MOSTRA INTERNACIONAL DE TEATRO DE VALONGO 2022
A Mostra Internacional de Teatro (MIT) assinalou este ano a sua 25.ª edição. Um quarto de século a divulgar a arte de representar ao mais alto nível, e este ano a tradição não fugiu à regra na sequência do naipe de belíssimos espetáculos oriundos da Bélgica, Espanha e Portugal. A MIT teve mais uma vez como palco o Fórum Cultural de Ermesinde, onde no passado dia 10 de setembro se deu início a um evento que se estendeu até ao dia 18 do mesmo mês. Esta edição começou com o resultado, por assim dizer, de uma das muitas ações de formação para adultos do ENTREtanto Teatro - a companhia que a par da Câmara de Valongo vem organizando a mostra de teatro de há 25 anos a esta parte -, o espetáculo “Serra em Canto”. Com texto e encenação do diretor artístico do ENTREtanto Teatro, Júnior Sampaio, a peça, levada a cena por 30 atores/formandos, e apresentada em dose dupla, ou seja, nos dias 10 e 11, é um canto poético ao concelho de Valongo, à sua história, às suas tradições, e às suas gentes. Recorde-se que esta peça foi apresentada há precisamente um ano na Serra de Santa Justa, e na altura reportada pelo nosso jornal, sendo que agora, na MIT, a performance foi transportada do cenário natural da Santa Justa para a urbanidade do Fórum Cultural e o Parque Urbano de Ermesinde. O nosso jornal esteve em alguns dos espetáculos que integraram esta 25.ª edição deste evento cultural, fazendo um breve relato deles nas linhas que se seguem nesta página.
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Foto MANUEL VALDREZ |
REGRESSO À CASA DE PARTIDA DO EXÍMIO CONTADOR DE HISTÓRIAS GALEGO
A noite de 15 de setembro foi um regresso ao ponto de partida da MIT. Ou melhor, foi o regresso de alguém que há 25 anos atrás esteve no início desta caminhada, isto é, na 1.ª edição da mostra. Esse alguém dispensa apresentações, dada a sua já longa e brilhante carreira de contador de histórias. Falamos de Quico Cadaval, ator galego que em Ermesinde apresentou “Vacas, Guerras, Porcos e Clérigos”. Não nos podemos referir a este trabalho deste ator, diretor, dramaturgo e adaptador teatral galego como uma mera peça, mas um conjunto de histórias contadas de forma casual ao público que muitas vezes é chamado à conversa. Na realidade, Quico Cadaval comprovou na nossa cidade que é um grande contador de histórias e sucedidos na sua Galiza natal, que é um exímio intérprete do teatro da palavra. Esta arte, dizemos assim, é ainda tida como uma forma diminuta de teatro, mas ao mesmo tempo é um apelo à imaginação do público que constrói as imagens da história em simultâneo com o narrador.
Em “Vacas, Guerras, Porcos e Clérigos” Quico Cadaval conta a história do seu avô, Xúan, o «homem mais bom da sua aldeia», amigo do seu amigo. A partir deste seu antepassado, o ator – ou bom conversador - galego encadeia um conjunto de histórias protagonizadas por vizinhos e amigos do seu avô. Figuras que se tornam em personagens hilariantes e artísticas, e que dão vida a histórias de vacas; de militares do tempo de Franco a passar férias na Galiza; de um barbeiro profético, de fenómenos estranhos das noites galegas; ou da figura do Ghacheiro, que é uma espécie de bobo da corte local que passa a vida a pregar partidas aos seus conterrâneos e que a certa altura lançou o medo em toda a população de Ribeira ao fazer crer que o desembarque das tropas dos Aliados da II Guerra Mundial iria ser nesta pacata localidade galega e não na Normandia.
FICHA TÉCNICA DE “VACAS, GUERRAS, PORCOS E CLÉRIGOS” (ESPANHA): Criação e Interpretação: Quico Cadaval. Imagem: Luís Polo
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Foto CMV |
PRIMEIRO MONÓLOGO DA CARREIRA DE ANTÓNIO CAPELO
REFLETE O QUE REPRESENTA O TEATRO NA VIDA DO ATOR
Há muito que não se via – inexplicavelmente – a sala do Fórum Cultural repleta de público para assistir a um espetáculo no âmbito do MIT. A explicação para esta enorme afluência dá pelo nome de António Capelo, conceituado ator português com uma carreira de 45 anos (repartidos pelo teatro, cinema e televisão), que na noite de 16 de setembro levou à cena “Ninguém”. Este é o primeiro monólogo da carreira do ator, um monólogo diríamos que intimista, tendo em conta que António Capelo numa espécie de conversa com o público vai soltando notas do seu percurso artístico. Foi quase como um relato autobiográfico do que tem sido ser ator, das encruzilhadas da profissão, a forma como o(s) ator(es) é(são) olhado(s), as inquietações vividas por um ator, os estereótipos associados à profissão, entre outras confissões que abordam a condição de ator.
Como se podia ler na sinopse da peça, “Ninguém” surge como «uma confissão que celebra o teatro em tempos incertos e conturbados, como uma forma de identidade e resistência numa sociedade (digital) em que todos são (ou procuram desesperadamente ser) “alguém”».
FICHA TÉCNICA DE “NINGUÉM” (PORTUGAL): Texto: Zeferino Mota. Direção: Pedro Aparício e Zeferino Mota. Interpretação: António Capelo. Música: André Abujamra. Desenho e Luz: Mário Bessa. Cenografia, Figurino e Adereços: Cátia Barros. Imagem: Luís Troufa.
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Foto MANUEL VALDREZ |
A VOZ COMO PRINCIPAL INSTRUMENTO DE UM CONCERTO DE TEATRO MUSICAL
O espetáculo da noite de 17 de setembro apresentou-nos um magnífico exemplo de teatro musical, o qual foi protagonizado por um ator a solo, em que esse mesmo ator usa como instrumento principal a sua voz! Intitulada de “O Gesto da Voz”, esta peça foi-nos apresentada pelo belga Bernard Massuir, que bem podemos dizer que nos presenteou com um grande concerto musical teatralizado usando, isso mesmo, a sua voz. Foi um autêntico recital vocal, em que a voz do ator produzia os mais variados sons/efeitos musicais. Sons/efeitos que davam origem a melodias por vezes mais animadas, outras mais melancólicas e introspetivas, mas todas elas alternando entre o humor musical e o minimalismo. Foram inúmeras as ocasiões em que o ator interagiu com o público, fazendo com que os próprios espetadores fizessem também eles parte do espetáculo. O ator foi-nos surpreendendo ao longo da noite com o seu poder e talento vocal deixando a plateia completamente rendida.
FICHA TÉCNICA DE “O GESTO DA VOZ” (BÉLGICA): Criação e Interpretação: Bernard Massuir. Imagem: Zoé Piret.
Por:
MB
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