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    Arquivo: Edição de 15-10-2007

    SECÇÃO: Arte Nona


    Enfeitiçada por... um Pulitzer

    Carlos Trillo e Domingo Mandrafina assinam “Iguana”, obra na qual se retrata quer a brutalidade e a repressão da não tão imaginária como isso república das bananas La Colonia, através do relato da vida de um torcionário que acaba de ser morto, mas que ainda assusta – e de que maneira – todos aqueles que com ele se cruzaram e, ao mesmo tempo, a ambição de uma repórter norte-americana, enviada para, precisamente, contar a história daquele, e que sonha com o Prémio Pulitzer e a fama.

    De caminho, também ela é seduzida pel(a história d)o Iguana.

    Esta personagem cruel já tinha sido introduzida pela dupla argentina em “A Grande Farsa”, álbum que, em 1998, foi galardoada com o título de Melhor Álbum Estrangeiro no importantíssimo Festival de Banda Desenhada de Angoulême e que tinha já como palco de acção a república de La Colonia.

    “Iguana”, obra de 1999, foi editado em Portugal pela Vitamina BD Edições, em 2002, na sua colecção Mancha Negra, que divulgou em Portugal muitas das obras imperdíveis da produção da Banda Desenhada argentina.

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    Agora que toda a gente discute o papel da imprensa enquanto voz do dono, sobretudo a propósito das questões judiciais à volta da prática do crime, seja ele a pedofilia infantil (à volta do processo Casa Pia) ou o misterioso desaparecimento de crianças (a partir do caso Madie McCann), ou ainda o lenocínio, a respeito do processo “Passerelle”, vem a propósito recordar “Iguana”.

    Susan Ling, repórter principal do “Morning News”, «um jornal que diz a verdade sem medo», é, nesta obra de Trillo e Mandrafina, bem o retrato dos tempos que correm, em que o sucesso e o poder se convertem em poderoso afrodisíaco e motivação.

    O Iguana fica aqui sempre num segundo plano, não porque tenha morrido, logo à primeira vinheta da obra, não porque a sua história não ocupe a boca de cena do princípio ao fim deste álbum, atemorizando, ainda depois de morto, aqueles que escaparam a ser suas vítimas, não porque não seja ele o centro de um guião que se vai construindo, cimentando a obra da repórter, mas porque, do que aqui se fala é desta encenação – onde as máscaras do Iguana que excitam a jornalista ganham todo o sentido –, que finalmente acaba a ser consagrada na tela, através do filme realizado por um tal Steven Spielberg (muito realisticamente desenhado por Domingo Mandrafina) e interpretado por um tal Robert de Niro e uma tal Jennifer Lopez, embora o retrato gráfico deste último, que também é personagem da obra (a Lopez já não), fique um pouco aquém do mesmo retrato muito realista com que se aprersenta o realizador.

    Responde Susan secamente, à informação de um íntimo da repórter (o editor do Morning News?), quando este lhe dá as boas notícias – “As críticas são excelentes, Miss Ling. Todas elogiam o seu brilhante trabalho que esteve na origem do filme. De Niro disse mesmo que sem algum material que lhe cedeu... não teria conseguido uma caracterização tão boa... Além disso, “Iguana Rock” está e, primeiro no...: «Cala-te e fecha os olhos».

    E, com a máscara do Iguana posta, este é agora o substituto na cama de Susan do fotógrafo Bill, que a repórter fez despedir após regressarem de La Colonia. O Iguana como que continua a sua assombração.

    Carlos Trillo – o argumentista – “desenha” muito bem um leque de personagens que, depois, Mandrafina se encarrega de vestir com mestria, encontrando aqui e ali engenhosas soluções de relato das personagens.

    Nenhuma delas é poupada neste retrato sem piedade, em que a hipocrisia, a cobardia, a ambição desmedida e a crueldade animam as acções das várias figuras com as quais o leitor está livre de se identificar. Cria-se assim um interessante efeito de distanciação que permite uma leitura mais rica e mais ampla e profunda da obra que se nos apresenta.

    Veja-se a primeira vinheta de “Iguana”, acima reproduzida. Veja-se a solução encontrada por Mandrafina para representar a igreja, onde todas as figuras humanas aparecem desenhadas a mancha e traço de preto e branco, no registo irónico, semelhante ao do cartoon, enquanto as imagens sagradas são fixadas num registo de meio tom, a assemelhar-se ao da fotografia, muito mais realista. E etc..

    Por: LC

     

     

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