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    Arquivo: Edição de 17-07-2012

    SECÇÃO: Crónicas


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    Pão de Favaios

    Falar do afamado Pão de Favaios não é fácil. Está tudo dito ou redito, mesmo sobre o Museu do Pão, criado ou a criar. Mas, como pão da minha criação, muito lhe devo. Assim, continuo, sempre que possível, a comprá-lo na cidade do Porto e outros locais.

    Não contava obtê-lo, em São João da Pesqueira, no último fim de semana. Não era bem o de antigamente, mas quase e para melhor. Era um pouco maior, os cantos (escachos) mais salientes, sem pó de farinha a cobri-los, e acondicionados em saco plástico transparente. Foi uma delícia petiscar, com pão de Favaios, um lanche!

    Os pães sobrantes resguardados continuaram a satisfazer o pecado da gula, acompanhando o vinho de touriga duriense e o presunto de Lamego. Os amigos obsequiados, disseram:

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    – Isto sim! É século XX...

    Na aldeia transmontana, o pão nosso de cada dia era a broa de milho caseira, quase sempre fresca pelas trocas, entre fornadas de familiares. Após as malhadas do centeio, as broas passavam a pão escuro desse cereal. No tempo de grandes crises faziam-se broas de cevada! O trigo de Favaios, entregue uma vez por semana, era utilizado nas torradas, sopas de leite, nas merendas para a escola, ou ofertar as visitas.

    O Sr. António, padeiro de Favaios, ia a Roalde só aos sábados. O seu macho tinha na albarda dois cestos vindimeiros cheios dos trigos, e retirados conforme as entregas e as vendas. Ao saírem do cesto recebiam um toque e libertavam pó de farinha, e faziam água na boca aos catraios da rua! Os pães, comprados para a semana, eram acondicionados numa lata de tampa. Estavam sempre ótimos para comer com queijo, e nunca criavam bolor.

    Quando as vendas decorriam bem, o António Padeiro ia beber um copo de vinho à taberna do Pirolito, montava, a seguir, o macho entre os dois cestos, dizia adeus, e trotava para S. Martinho.

    No Natal, Páscoa e na festa da aldeia fazia visitas extras. Entregava as encomendas de trigo para as rabanadas, folares para afilhados e pão chique para as refeições festivas (os padres e músicos não podiam ser tratados a broa!). Nessas alturas tinha tempo de poder exercer o seu saber de vedor de água! Era mesmo perito.

    Vi-o marcar, com o êxito futuro, o poço do Rodrigues, nas terras das Pereiras. Quando o seu relógio, suspenso pela corrente, começou a oscilar, feito maluco, fiquei de boca aberta! Não seria bruxedo?! Nada disso. A água descoberta veio a regar o milho e o batatal de uma leira nossa, nesse ano de forte estiagem.

    Apanhei o vício da prospeção de águas. Aprendi e exerci mas, como vedor nunca consegui, mesmo armado de varinhas ou pêndulos, qualquer efeito!

    O que nunca perdoei ao padeiro de Favaios era a entrega dos folares, não ia a minha casa. Não tinha culpa alguma, pois não havia encomenda, pois o meu padrinho era S. José! Eu conto:

    Existia o uso de os pais ou sogros batizarem os netos (seria para não serem apelidados de avós?); como estava determinado ter o nome de José e a avó ter ficado viúva e a viver no mesmo lar, com o acordo do Sr. Prior, o padrinho escolhido foi o Esposo da Virgem Maria e a avó a madrinha, passando a ser a mãezinha para os netos!

    Não havia entrega de ramo ao padrinho, logo, não havia direito de receber o folar de Favaios!

    Por: Gil Monteiro

     

     

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