SECÇÃO: Destaque

Foto URSULA ZANGER

Major João Moutinho: «Se calhar não devíamos ter tido tanta liberdade»

O “capitão de Abril” major da Força Aérea, João Moutinho, esteve na Escola Secundária de Ermesinde para um debate, que ocorreu na noite do passado dia 21, mas que deixou alguma frustração nos presentes.

O convidado explicou mais sobre o seu pensamento acerca da actual sociedade portuguesa e o seu momento político do que sobre a data histórica que ali estava em memória.

O major João Moutinho, convidado da Junta de Freguesia de Ermesinde para um debate sobre o 25 de Abril sentiu-se tão à vontade neste que, ao contrário do que costuma fazer, como referiu, se abriu um pouco mais para explanar o seu sentido político sobre os tempos que correm. Na sua intervenção, algumas das afirmações e ideias apresentadas pelo major, foram no mínimo polémicas, sendo que o objecto da conversa – a sua intervenção no 25 de Abril – foi deixada um pouco para segundo plano.

O major mostrou-se um pouco desiludido com o rumo que as coisas tomaram do 25 de Abril até hoje, considerando que «se calhar não deveríamos ter tido tanta liberdade». João Moutinho referia-se àquilo que considerou como uma das principais razões para a situação difícil que o País atravessa – a falta de responsabilidade tantas vezes manifestada pelos governantes e cidadãos.

«Todos querem mais: escolas, sindicatos, juntas de freguesia, câmaras municipais» e não é possível viver assim, afirmou João Moutinho, considerando que o País estava a viver acima das suas possibilidades.

O “capitão de Abril” inseriu esta questão na realidade interncional, lembrando, todavia, e a propósito, que os Estados Unidos são a nação do mundo com a maior dívida externa.

«Podemos correr o risco de perder o euro... e voltar ao escudo», uma situação que seria muito má para Portugal, considerou também.

E o major juntou ainda, como uma das pistas para explicar a situação actual, que «a corrupção é endémica neste país», e que se não se fizer qualquer coisas com espírito de responsabilidade, corremos o risco de nos transformarmos num Bangladesh, uma referência negativa que usou várias vezes.

A SITUAÇÃO PRÉ-25 DE ABRIL

À BEIRA DO COLAPSO

Numa das poucas incursões pelo período anterior ao 25 de Abril, o major João Moutinho recordou que os militares portugueses estavam então, sobretudo na Guiné, à beira do colapso, com uma situação muito difícil em duas frentes, que se agravou com a entrada no cenário da guerra dos primeiros mísseis contra Força Aérea Portuguesa.

Esse período difícil originou muita reflexão nos militares portugueses. Spínola tinha ido à Guiné negociar com Senghor (do Senegal), revelou ainda o militar de Abril, que se referiu a outras figuras de oficiais que, como ele, tinham feito essa reflexão, como Otelo, Carlos Fabião, Faria Paulino...

Gastava-se mais de 50% do orçamento no esforço de guerra e isso era insustentável, considerou ainda o militar de Abril, que referiu como causa de muitos dos erros que se seguiram a falta de experiência ou até ingenuidade de alguns dos protagonistas. Como exemplos referiu que o Partido Socialista tinha sido criado por um grupo de amigos – menos de 30 pessoas no ano anterior. Que Otelo era então social-democrata, defendendo um modelo semelhante ao da Suécia.

Também hoje, o défice público começa a ser muito preocupante, avisou o major, para quem o descontentamento actual em certos meios militares é um claro indício.

O desenvolvimento tem que ser sustentado, asseverou ainda João Moutinho.

E abordando a recente crise de confiança com a muito falada questão das faltas dos deputados, considerou que se têm que exigir responsabilidades aos partidos políticos. O próprio primeiro-ministro teria já ameaçado bater com a porta, o que somado aos anteriores abandonos, seria muito mau para a imagem de Portugal.

Por: LC