim ser uma causa comum: apoiar o “jornal da terra”, e que pode ser de uma qualquer terra, por isso é encarada como um “bocadinho de todos”, pois tenho verificado que são pessoas de todo o lado, de freguesias e concelhos diferentes e mesmo espalhadas por esse mundo fora que estão solidariamente ao seu lado.

    Enterneceu-me ver esta atitude de respeito e de solidariedade por este jornal regional e lembro-me muitas vezes da frase que tive exposta por trás da minha mesa de trabalho e que era atribuída a Confúcio, que dizia: «Todo o Homem deve aprender o que é de seu dever», e eu aprendi que não importa de que partido somos ou de que departamento somos ou de que terra somos – o todo vai ser sempre mais importante que a soma das partes.

    Respondendo à sua questão Sr. Pereira, e sem querer ser evasiva, eu digo-lhe que, atualmente e como cidadã, eu penso ter o dever de pensar e refletir com objetividade, ponderação e também muita racionalidade. Estar cada vez mais atenta às minhas escolhas na delegação que faço em representantes políticos para o meu país e também pela necessidade e obrigação que tenho de me manter em constante atualização e em movimento sobre pensares diferentes de pessoas que têm ideais diferentes, colocando a minha cruz no que mais se ajustar à minha consciência.

    Aprendi que isso só possível se estiver atenta e seguir o que se vai ouvindo e lendo nos diferentes órgãos de comunicação social que dão voz às correntes de opinião, também diferentes. Confesso que às vezes me preocupo que ao abrigo da palavra “crise” e com o intuito de nos condicionarem o pensamento, tentem “matar os mensageiros”, mesmo sabendo que apesar de tudo não matariam a palavra, pois a história mostra-nos que isso nunca foi possível.

    Acredito que proteger e salvaguardar a liberdade de imprensa, ajudando a que se mantenha ativa, acutilante e transparente é uma forma de preservarmos um bem pessoal e precioso de todos nós, a liberdade, mesmo que de “pequenos arautos” como este.

    Por: Glória Leitão

     

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