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    Arquivo: Edição de 15-11-2005

    SECÇÃO: Editorial


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    Violência política ou revolta social?

    Ninguém pode ficar indiferente ao que se está a passar em França e desses acontecimentos, tenho lido e ouvido, as mais díspares opiniões que, na sua essência, se podem resumir a duas visões do fenómeno: violência política ou revolta social.

    Rotular pura e simplesmente um fenómeno tão complexo como este de uma simples revolta política parece-me demasiado simplista e sobretudo uma visão de grande distanciamento da realidade social vivida pelos mais desfavorecidos, pelas vítimas das más políticas de integração.

    Se por um lado a França foi o berço da liberdade, da fraternidade e da solidariedade, que sempre recebeu imigrantes de todos os cantos do mundo, também é verdade que as suas políticas urbanísticas contribuíram para a formação de zonas periféricas nas cidades onde habitam os mais desfavorecidos, os desempregados, onde o sucesso escolar é muito baixo, onde muitos professores se recusam a leccionar, onde a revolta e o ódio tomaram conta destes bairros. Sabia-se da sua existência, mas funcionavam num mundo à parte. Deixou-se crescer, as novas gerações ganharam uma outra consciência social e política e sentem a diferença de uma outra forma, a lei reconhece-os como franceses, mas os franceses não os aceitam como tal.

    «Em França há um problema de ordem pública mas há também um problema de cidadania, que só poderá lograr-se com uma concepção cosmopolita, em que os “outros” sintam que também podem ser parte do Estado-Nação».

    No fim da guerra a França precisou de mão-de-obra, e foi buscá-la à Argélia e Marrocos. Estes povos viviam numa realidade paralela à dos franceses, primeiro em barracas miseráveis, sem água nem luz, depois em condições um pouco melhores, mas sempre à margem da sociedade francesa. Os anos foram passando e vieram as mulheres e os filhos pequenos, nasceram mais filhos e estes cresceram. A estes povos juntaram-se outros e outros, que ajudaram a reconstruir a França, que se ocupavam dos serviços mais humildes, cujas vidas eram marcadas pelo medo de serem deportados para os seus países de origem, e quantos não legalizados com as suas vidas nas mãos de pessoas que os contratavam!, quantos portugueses não viveram esta situação?

    Julgava-se que a sua permanência era passageira, mas aconteceu exactamente o contrário, ficaram eles, os seus descendentes, e estes agora franceses por lei.

    Não se investiu o suficiente na integração. Desempregados, renegados, marginalizados, ocupando as periferias, criaram-se territórios férteis para o desenvolvimento da revolta, do ódio, dos negócios clandestinos, da marginalidade, do medo.

    São jovens que questionam a sua identidade, que não pertencem a lado nenhum, que não têm emprego, que se sentem inúteis, que detestam os bairros onde habitam e o estigma que isso lhes acarreta.

    A revolta desta juventude é débil, não é organizada, é um grito de revolta, de raiva, de ódio, não tem chefes, não é política, mas no que ela se pode transformar ninguém sabe...

    Por: Fernanda Lage

     

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