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Edição de 31-03-2024
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    Arquivo: Edição de 30-08-2006

    SECÇÃO: Destaque


    O negócio da escravatura ontem e hoje

    Decorreu na Sala da Lareira da Vila Beatriz, no passado dia 23 de Agosto, uma conferência, seguida de um workshop de capoeira, para comemorar o Dia Internacional de Recordação do Tráfego de Escravos e da sua Abolição. A jornada, subordinada ao título “Escravatura – Histórias do Passado. Realidades do Presente”, contou com a participação de Joana Morais e Castro, responsável, na área jurídica, do Centro Nacional de Apoio ao Imigrante (CNAI), que abordou várias das facetas que compõem a realidade actual do tráfico de pessoas, e de Diogo Pinho, jovem capoeirista da Associação Capoeira Lagoa da Saudade II, que antes da exibição da sua escola nos jardins da Vila Beatriz, com que encerrou a jornada, falou das origens da capoeira, das suas virtualidades e da sua realidade actual.

    Eunice Neves, da Agência para a Vida Local da Câmara Municipal de Valongo, abriu a jornada, para assinalar quer a importância da data e a permanência do tráfico de pessoas, quer para agradecer a presença dos dois convidados e o programa que se seguiria às suas intervenções, quer para apresentar a própria agência e dar notícia do recebimento do Prémio Agostinho Roseta (ver notícia na página 9). Saudou, finalmente, a presença de Artur Pais e Antonino Leite, presidentes da Junta e Assembleia de Freguesia de Ermesinde.

    Fotos URSULA ZANGER
    Fotos URSULA ZANGER
    O ACTUAL TRÁFICO DE ESCRAVOS:

    MÃO-DE OBRA, MULHERES E CRIANÇAS

    Coube então a vez a Joana Morais e Castro esclarecer um pouco sobre as actuais vertentes do tráfico de pessoas – mão-de-obra, mulheres e crianças, cujas práticas são, em grande parte, similares às da escravatura clássica. Para o seu combate, sobretudo no tráfico de mão-de-obra e mesmo de mulheres, a técnica do CNAI aconselhava a criminalização dos tráficos, as concessões de residência, o reforço dos controlos de entrada, a protecção às vítimas, e campanhas de informação na origem.

    Como factores potenciadores do tráfico de mão-de--obra (e de mulheres) apontou, entre outros, a globalização económica, a melhoria das telecomunicações, a falta de recursos dos povos.

    Colocadas em situações em que, muitas vezes, dependem directamente para a sua sobrevivência, dos próprios traficantes, as pessoas não reconhecem facilmente serem vítimas, o que dificulta o combate ao tráfico.

    Aliás, nos casos de exploração sexual, seria frequente que pessoas de relacionamento próximo das vítimas fossem agentes activos da exploração.

    Joana Morais e Castro esclareceu também que nos fenómenos actuais do tráfico de pessoas, agora de natureza ilegal – ao contrário do que foi no passado –, era frequente os grupos criminosos possuírem estruturas hierarquizadas e infiltradas, indo esta infiltração até às forças policiais, à magistratura e ao poder político.

    Quanto ao tráfico de crianças, a técnica do CNAI referiu que uma estimativa recente da OIT (de 2003) apontava para 1,2 milhões o número de crianças vítimas anualmente.

    Ainda quanto ao tráfico de pessoas, a jurista avisou, também, que não se devia confundir aquele com imigração ilegal, que eram realidades de natureza diferente.

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    A uma pergunta do público sobre a real actividade do Estado no combate ao tráfico, a técnica respondeu que, por exemplo, quando decretadas, não há dinheiro para concretizar as expulsões. Ao mesmo tempo, os actuais centros de acolhimento são prisões e não verdadeiros centros de acolhimento.

    AS ORIGENS DA CAPOEIRA

    Seguiu-se a intervenção de Domingos Pinho, da Associação de Capoeira Lagoa da Saudade II (o II deriva do facto de estar instalada em Portugal, enquanto a sua inspiradora permanece no Brasil).

    Domingos Pinho identificou a origem da capoeira na resistência negra.

    Tendo o tráfico negreiro assumido enormes proporções pelas necessidades dos engenhos de açúcar e outras indústrias – de extracção e cultura intensiva – os escravos, que eram trazidos nos porões dos navios nas condições mais degradantes – cerca de 60% perdia-se nas viagens, precisou Domingos Pinho – vinham, muitas vezes de zonas diferentes, não conhecendos muitos deles as línguas uns dos outros.

    Assim, não só adoptaram a língua do traficante, como também desenvolveram uma forte linguagem corporal de origem africana, expressa na luta e na dança (que muitas vezes era estilização da luta para passar despercebida).

    A capoeira ter-se-á desenvolvido sobretudo nos quilombos – comunidades de escravos fugidos, que se organizavam socialmente formando aldeamentos rebeldes, alguns de grande dimensão.

    A abolição da escravatura em 13 de Maio de 1888, nos últimos anos do Império progressista brasileiro e a proibição da capoeira, a 11 de Outubro de 1890, por Deodoro da Fonseca, no primeiro ano da República reaccionária, marcaram a sua história. A capoeira foi proscrita em Recife, Rio de Janeiro, Bahia, dando aí origens a expressões musicais distintas.

    O reconhecimento veio mais tarde, já no século XX, com a escola de Mestre Bimba a ser reconhecida oficialmente. Getúlio Vargas reconheceu a capoeira como o único desporto verdadeiramente brasileiro. Esta corrente, iniciada por Mestre Bimba é a chamada Regional, na qual se insere a Lagoa da Saudade.

    Esta não é, todavia, a única expressão da capoeira, distinguindo-se também a corrente de Mestre Pastinha, dita Angola, mais tradicionalista ou pura, pondo a tónica não na arte marcial, mas na expressão cultural.

    Por: LC

     

     

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